Cale-se quem nunca soube o que é a guerra nem viu nem ouviu nem sofreu os seus efeitos!
Cale-se quem só ouviu o
Sr. El Bashir e os seus amigos e não deu ouvidos aos soldados que sucumbem nas
trincheiras, aos civis e inocentes que (nestes dois primeiros meses após os
memoriais dez anos do conflito do Darfur) morreram não de morte natural mas de
morte matada e muito violenta!
Cale-se quem não sabe que
os hospitais do Darfur e os campos de refugiados de Utash, El Salam, Idreij,
Kalma estão a encher-se, a arrebentar pelas costuras e a expandir pelo deserto
fora a cada momento (falo com conhecimento de causa, tudo estes aqui pertinho
de mim, em Nyala. E que será de todos os outros campos... à volta de uma
centena?)!
Já agora, deixa-me
comentar isso do medo ou do susto. Mais do que medo sinto raiva com sintomas de
paralisação, impotência de um menino perante um gigante, o Colosso. Isto é mesmo
muito mau sinal, que já não me tenham conseguido assustar nem meter medo nem a
mim nem aqueles com quem eu estava à tarde. Nem sequer comentámos. Não, minto, um
deles disse, enquanto os seus olhos ainda fixavam o céu sonoro e rompante:
"O que é que se pode fazer ou dizer a isto!?" O outro respondeu:
"Nada". E voltando-se na direção do grande areal de treinos do quartel
de infantaria, concluiu: "Está vazio, hoje não há ninguém, estão todos para
lá."
E note-se que estes dois são
militares, colegas de todos os que estão para lá (sudaneses aqui do norte e não
sudaneses do sul), que por acaso se encontravam uns dias de férias. Eram as 6h00
da tarde e encontrava-me em casa do ex-sargento sulista António Creb que me
tinha convidado para um pequena festa de reconhecimento do seu filho Solomon
que ficou aprovado no exame do oitavo (e último) ano do ensino básico.
Não lhes perguntei onde
era o lugar da batalha, nem falei com mais ninguém até chegar a casa pois
diga-se a verdade, tinha uma certa pressa porque se aproximava a hora do recolher
obrigatório. Curiosamente, não tinha medo mas mais bem sentia um certo receio
de ser encontrado a transgredir a lei marcial em que o castigo pode ser a
expulsão da região ou do país.
P.e Feliz Martins,
Missionário Comboniano no Darfur - Sudão
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