12 de setembro de 2024

DE VOLTA À PRISÃO




A assistência religiosa no Estabelecimento Correcional de Adola, no sul da Etiópia, faz parte do serviço pastoral da missão comboniana de Qillenso desde 2009. Aliás, a capela prisional foi o terceiro local de culto aberto à volta da cidade-mãe dos gujis.

Os inícios foram humildes. Os católicos começaram por se reunir para a missa dominical na capela luterana. Depois, montaram uma tenda. A capela propriamente dita, feita de madeira, barro e zinco, veio depois.

Hoje, uma equipa de duas Missionárias da Caridade, o professor reformado José Sholango e um dos padres da paróquia de Qillenso, visita a prisão cada terça-feira para rezar o evangelho do domingo anterior com alguns reclusos.

O esquema da celebração é simples: um cântico de entrada, acompanhado pelo tambor e pela kerara, uma espécie de guitarra local, e de uma oração de introdução, feita por um dos presos. Depois, o evangelho é proclamado em guji – a língua local – e em amárico – a língua franca na Etiópia.

A Palavra é explicada pelo padre em guji e por uma irmã em inglês ou amárico. Sholango faz de tradutor e concluiu a reflexão com algumas orientações práticas. Depois de outra canção, a Palavra é feita oração. A celebração conclui com a bênção.

Os participantes variam entre duas e quatro dezenas. Católicos são poucos. Por isso, deixamos de celebrar a Eucaristia e valorizamos a partilha da Palavra. Os católicos na Etiópia não chegam a um milhão, representando menos de um por cento da população.

Entretanto, uma reorganização administrativa do Estado Regional da Oromia trouxe para Adola a capital da zona guji. A prisão também foi requalificada e tem mais de um milhar de detidos. 

Para criar novos espaços, a direção decidiu relocalizar os centros de culto para fora dos muros do presídio. Além de reconstruir as capelas, tivemos de construir uma cerca de zinco com cerca de dois metros de altura e uma porta de metal de acesso à nova Aldeia de Deus na cadeia de Adola: as capelas católica, luterana, ortodoxa e apostólica (uma igreja independente etípe) e a mesquita. Tudo lado a lado.

Os espaços de oração foram demolidos e estão a ser reconstruídos. Por esse motivo, suspendemos as visitas à prisão em fevereiro e retomamo-las a 21 de maio, quando o teto de zinco foi terminado, protegendo os orantes do sol e da chuva. Entretanto, estes compraram do próprio bolso um sistema de som para competir com a concorrência!

A nova capela é um pouco maior que a primeira: mede dez por sete metros e foi financiada através do contributo generoso da província comboniana de Portugal. Os trabalhos são feitos pelos próprios reclusos: os mestres são pagos e os ajudantes alimentados. As paredes de barro, o chão e o revestimento externo de cimento estão terminados. Falta pintar por dentro e por fora.

A presença do Evangelho na prisão é muito importante. O Relatório de Síntese da primeira sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade reconhece-a ao agradecer e encorajar «as pessoas comprometidas no serviço de escuta e acompanhamento de todos os que se encontram na prisão e precisam particularmente de experimentar o amor misericordioso do Senhor e de não se sentir isolados da comunidade. Em nome da Igreja eles realizam as palavras do Senhor: “estava na prisão e fostes ter comigo” (Mt 25,36)».

É o que procuramos fazer com estes irmãos. Além da assistência espiritual, prestamos alguma ajuda material sobretudo com sabão, roupa e medicamentos para quem precisa. E, às vezes, material para a escola básica que funciona no presídio.

2 de setembro de 2024

A VIDA DE UM AEROPORTO


Um aeroporto é local aonde chegam e de onde partem os aviões. Ou seja, é um lugar onde as pessoas chegam e partem, usando o avião. Ao aeroporto chega-se para partir. O tempo de espera varia, mas está-se sempre de passagem. Sabe-se de onde vimos e para onde vamos. 

Além disso, cada passageiro tem um bilhete e um cartão de embarque com todas as informações necessárias – identidade, origem e o meu destino do voo. Normalmente espera-se o mínimo possível e é-se feliz quando se pode partir a horas.

 

O aeroporto da vida

A nossa vida podia ser comparada ao que se passa no aeroporto. Há semelhanças, mas muitas e importantes diferenças. Semelhanças – a vida é um lugar de passagem, chega-se para partir. A identidade profunda de tudo o que nasce nesta terra é o prazo de validade. Ninguém vive para sempre. 

Nasce-se para morrer, esta é a infalível lei da vida.

Todos os seres vivos têm um cartão de embarque – “vieste do pó e para o pó voltarás!“ Para os humanos, seres complexos porque feitos “à imagem e semelhança de Deus”, voltam à terra o que é da terra e a Deus o que “a Deus pertence”.

O tempo de espera varia. A grande diferença é que no aeroporto quere-se o mínimo e na vida o máximo. Mas, nos dois casos, dependemos de terceiros – das companhias aéreas ou de Deus. 

A grande diferença é na intenção de viajar ou não. Podemos escolher se viajar de avião ou não. Também se escolhe a hora e o destino. Na vida, tudo é dado como dom e graça de Deus. Ele chama à existência quando quer e decide a hora da partida!

A tragédia da humanidade é esquecer de onde vem e para onde vai. Teimamos em fazer moradas permanentes nos aeroportos e não sabemos ler as indicações precisas do nosso cartão de embarque. 

pessoa humana que foi feita por Deus. Como a água vai para o mar, nós acabamos inexoravelmente na casa de Deus.

Seria fácil imaginar uma sociedade onde cada um lesse frequentemente o seu cartão de embarque. Podemos esquecer a hora “que só a Deus pertence”, mas nunca esquecer o nosso destino. Nós somos o que somos, porque temos um destino divino e eterno.

(Escrito no aeroporto de Bruxelas à espera do voo que me levará ao funeral da minha mãe.)

Abraço amigo,

P. Manuel Fidelino

Missionário Comboniano no Uganda