20 de outubro de 2006

Impressões

VIRAR DE PÁGINA

Estava previsto que no próximo Verão eu devia regressar à Etiópia, depois de seis anos na redacção das revistas que os Combonianos editam em Portugal. Entretanto, fui convidado a aceitar um novo desafio: integrar a equipa de combonianas e combonianos que há cerca de um ano estão a preparar a montagem de uma Rede Católica de Rádios nas sete dioceses do Sul do Sudão. É um projecto aliciante a que não consegui dizer não.
Os institutos combonianos aproveitaram a vaga de liberdade decorrente dos acordos de paz de Janeiro de 2003 entre o Governo de Cartum e o Movimento/Exército de Libertação do Povo do Sudão (SPLM/A) para montar as rádios, «um meio de comunicação da Igreja que constrói a paz através da reconciliação e cura dos traumas, promove o crescimento espiritual e oferece boa informação e educação cívica, contribuindo para o desenvolvimento humano integral e o respeito pelos direitos humanos».
O Sudão é um país imenso dividido em dois: o Norte, árabe e muçulmano, e o Sul, negro e cristão ou seguidor das religiões tradicionais. A hegemonia árabe transformou o Sul num enorme campo de batalha, com as forças do SPLM/A a combateram o exército sudanês para obterem a independência, que pode chegar agora através do referendo de 2011. O conflito durou 20 anos, matou 1,9 milhões de civis e fez mais de quatro milhões de deslocados. O governador de Torit faz um balanço dramático da situação: «Estamos todos destroçados: cidades, casas, corações.»
O conflito do Sul do Sudão deixou dez milhões de habitantes numa situação de extrema pobreza, depois de terem sido vítimas de um isolamento prolongado e de várias tentativas de arabização e islamização. A cadeia radiofónica, além de servir a evangelização directa, pretende criar uma cultura de reconciliação e de paz entre os Sudaneses, negros e árabes.
A rede vai emitir, em frequência modelada, em inglês, árabe e em algumas das 134 línguas locais. Quatro estações já foram licenciadas e têm as respectivas frequências atribuídas. Um grupo de jornalistas, radialistas, técnicos e administradores já está na fase de formação. Dentro de dois anos devem assumir o projecto por inteiro.
Os anos que passei à frente de Além-Mar foram breves mas intensos. A celebração dos 50 anos da revista de «perspectiva missionária» foi o ponto alto. E é particularmente gratificante verificar que, passado meio século, continua a ser uma referência no panorama das publicações missionárias em Portugal.
Parto agradecido. Ao aceitar trocar a China pela direcção da revista, o P. Manuel Augusto Ferreira permitiu-me aceitar o convite da Direcção-Geral do Instituto para dirigir a informação do projecto sudanês. Um virar de página na minha vida missionária e profissional que acolho com tranquilidade.
O meu obrigado também aos colaboradores, assinantes e leitores de Além-Mar e Audácia por todo o apoio dispensado durante estes dois anos tão cheios e tão interessantes.

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