22 de fevereiro de 2007

Sabedorias

O CAÇADOR QUE FALOU DE MAIS

Pela boca morre o peixe, diz-se entre nós. Esta fábula do Benim vai um pouco mais longe: quem fala sem pensar bem no que diz pode causar muito dano a si e aos outros.

Era tempo de escassez, como muitas vezes acontece em África, onde a fome e a sede visitam com frequência as aldeias. Um dia, de manhã cedo, apenas o galo cantou pela primeira vez, Koumba, o caçador, juntou as suas flechas e o seu arco e embrenhou-se pela floresta à procura de caça. Andou durante muito tempo, até o Sol nascer, mas de caça nem o rasto…
Koumba não se deixou vencer e continuou a sua busca durante o dia, até ao pôr do Sol. Estava a ficar desanimado por ter de regressar à aldeia de mãos a abanar, quando de repente deparou com o sapo Ponta, que tecia algodão enquanto guardava o seu campo de milho. Uma coisa nunca vista: um sapo tecedor que cultivava um campo de milho!
O caçador aproximou-se devagar, com prudência, para cumprimentar o sapo. Ponta mostrou-se muito cordial e convidou-o a sentar-se e a comer uma espiga de milho, que entretanto ele mesmo acabara de assar nas brasas. O caçador comeu com gosto. Era tempo de escassez e há muito que não comia milho tão saboroso.
Quando Koumba se levantou, para regressar a sua casa, Ponta recomendou-lhe:
– Do que viste, não deves contar nada a ninguém. Recorda-te: «A boca de um homem pode dar-lhe a vida ou causar-lhe a morte!»
Koumba tranquilizou-o:
– Não te preocupes, não sou uma pessoa que dá com a língua nos dentes! E pôs-se a caminho para regressar à aldeia.
Mas o que tinha visto era de tal maneira extraordinário que, apenas chegou à aldeia, se esqueceu da promessa e foi direito à casa do rei, não descansando enquanto não lhe contou tudo:
– Meu rei, disse-lhe, não imaginas o que me aconteceu: andava à caça na floresta quando descobri numa clareira um grande campo de milho onde as plantas cresciam apesar da seca. E o mais surpreendente é que o dono do campo era um sapo fiador!
– Um sapo fiador a guardar o seu campo de milho?! Não pode ser verdade, disse o rei, isso é coisa que tu inventaste.
– Não, insistiu Koumba, não se trata de um sonho. Vi o sapo com os meus olhos e comi as espigas do seu campo! Se não acreditas, meu rei, eu posso mostrar-te o campo, se tiveres a bondade de me seguir pela floresta.
Como na aldeia reinava a fome, o rei decidiu seguir Koumba à descoberta do campo de milho. Se se trata de uma mentira, sentenciou o rei, vais arrepender-te: farei de ti meu escravo.
Koumba, acompanhado pelo rei e pelos seus homens a cavalo, embrenhou-se de novo pela floresta, seguindo o caminho que tinha feito no dia anterior e chegou finalmente à clareira onde tinha descoberto o campo de milho e o seu insólito cultivador. Mas de Ponta e do seu campo de milho nem rasto!
– Devo ter-me enganado no caminho – confessou Koumba. – Vamos por este outro carreiro.
Caminharam até ao cair do Sol sem encontrar o campo de milho. O rei perdeu a paciência:
– Koumba, como pudeste mentir ao teu rei e inventar uma história destas em tempo de escassez?! Pagarás por isso e, a partir de hoje, tu e a tua família sereis meus escravos!
Só então Koumba se lembrou das palavras que Ponta lhe tinha dito ao despedir-se: «A boca de um homem pode dar-lhe a vida ou causar-lhe a morte!» Mas era tarde de mais. Conta-se que Koumba e a sua família foram os primeiros escravos daquela aldeia. Por isso, ensina-se que é bom ser-se discreto porque quem fala sem pensar bem no que diz pode causar muito dano a si e aos outros.
Paolo Valente em «Além-Mar»

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