22 de junho de 2023

A FORÇA DAS PERGUNTAS


No domingo, 18 de julho, celebrámos na Etiópia, segundo o calendário local, a Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo.

A primeira leitura, tirada do Livro do Deuteronómio, falava duas vezes do maná: «Deu-te a comer o maná que não conhecias nem teus pais haviam conhecido, para te fazer compreender que o homem não vive só de pão, mas de toda a palavra que sai da boca do Senhor».

A palavra maná tem a raíz nos vocábulos hebraicos man hu que literalmente significam «o que é isto».

O maná era uma substância granulada que cobria o deserto depois de o orvalho da madrugada evaporar. Perante o fenómeno desconhecido, os hebreus, na caminhada do êxodo do cativeiro do Egito para a liberdade da Terra da Promessa, questionavam-se: Man hu? O que é isto?

Esta pergunta fez-me recordar uma passagem da obra Cartas a um jovem poeta de Rainer Maria Rilke que uma amiga teve a bondade de partilhar comigo numa altura em que eu vivia muitas questões.

«Tenha paciência quanto a tudo o que está ainda por resolver no seu coração e que tente amar as próprias perguntas como se fossem salas fechadas ou livros escritos numa língua muito diferente das que conhecemos. Não procure agora as respostas que não lhe podem ser dadas porque ainda não as pode viver. E tudo tem de ser vivido. Viva agora as perguntas. Aos poucos, sem o notar, talvez dê por si um dia, num futuro distante, a viver dento da resposta» — o poeta austríaco anota.

A pergunta fundamental Man hu, O que é isto, serviu de alimento ao povo de Deus durante quarenta anos no vaguear preparatório do êxodo pelo deserto.

Temos que (re)aprender a acariciar as perguntas que nos tiram o terreno das nossas próprias (in)certezas debaixo dos pés, viver o risco de tentar encontrar novas respostas para velhos perguntares. Não ter medo das perguntas. Não ter medo das incertezas.

Quando passei três semanas na Academia Militar para fazer a  tropa o Capitão Cavaleiro repetia: «Não há perguntas estúpidas. As perguntas estúpidas são as que não perguntamos!».

Muitas vezes as perguntas são muito mais valiosas que as respostas. Talvez por isso o Documento de Trabalho para o Sínodo sobre a Sinodalidade em vez de propor um texto para ser discutido pelos padres e madres sinodais apresente uma coletânea de dezenas de perguntas para o discernimento comum.

Não tenhas medo das perguntas. Vive-as! Elas contêm já sem si as respostas.

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