30 de março de 2015

NOVAS COLONIZAÇÕES


A juventude africana precisa de ser protegida de novas formas de colonização sem escrúpulos através da educação.

O Papa Francisco recebeu uma representação do Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar (SECAM) no início de Fevereiro e deixou-lhes um recado importante: «Na África, o futuro está nas mãos dos jovens, que precisam de ser protegidos de novas e inescrupulosas formas de “colonização” como a busca de sucesso, riquezas e poder a todo o custo, bem como o fundamentalismo e o uso distorcido da religião juntamente com novas ideologias que destroem a identidade dos indivíduos e das famílias.» E propôs uma saída: «A maneira mais efectiva de ultrapassar a tentação de cair em estilos de vida nocivos é o investimento na educação.»

Não é por acaso que os fundamentalistas islâmicos do Norte da Nigéria se denominam a si mesmos Boko Haram, que significa «educação proibida», e fazem das escolas e da população estudantil alvos distintos. Em Abril do ano passado, raptaram quase 300 meninas do Internato de Chiboko e pelo menos 219 ainda estão nas suas mãos. Os extremistas continuam a matar e raptar estudantes e a destruir escolas, mantendo cerca de 10 mil crianças fora da educação.

O papa argentino acrescentou que «a educação também ajuda a ultrapassar a mentalidade vigente de injustiça e violência juntamente com as divisões étnicas». E preconizou um modelo de educação que ensine os jovens a pensar criticamente e encoraje a adopção de valores morais.

Pedi a Orla Treacy um comentário sobre as palavras do Papa Francisco. Esta freira irlandesa de 42 anos dirige com carinho e determinação a Escola Secundária de Loreto, um internato para meninas, em Rumbek, no Sudão do Sul. A escola, aberta pelas Irmãs de Loreto em Abril de 2008, já formou 64 estudantes e tem 184 matriculadas neste ano lectivo.

A Ir. Orla confessou-se encantada com o comentário do papa sobre as dimensões académica e pastoral da educação. E explicou: «Aqui em Loreto, lutamos muito por uma abordagem integral da educação. As nossas alunas vêm de um fundo cultural muito forte que nega às mulheres e às meninas direitos básicos, e em particular o direito à educação. Ao aceitarmos as meninas na escola, sonhamos que sejam educadas num nível em que possam aprender a reflectir criticamente sobre valores cristãos e questões morais e possam ser empoderadas. Desgraçadamente, a cultura da Igreja e da sociedade nem sempre apoia isto. Muitas meninas são tiradas da escola e casadas à força e as que terminam devem seguir a prática cultural de serem casadas pelo seu valor em vacas.»

A religiosa salienta o problema da poligamia. Recorda que as meninas são espancadas até à submissão para aceitarem um casamento polígamo e depois a Igreja considera-as estranhas porque não celebraram o matrimónio cristão.

Uma aurora de esperança já rompe o horizonte. A Ir. Orla explica que «no internato recebemos meninas de todos os clãs e tribos dos pais. Aprendendo a viver, estudar, reflectir juntas levou-as a vínculos profundos de amizade. Fora da escola, as famílias das alunas podem estar a lutar umas com as outras, mas na escola vivem em harmonia e todas as diferenças são postas de lado. Muitas crescem com mitos sobre os clãs vizinhos, mas quando se juntam na escola descobrem que são todas iguais.»

A Ir. Orla termina com uma nota de expectativa: «Muitas das alunas que conseguiram terminar a escola secundária continuaram a sua educação. O sonho é que estas graduadas no futuro venham a ter posições de autoridade na sociedade e lentamente ajudem a trazer mudança sobretudo na construção da paz e na dignidade da mulher.»

7 de março de 2015

MEDIA COMBONIANOS EUROPEUS

Encontro Media Combonianos Europeus 2015
Documento final

Nós, Combonianos e Combonianas que trabalhamos no ministério da comunicação na Europa, juntamente com leigos colaboradores e colaboradoras, reunimo-nos de 24 a 27 de Fevereiro de 2015 na Casa-Mãe das Irmãs Missionárias Combonianas em Verona, para reflectir sobre o tema do próximo Capítulo Geral dos MCCJ.

Dois peritos em comunicação ofereceram motivos para melhorar a nossa comunicação na Europa.

Partilhámos a realidade dos nossos títulos e apreciámos o trabalho desenvolvido nas revistas, nos sites, nas redes sociais e com os media digitais em geral; o investimento em pessoal e recursos feito pelo Instituto e pelas circunscrições é considerável e deu frutos relevantes.

Constatamos que as nossas revistas desempenham um serviço importante na sociedade e Igreja da Europa. Consideramos que os nossos media são um instrumento vital para a animação missionária da Igreja local. Acreditamos além disso que os nossos Institutos tenham beneficiado e beneficiem, em termos de vocações e animação missionária, dos media que dão a conhecer o carisma comboniano. Todavia, deste encontro emergiu a necessidade de dar início a uma mudança substancial nos nossos projectos de comunicação, em particular relativamente aos seguintes aspectos:

Jovens – atingimos os idosos, alguns adultos e crianças, mas não conseguimos comunicar com os jovens. É preciso pôr-se à escuta e aprender deles, investir mais na comunicação online, cultivar de forma continuada a relação interpessoal com eles, procurar testemunhos significativos e usar uma linguagem propositiva e não lamuriosa.

Missão – a atenção à Europa de hoje, e em particular aos jovens, coloca-nos esta pergunta: «onde irá a missão na Europa no século XXI?». Isto chama-nos a caminhar com os jovens para descobrir com eles que contributo o nosso projecto de comunicação poderá dar. Preocupa-nos também situações correlativas a Justiça, Paz e Integridade da Criação (migrações, direitos dos povos, conflitos, tráfico de armas e pessoas, degradação ambiental…) para promover uma transformação da sociedade segundo os valores do «reino». Sentimos a exigência de aprofundar a reflexão sobre estes desafios missionários como família comboniana a nível dos secretariados de evangelização e animação missionária na Europa.

Organização – dentro dos nossos limites, na Europa temos centros de comunicação bastante estruturados, mas a nova realidade da missão e da comunicação impõem uma maior integração no interior de cada centro de comunicação e uma maior sinergia entre os centros. Em particular:
  • Durante os encontros propomos elaborar e partilhar entre redacções uma lista de temas vitais para a Europa, que cada centro desenvolva a seu modo (os textos serão partilhados através do secretariado geral da animação);
  • Pede-se aos Conselhos Gerais para internacionalizar as redacções, com jovens confrades e irmãs, ou leigos, de outros continentes;
  • Encorajamos as possibilidades de sinergia também com centros e organizações exteriores à Família Comboniana.

Comunicação transmedial – estamos convictos/as de que o futuro próximo da comunicação seja transmedial ou seja, que, para comunicar hoje a nossa mensagem de modo eficaz, devemos valorizar e integrar as diversas plataformas de comunicação (papel, online, áudio, vídeo, redes sociais, infográfica…). Em parte já o estamos a fazer, mas é preciso melhorar o uso integrado dos vários meios em direcção a um objectivo comum.

Estratégia

Para evitar na Europa uma inútil dispersão de meios e pessoas, é urgente parar e elaborar uma estratégia que nos ajude a dar resposta aos desafios apresentados; é necessário decidir onde investir os recursos humanos e materiais. Em particular:
  • Preparar com urgência jovens para encontrar os jovens, até oferecendo-lhes espaços de colaboração no interior dos nossos centros de comunicação;
  • Pedir aos Conselhos Gerais e/ou de Circunscrição para programar a rotatividade do pessoal dos centros (redacção e administração), providenciando uma adequada preparação profissional;
  • Ponderar melhor a preparação dos encontros continentais, de modo a estudar temas de interesse comum mais relevante;
  • Privilegiar encontros sobre temáticas específicas;
  • Convidar para os encontros representantes dos media combonianos de outros continentes;
  • Correlacionar a nossa comunicação a formas de lobby já operativas.
Verona, 27 de Fevereiro de 2015

3 de março de 2015

PENÁLTI


A África viveu exuberante mais uma festa do futebol que a Costa do Marfim ganhou ao Gana nas grandes penalidades. A luta pela taça deixou no entanto à vista as dificuldades estruturais do futebol africano. 


Dezasseis selecções do Noroeste, Centro e Sul do continente disputaram a 30.ª Taça das Nações Africanas (CAN), jogada na Guiné Equatorial de 17 de Janeiro a 8 de Fevereiro. Depois de 32 jogos com muitas incidências e emoções, os Elefantes da Costa do Marfim (na foto) derrotaram os Estrelas Negras do Gana por 9-8, em 22 penáltis. Boubacar Barry, o guarda-redes marfinense, foi o herói da final: defendeu um penálti e bateu o remate vencedor. A República Democrática do Congo ficou em terceiro lugar e a selecção anfitriã em quarto.

Marrocos tinha ganhado o direito de organizar a taça africana, mas pediu um adiamento por causa da epidemia de ébola que continua a matar na África Ocidental. A CAF, Confederação Africana de Futebol, não aceitou e entregou a organização da CAN à Guiné Equatorial, que a preparou num tempo recorde de menos de dois meses. Uma equipa de médicos cubanos encarregou-se de fazer a triagem aos atletas e espectadores para despistar casos de ébola.

Os bilhetes para os jogos custavam entre um e 20 dólares, de 88 cêntimos a 17 euros e meio. O presidente da Guiné Equatorial, Teodor Obiang Nguema Mbasogo, comprou 40 mil bilhetes por 30 mil euros para oferecer e «dar carácter solene» ao evento. E propôs que os ricos do país fizessem o mesmo. O seu regime é dos mais corruptos e ditatoriais do continente.

Os quatro estádios onde se disputaram as 32 partidas da CAN tinham uma lotação conjunta de 60 400 espectadores, 5000 a menos que o Estádio da Luz.

Dos 368 jogadores inscritos na competição só 26 tinham mais de 30 anos. Estrelas como Didier Drogba e Samuel Etoo ficaram de fora, como de fora ficaram dois pesos-pesados do futebol africano: Egipto e Nigéria, que não se qualificaram. Metade dos atletas que jogaram na CAN milita em campeonatos europeus, incluindo 75 na França, 26 na Espanha, 21 na Bélgica e na Inglaterra e 15 em Portugal. Havia também dois treinadores portugueses na CAN.

A CAF teve mão pesada na taça. Marrocos vai pagar 880 mil euros de multa e 8 milhões de indemnização e fica fora das edições de 2017 e 2019 por recusar organizar o certame. O país anfitrião tem de desembolsar 88 mil euros porque os adeptos interromperam o jogo das meias-finais durante 40 minutos quando a Guiné Equatorial perdia por três a zero contra o Gana. A Tunísia pode ficar fora da taça de 2017 se não pedir desculpas pelos comentários contra a arbitragem depois do jogo dos quartos-de-final com a Guiné Equatorial. Os anfitriões empataram o jogo no minuto 90 com um penálti duvidoso. O árbitro foi suspenso por seis meses.

O futebol africano enfrenta grandes dificuldades estruturais, mas o continente é um autêntico alfobre de valores que encantam as ligas europeias com o seu futebol e são vítimas de racismo. As academias locais descobrem e trabalham os talentos que depois lançam nos relvados internacionais. Em Portugal, quantos são? «São muitos» foi a resposta que consegui da Federação depois de quatro mensagens de correio electrónico e uma visita.

Joseph Blatter, o patrão da FIFA, a autoridade que governa o futebol mundial, assinou um acordo com a CAF antes da final da taça para desenvolver o futebol africano através da formação de treinadores e árbitros, do futebol juvenil e da medicina desportiva – e talvez para assegurar o quinto mandato à frente da FIFA.

Uma nota final: a ideia da Confederação Africana de Futebol nasceu em Lisboa em Junho de 1956 durante um congresso da FIFA. Um ano depois, Egipto, Sudão, Etiópia e África do Sul fundaram a CAF. Hoje a associação conta com 56 membros e está sediada no Egipto.