27 de outubro de 2016

PAPA QUER VISITAR SUDÃO DO SUL

O Papa aceitou o convite dos líderes religiosos do Sudão do Sul para visitar o país e respondeu que quer ir ao país mais jovem do mundo destroçado pela guerra civil desde dezembro de 2013.

Francisco convidou ao Vaticano os primazes católico e anglicano e o moderador presbiteriano para o informarem sobre a situação no Sudão do Sul e a acção da Igreja no conflito que já fez mais de 300 mil mortos e 2,6 milhões de deslocados e refugiados.

O encontro entre o Papa Francisco, os arcebispos Paolino Lukudu Loro e Daniel Deng Bol e o moderador Peter Gai Lual decorreu esta manhã.

Uma nota da Rádio Vaticano explicou que os participantes testemunharam a boa colaboração entre as igrejas cristãs e manifestaram a disponibilidade em trabalhar juntos com renovada esperança e com confiança recíproca para responder de maneira efetiva às aspirações profundas daquela população.

No final Dom Paolino, o arcebispo comboniano de Juba, disse à Rádio Vaticano que o Papa afirmou que gostaria de visitar o Sudão do Sul.

Revelou que a delegação sul-sudanesa falou ao Papa da guerra, das matanças, dos refugiados e do medo prevalente.

No final convidaram Francisco a visitar o país.

O papa respondeu dizendo que estava próximo dos sul-sudaneses nos seus sofrimentos e repetiu duas vezes que queria visitar o Sudão do Sul.

O arcebispo Daniel Deng, primaz anglicano, esclareceu que «uma visita do Papa e do Arcebispo de Cantuária significaria unidade. Se os dois líderes dos grupos de fé maiores pudessem vir e pedir a paz, teria um grande impacte no país.»

O arcebispo católico de Juba também pediu ao Papa para enviar um núncio permanente para o Sudão do Sul. Até agora, o núncio no Quénia segue também o país.

O Papa precisa de um convite do presidente da República para visitar o Sudão do Sul.

Salva Kiir, um católico que até há dois anos ia regularmente à missa na Catedral de Juba, encontrou-se com Francisco numa audiência privada em novembro passado em Campala durante a visita papal ao Uganda.

O presidente explicou que deixou de ir à missa em protesto pelos conteúdos políticos das homilias de alguns celebrantes.

A provável visita do Papa ao Sudão do Sul vem na sequência da viagem que fez à República Centro-africana (RCA)  em dezembro passado para parar o conflito etnico-religioso que paralisou o país.

Francisco foi desencorajado a ir à RCA por razões de segurança mas não desistiu. Hoje o país vive dias melhores.

Juba: MORTES, VIOLAÇÕES E SAQUES


A Amnistia Internacional publicou um relatório a documentar a onda de mortes, violações e saques que tomou conta de Juba em julho passado quando as forças do governo e da oposição se defrontaram nas ruas e nos bairros da capital do Sudão do Sul.

O relatório «We did not believe we would survive», «Não acreditámos que sobreviríamos», tem por base 90 entrevistas que a organização internacional para os direitos humanos fez em Juba de julho a setembro a vitimas e testemunhas.

A crise começou a 8 de julho quando guarda-costas do primeiro-vice-presidente Riek Machar e tropas do governo se envolveram num tiroteio feroz junto ao Palácio Presidencial conhecido por J1.

O Presidente Salva Kiir, o primeiro-vice-presidente Riek Machar e o Vice-presidente James Wani Igga estavam no palácio a discutir as tensões crescentes entre as tropas do governo e os menos de 2000 soldados que faziam a guarda do Dr. Machar desde que regressou a Juba em abril.

Não se sabe quem deu o primeiro tiro! Sabe-se que no dia 8 de julho muitos combatentes e alguns civis morreram à volta do J1 e que os combates prosseguiram de 9 a 11 de julho, matando centenas de civis inocentes.

As tropas do governo atacaram a força de Machar com armamento pesado, tanques, helicanhões e deram «caça» aos moradores de etnia nuer, matando homens e violando sistematicamente mulheres.

Machar e menos de um milhar dos seus combatentes fugiram a pé para a República Democrática do Congo.

O relatório detalha os abusos cometidos durante e depois dos combates de julho: matanças deliberadas e desaparecimentos forçados, ataques indiscriminados, violação, saques e destruição de propriedades.

Também passa em revista a resposta inadequada das forças da ONU e analisa as obrigações legais internacionais.

«A luta foi marcada por violações sérias dos direitos humanos internacionais e da lei humanitária. A Amnistia Internacional descobriu que as forças do governo mataram deliberadamente civis e atiraram indiscriminadamente em bairros civis e à volta dos sítios da ONU para proteção de civis», lê-se.

«Colocando tanques e artilharia em áreas densamente povoadas e bombardeando alguns bairros com helicanhões, as forças do governo mostraram um desrespeito apático pela vida humana».

O documento também condena as forças de Machar por se escudarem entre civis nos campos de proteção da ONU, consideram o uso de escudos humanos crime de guerra.

A Amnistia aponta o dedo às forças da ONU que responderam à violência de julho de uma forma inadequada, falhando a missão de proteger civis.

Testemunhas contaram que algumas mulheres nueres foram violadas por soldados à frente de patrulhas dos capacetes azuis.

Por outro lado, as forças de paz recusaram-se a auxiliar agentes humanitários estrangeiros que foram atacados num hotel pelas forças do governo a menos de um quilómetro do quartel da ONU.

Um jornalista nuer foi assassinado a sangue frio no Hotel Terrain e muitas mulheres, algumas norte-americanas, violadas pelos soldados que roubaram tudo o que puderam e destruíram o resto numa orgia de vingança.

A Amnistia responsabiliza os líderes pelos crimes cometidos pelas suas forças e propõe um embargo de armas ao Sudão do Sul e a ativação imediata do Tribunal Híbrido para o Sudão do Sul para julgar os crimes de guerra e contra a humanidade.

«Muitos dos atos detalhados neste relatório, incluindo a morte deliberada de civis, violações e outras formas de violência sexual, e o saque e destruição de casas e negócios civis, são violações sérias destas regras [da lei humanitária internacional] e por isso constituem crimes de guerra», sublinha o relatório.

26 de outubro de 2016

PAPA NOMEIA BISPO COMBONIANO PERUANO


O Papa escolheu um missionário comboniano do Peru para liderar uma diocese no centro desse país andino.

O Papa Francisco nomeou o P. Luis Alberto Barrera Pacheco para bispo de Tarma no Peru, a Santa Sé anunciou ontem.

O P. Lucho é o superior provincial dos Missionários Combonianos no Peru e Chile desde 2011 e vice-presidente da Conferência de Superiores Maiores dos Religiosos do Peru um ano depois.

O bispo-eleito tem 50 anos. Fez a primeira profissão religiosa em 1991 e foi ordenado em 1995 depois do curso de teologia em Lima, a capital do Peru.

O P. Lucho trabalhou na República Centro-africana entre 1996 e 2007 na pastoral e formação de postulantes.

Em 2008 voltou ao Peru como formador no teologado de Lima até 2010.

Com a nomeação do P. Luis, os combonianos bispos são agora 20.

Sudão do Sul: PAPA CONVIDA LÍDERES RELIGIOSOS


O Papa convidou os líderes religiosos do Sudão do Sul ao Vaticano para explicarem a situação em que o país vive.

Os arcebispos Paolino Lukudu Loro, católico, Daniel Deng Bul, anglicano, e Peter Gai, presbiteriano, partiram ontem de Juba para Roma onde vão discutir com o Papa Francisco a situação que vive o país mais jovem do mundo, Rádio Bakhita anunciou.

Dom Paolino explicou aos jornalistas à partida de Juba que o Papa Francisco convidou os líderes religiosos do país para verificar a situação no país e ver o que a Igreja está a fazer.

O Sudão do Sul está em guerra civil desde dezembro de 2013, dois anos e meio após a independência.

1,3 milhões foram deslocados dentro do país, mais de um milhão estão refugidos nos países vizinhos e 300 mil pessoas foram mortas no conflito que opõe o presidente Salva Kiir Mayardit ao ex-presidente Riek Machar Teny.

«O Papa vai escutar-nos e nós vamos escutar o papa», disse Dom Paulino.

«O objetivo é a procura para a nossa paz. E para mostrar que o mundo inteiro está preocupado com a paz neste país, e também a Igreja», explicou o primaz católico do Sudão do Sul.

E acrescentou: «Esperamos que a voz do Papa não seja só para nós mas para o mundo inteiro sensibilizando o mundo para a situação no Sudão do Sul.»

O arcebispo comboniano concluiu que todos querem a paz e a bênção papal.

A audiência do Papa Francisco com os três líderes religiosos do Sudão do Sul acontece dias depois de a Amnistia Internacional apresentar um relatório em que responsabiliza os líderes do país pelos crimes de guerra cometidos por ambas as partes do conflito.

19 de outubro de 2016

MÃE DA MISERICÓRDIA


São sete e meia da tarde. O sol acabou de se esconder. Começa a hora do recolher obrigatório neste conturbado Darfur. Antes de fechar o portão do adro da igreja, paro diante da estátua do nicho de Nossa Senhora que, de facto, se tornou um bom hábito em mim, levando-me, espontaneamente, a puxar pelo terço que trago no bolso. Estamos no mês de outubro, o mês do Rosário.

Avisto um vulto branco do lado de fora do portão ainda aberto. À medida que me vou aproximando, distingo um homem ali parado, olhando numa única direcção dentro do adro, num ponto fixo que lhe terá, porventura, encantado a alma. Um rosário muçulmano de contas volumosas pendia-lhe da mão direita. Inspirava serenidade e paz.

Cheguei-me ao pé daquela figura de jalabia branca, a túnica que os árabes usam no dia-a-dia e sobretudo na sexta-feira, o seu dia santo.

Era um homem já de idade. Inclinei-me para ouvir o que supostamente me queria dizer. Só então os seus olhos deram comigo, ao mesmo tempo que decifrei um pedido na sua roufenha voz: «Ia hajj, meu respeitável senhor, dá-me licença?»

«Faça favor, meu bom homem», - respondi, convidando-o a entrar. Ao mesmo tempo que lhe indicava o zir, a grande bilha de água, e um banco ali mesmo ao lado, disse-lhe: «Beba, sente-se um pouco e descanse, antes de prosseguir caminho.»

Depois de ter bebido, o homem dirigiu-se apressadamente para o nicho. Pela forma resoluta e decidida de agir, faz-me pensar que esta não seria, certamente, a primeira vez que aqui veio. Aí se quedou, olhando fixamente para a Nossa Senhora. De pé. Em silêncio. Imóvel.

Depois de uns bons minutos em contemplação, fez questão de me dizer o seu nome, Mahmude. Não se cansava de agradecer a bela ocasião de ter podido estar com a mãe. Esta palavra, mãe, imediatamente me faz pensar em Maria e seu filho Issa, Jesus, segundo vem escrito no Alcorão. Mas hoje quero aproveitar a ocasião de ouvir o testemunho pessoal de um bom e devoto muçulmano.

Enquanto caminhávamos devagar para o portão de saída, perguntei em tom provocador: «A mãe? A mãe de quem?»

«A mãe de Issa, Jesus, um dos grandes profetas do Alcorão», respondeu.

E ousou acrescentar: «Acho que esse profeta também é uma grande e alta personalidade no vosso livro santo, dos cristãos, não é verdade?»

«Sim, sim, tem toda a razão», confirmei.

Pedi ainda uns minutos de paciência ao bom ancião.

Como missionário, a pessoa de Maria tem estado muito presente na minha relação diária com a minoria de cristãos desta paróquia de Nyala. Mas, falar de religião com os muçulmanos, até mesmo com os amigos mais pessoais, a coisa vai mais devagar. Esta é, pois, uma ocasião providencial para o efeito desejado.

Não o deixei ir embora sem me responder à curiosa e intrigada pergunta: «Ia hajj, meu respeitável senhor: quem é Maria para si? que lugar ocupa ela na sua vida?»

Ele olhou para mim, surpreendido, pela fácil e banal, para não dizer inútil, pergunta.

Como o interesse era todo meu, continuei: «Sim, sim, estou a referir-me a Mariam, à mãe de Issa, Jesus.»

O sábio ancião respondeu prontamente e de boa vontade.

«Deus é Rahman Rahim, Clemente e Misericordioso por excelência, e transmite tudo aquilo que Ele é e possui ao profeta Issa – embora o profeta extraordinário e incomparável, Maomé tenha sempre o primeiro lugar» – certificou.

«O nosso livro Sagrado, o Alcorão, diz-nos que Issa, Jesus, nasceu sem pai na terra e que sua mãe se chamava Mariam. Um grandioso milagre operado pela Misericórdia do Deus Altíssimo! Pode, porventura, alguem pensar no filho e esquecer a mãe? Certamente que não», concluiu.

Depois de ter proferido estas palavras, o rosto do misterioso e simpático amigo adoptou uma expressão majestosa e, ao mesmo tempo, tão doce, capaz de convencer o mais incrédulo dos humanos.

Falou com uma certeza surpreendente: «A rahma, a misericórdia, habita em Deus e em Issa, Jesus, de forma cabal e perfeita.»

Depois, inclinou-se sobre o meu ouvido, não fosse eu perder a essência e preciosidade das suas palavras à causa da sua voz roufenha.

«A conclusão é clara como o sol. Mariam participa da rahma, da misericórdia, de Deus e de Issa. Ela é a mãe, a cheia de rahma, misericórdia. E está sempre pronta a distribui-la e dispensá-la, não só a mim, muçulmano, mas também a ti e todas os seres que vivem à face da terra», disse.

Depois destas palavras tão sábias, o meu amigo Mahmude quedou-se ali, de pé, como que esperando a minha reacção. A verdade é que ele, na sua humildade, temia pela integridade da minha fé como cristão e não queria ofender-me com as palavras que tinha pronunciado. Mas, pelo contrário, tenho, sim, muito que agradecer a Deus pela grande lição de teologia.

Desde o nicho de Nossa Senhora até ao portão de saída, entre contemplação e oração, ouvindo e partilhando lições de teologia da misericórdia, fez-se noite cerrada. O teólogo da jalabia branca despediu-se, acenando com a mão e o grande rosário que lhe fustigava a cara. Hoje, alguém transgrediu a lei vigente do Darfur – o recolher obrigatório – aceitando praticar uma obra de misericórdia para comigo.

Obrigado, meu Deus, porque nos deste Maria, Mãe de misericórdia! Tão de graça o recebeu como tão de graça o dá. A mim, missionário no Darfur, e a todo aquele que abra os braços e o coração a esse grande dom.

Com Maria, missionários da misericórdia!

P. Feliz da Costa Martins
Missionário comboniano no Darfur – Sudão

18 de outubro de 2016

SUDÃO DO SUL: CENTRO DE PAZ ABRE

Arcebispo Charles comissiona equipa do Centro

O Centro de Paz Bom Pastor foi inaugurado a 15 de outubro em Kit, a 15 quilómetros de Juba, na margem direita do Nilo Branco.

O núncio no Quénia e Sudão do Sul, arcebispo Charles Daniel Bravo, presidiu à Eucaristia da inauguração que contou com a presença de alguns bispos, religiosos, autoridades civis, diplomatas, doadores e muitos populares.

O Centro foi construído pela Associação dos Superiores Religiosos do Sudão do Sul para a formação humana, espiritual e pastoral, construção da paz e cura de traumas.

A associação representa 47 congregações e cerca de 400 religiosos e religiosas.

No Sudão do Sul não havia uma estrutura católica para retiros, formação e congressos. A alternativa era ir ao Uganda ou Quénia ou alugar um hotel barato em Juba.

A ideia foi lançada em 2013 e o projeto demorou 17 meses a ser construído – um feito enorme tendo em conta as dimensões do centro e a situação de guerra em que vive o Sudão do Sul.

O centro com 40 quartos duplos e um espaço para jovens, tem salas de conferência, refeitório, uma capela grande e espaços de apoio para pequenos grupos.

O centro cresceu num espaço abandonado durante a guerra civil que pertence a um instituto local, os Irmãos de São Martinho de Porres.

O P. Daniel Moschetti, provincial dos combonianos e presidente da Associação dos Superiores Religiosos do Sudão do Sul, explicou num depoimento que «dado o conflito no país e as dificuldades em trazer materiais de construção e empregar uma força de trabalho capaz, a conclusão do centro dentro do orçamento foi um sucesso completo».

Os construtores, cristãos e muçulmanos, deram um testemunho de harmonia e trabalho conjunto sem incidentes.

O Centro de Paz Bom Pastor conta com cinco membros: uma freira americana, um irmão do Uganda e três padres do Ruanda, Filipinas e Sudão do Sul de cinco congregações diferentes.

O P. Moschetti diz que é «uma equipa que vive a unidade na diversidade. É uma mensagem para o Sudão do Sul de trabalho em conjunto em fraternidade para uma visão comum e futuro».

16 de outubro de 2016

ETIÓPIA EM ESTADO DE EMERGÊNCIA


A Etiópia está sob estado de emergência desde 8 de outubro em resposta a protestos violentos contra o Governo.

O primeiro-ministro Hailemariam Desalegn decretou seis meses de estado de emergência para controlar os protestos antigovernamentais cada vez mais fortes e violentos nas regiões da Oromia e Amara.

«Queremos parar com a destruição contra projectos de infraestrutura, centros de saúde, de administração e edifícios de justiça», explicou o primeiro-ministro na televisão etíope ao anunciar o estado de emergência.

Desalegn disse que a onda de protestos que alastra um pouco por todo o país põe em causa a integridade nacional.

Os protestos começaram em novembro de 2015 quando o Governo anunciou planos para alargar o perímetro urbano de Adis-Abeba, a capital etíope.

Os agricultores oromos manifestaram-se contra a ocupação dos seus terrenos férteis.

Desde então mais de 500 pessoas foram mortas pela polícia e pelos militares em protestos.

A 2 de outubro, 52 pessoas morreram durante um festival oromo em Bishiftu, nos arredores da capital.

Os distúrbios chegaram às zonas mais remotas da Oromia, incluindo Sollamo, a capital do distrito do Uraga, a mais de 500 quilómetros de Adis-Abeba.

Os amaras que contestam a anexação de território tradicionalmente seu ao estado do Tigrai fizeram coro com os oromos, bloquearam as entradas para Adis-Abeba e pararam a cidade turística de Bahr Dar.

A Etiópia é controlada pela elite política do Tigrai desde 1991, quando os rebeldes tigrinos derrotaram o regime comunista com a ajuda dos oromos.

Oromos e amaras fazem cerca de 70 por cento da população etíope.

Os tigrinos quedam-se pelos seis por cento, mas têm-se mantido no poder através de alianças locais.

A elite tigrina controla cerca de 70 por cento de economia etíope e tem feito negócios de terras pouco claros com investidores estrangeiros, expropriando as terras aos agricultores.

Segundo a Constituição etíope, a terra pertence ao Estado, que a concede aos interessados, um entendimento muito diferente dos grupos étnicos que consideram as terras ancestrais como suas.

12 de outubro de 2016

ÁFRICA: COMBONIANOS LOCALIZAM SUPERIORES MAIORES


Doze das 13 circunscrições combonianas na África vão ser governadas por missionários africanos a partir de 1 de janeiro de 2017.

Este é o resultado do processo para a eleição dos superiores de circunscrição nomeados a 10 de outubro de 2016 para o triénio 2017-2019.

Os missionários das 26 províncias e delegações em que os combonianos estão divididos iniciaram o processo de eleição dos superiores de circunscrição e respectivos conselheiros a 1 de maio de 2016.

O processo que inicia com uma sondagem e conclui com a eleição do superior provincial ou delegado e dos seus conselheiros termina a meados de dezembro.

Pela primeira vez todas as províncias e delegações da África vão ter superiores africanos, exceto a Etiópia que escolheu um provincial italiano.

Falta ainda apurar o provincial do Togo-Benim-Gana mas tudo indica que o escolhido será um missionário togolês a trabalhar no Sudão do Sul.

É mais um passo para realizar a intuição de São Daniel Comboni que há mais de 150 anos propôs a salvação da África através dos africanos.

O superior geral dos missionários combonianos é um etíope, o P. Tesfaye Tadesse.

Os resultados na América Latina são ligeiramente diferentes: três das sete circunscrições vão ser dirigidas por missionários europeus: o Brasil por um italiano e a Colômbia e o Peru por espanhóis.

O delegado da Ásia é português.

As cinco províncias europeias são dirigidas por membros radicais.

Os superiores provinciais para serem eleitos devem ter pelo menos 50 por cento dos votos expressos mais um.

Os resultados são confirmados pelo Conselho Geral que nomeia os superiores de circunscrição.

10 de outubro de 2016

COM COMBONI: PASTORES BONS E BELOS


A Igreja confiou aos combonianos uma parte do selfie de Jesus-pastor bom e belo para celebrarmos a solenidade de São Daniel Comboni, nosso pai e fundador.

Este texto faz parte do património espiritual que Daniel Comboni nos legou. Na relação à Sociedade de Colónia, a 15 de fevereiro de 1879, escreveu: «O Sagrado Coração de Jesus palpitou também pelos povos negros da África Central e Jesus Cristo morreu igualmente pelos Africanos. Jesus Cristo, o Bom Pastor, acolherá também a África Central dentro do seu redil» (Escritos 5647).

Neste parágrafo Comboni junta dois ícones cristológicos que combina num só: o Sagrado Coração de Jesus e Jesus Cristo, o Bom Pastor, de que resulta a mística comboniana do Bom Pastor do Coração Trespassado. A Regra de Vida 3.1 indica que se trata de «uma preciosa herança este aspeto relevante do carisma do Fundador», um património a conservar, aprofundar e inculturar.

Na Carta Circular aos participantes no Concílio Vaticano I, a 24 de junho de 1870, Comboni escreveu: «É preciso, pois, fazer todo o esforço para que a Nigrícia se una à Igreja Católica. Pedem-no a honra e a glória de N. S. Jesus Cristo, a cujo império ainda se não submeteu a África Central, depois de tanto tempo e apesar de Ele ter derramado o seu sangue para a sua regeneração. Exige-o a promessa feita por Nosso Senhor à Santa Madre Igreja: “Haverá um só rebanho sob um só pastor” (Jo.10)» (Escritos, 2308).

Para Comboni, Jesus é o «eterno e sumo Pastor» (Escritos, 3780). Chamou Obra do Bom Pastor ao grupo que fundou para apoiar a missão da África Central e Anais do Bom Pastor ao órgão de informação ao serviço da missão, publicado ainda hoje com o título de Nigrizia.

Volvamos o olhar do nosso coração para o ícone que a Igreja nos confia para celebrarmos a solenidade do fundador (João 10, 11-16).

Jesus revela-se como o pastor que é καλός – bom e belo – e põe a vida para a ovelhas ou como diz a tradução portuguesa «dá a vida pelas suas ovelhas».

A mística do Bom e Belo Pastor do Coração Trespassado tem algumas consequências práticas para os discípulos missionários.

Comboni escreveu na quarta edição do Plano para a regeneração da África: «À imitação do Divino Pastor, [os apóstolos] tomarão, dos espinhos em que se encontravam e da opressão em que jaziam, aquelas míseras ovelhas sobre os seus ombros para as levar em triunfo às livres e férteis pastagens da Igreja» (Escritos 2791).

Mais tarde, escreve na Relação histórica e estado do Vicariato da África Central à Sociedade de Colónia em 1877 em ligação com o Islão: «O missionário mergulhado em profunda oração, no meio destas solidões incomensuráveis, julga ouvir a voz do Divino Pastor que busca a ovelha negra perdida» (Escritos 4949).

É uma mística que nos abre a Deus e ao seu povo, a toda a criação.

Jesus compara o pastor com o mercenário: o pastor dá a vida, o mercenário foge para salvar a própria pele do lobo que «arrebata e dispersa» as ovelhas. As ovelhas são do pastor, o mercenário não se preocupa com elas: é um assalariado.

Para dar a vida temos que ser plenamente viventes, completamente vivos. Santo Ireneu de Lião escreveu que «a glória de Deus é o homem vivo e a vida do homem consiste na visão de Deus».

Os Documentos Capitulares 2015 sublinham o preço do pastoreio recordado na vida dos nossos 25 mártires, missionárias e missionários: «para defender a vida das ovelhas temos de enfrentar lobos e ladrões» (DC’ 15, 4).

Comboni já o houvera dito: «O missionário apostólico não pode percorrer senão o caminho da cruz do divino Mestre, semeada de espinhos e fadigas de todo o género. […] Portanto, o verdadeiro apóstolo não deve ter medo de nenhuma dificuldade, nem sequer da morte. A cruz e o martírio são o seu triunfo» (Escritos 5647).

Jesus passa depois para a descrição da relação com o seu rebanho: «conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me, do mesmo modo que o Pai me conhece e Eu conheço o Pai».

Jesus fala de um conhecimento que ultrapassa a mera acumulação de informação. Trata-se de um conhecimento cordial que é relação, intimidade, comunhão pessoal.

Antoine de Saint-Exupéry escreve em O Principezinho que «só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.»

Voltamos de novos aos documentos do Capítulo: «Característica do discípulo é o encontro pessoal com o Bom Pastor e a escuta da sua voz, saboreando o seu amor e caminhando atrás d’Ele (João 10, 1-21)» (DC’ 15, 2).

Mais à frente lemos: «É necessário manter os olhos fixos em Jesus Cristo que nos introduz na contemplação do mistério de Deus, mas também no mistério do homem, onde o encontramos presente na sua riqueza e diversidade» (DC’ 15, 28).

A relação única, pessoal e comunitária que temos com a Trindade Santíssima é o conhecimento que somos chamados a partilhar no serviço missionário que vamos desenvolver – para não sermos nem mercenários nem vendedores de uma ideologia cristã.

Os capitulares escreveram-nos: «Queremos viver uma relação de comunhão com Deus e partilhá-lo com quem está ao nosso lado» (DC’ 15, 29).

Finalmente, Jesus diz que precisa de reunir outras ovelhas! O discípulo missionário tem que estar disponível para partir para outros rebanhos em estado de missão permanente: o mundo é o seu espaço e o seu limite. A grande tentação é transformar a tenda de pastor em morada do guardador.

A Palavra de Deus é para todos e é uma palavra que congrega: «elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só pastor».

Daí o desafio do Capítulo: «Jesus chama-nos a viver e a promover vida plena para todos, conscientes de que trabalhamos num mundo em que forças poderosas levam por diante um plano de morte e destruição» (DC’ 15, 2).

O Pastor Bom e Belo ensina-nos a dar a vida e para isso dá-nos a vida em plenitude (João 10, 10). Um ícone que inspirou Comboni e nos desafia: tendo os olhos fixos em Jesus somos chamados a ser pastores segundo o coração de Deus, inteligentes e sabedores (Jeremias 3,15) na senda do nosso fundador.

5 de outubro de 2016

PARQUE JURÁSSICO


Teodoro Obiang  e Robert Mugabe

Na África mandam alguns dos presidentes de mais longa duração do presente.

O Congresso do MPLA, o Movimento Popular de Libertação de Angola, reconduziu José Eduardo dos Santos no leme do poder em Agosto durante o VII Congresso. Uma prenda de anos para um dos presidentes mais longevos da África e do mundo. Herdou a presidência do partido e do país à morte de Agostinho Neto em 1979.

Contudo, o título de mandatário mais longo vai para Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, que dirige a Guiné Equatorial com punho de ferro há 37 anos. Chegou ao poder por meio de um golpe de Estado em 1979. Na tabela da Liberdade no Mundo 2016 da Freedom House a Guiné Equatorial está entre os dez países menos livres do mundo. Três quartos da população vivem na pobreza apesar do petróleo.

José Eduardo dos Santos ocupa a segunda posição como estadista mais veterano, com 37 anos de governo. Anunciou que vai abdicar em 2018 depois de concorrer às eleições gerais de 2017. Alguns observadores dizem que querem ver para crer: o anúncio pode ter sido uma estratégia para desviar a atenção mundial da oposição ao regime. Angola é o maior produtor de petróleo da África, mas dois terços da população vivem com menos de dois euros por dia.

Robert Mugabe é o decano dos presidentes – tem 92 anos – e ganhou as primeiras eleições em 1980, depois da independência do Zimbabué. Está no poder há 36 anos e não dá sinais de cansaço político.

Outros presidentes africanos de longa duração são Paul Biya, a mandar nos Camarões desde 1982 por via constitucional; Yoweri Museveni, presidente do Uganda desde 1986 ao vencer a guerra civil; Omar al-Bashir usurpou a presidência do Sudão em 1989; Idriss Deby governa o Chade desde 1990 depois de um golpe de Estado; Isaias Afwerki chegou ao poder na Eritreia na sequência da independência e transformou o país num enorme campo de concentração; Yahya Jammeh tomou o poder na Gâmbia em Julho de 1994; Denis Sassou Nguesso governa a República do Congo há 19 anos depois de uma guerra civil que venceu com a ajuda de Angola em 1997. Já tinha sido presidente entre 1979 e 1992; e Paul Kagame, o rebelde que derrotou o Governo do Ruanda em 1994 e pôs fim ao genocídio; começou por ocupar a vice-presidência. É presidente desde 2000, mas pode ficar até 2034 com a legislação que fez passar.

Os líderes perpetuam-se no poder à custa do controlo apertado da segurança, do aparelho de Estado e da economia: distribuem benesses para comprar apoios, mudam as Constituições quando os limitam, alguns vencem eleições antes de as urnas abrirem.

Há quem passe o poder aos filhos numa sucessão dinástica republicana: o presidente Obiang nomeou o filho segundo vice-presidente da Guiné Equatorial; Museveni tentou preparar a sucessão do rebento, mas a oposição não deixou; Santos meteu dois filhos no Comité Central do MPLA durante o último congresso e entregou a empresa estatal do petróleo à filha Isabel. A Forbes diz que é a mulher mais rica da África, com uma fortuna avaliada em quase três mil milhões de euros.

Os 11 mandatários-dinossauros africanos somam juntos 307 anos no governo. O poder sem limites nem controlos corrompe e tende a perpetuar-se à falta de sistemas políticos sem mecanismos legais à prova de presidentes (quase) vitalícios.