6 de maio de 2024

PÁSCOA EM MAIO





A maioria dos cristãos celebrou a Páscoa da Ressurreição do Senhor a 31 de março. A comunhão ortodoxa fê-la a 5 de maio. Calendários diferentes ditam datas diferentes.

A regra para a celebração da Páscoa é simples e foi estabelecida há 1700 anos pelo Concílio de Niceia, em 325: a ressurreição do Senhor celebra-se no domingo depois da lua cheia do equinócio da Primavera.

Contudo, este ano enquanto católicos e outros cristãos celebraram a Páscoa a 31 de março, ortodoxos fizeram-no a 5 de maio. Porquê? Enquanto católicos e protestantes celebram a Páscoa segundo a data do calendário gregoriano que se impôs como contador universal, a comunhão ortodoxa segue o vetusto calendário juliano, em vigor desde há quase meio século antes de Cristo ter nascido, que foi substituído pelo gregoriano em 1582 para acertar as contas do ano solar.

Os dois calendários têm uma diferença de 13 dias no início do mês. Por isso, a data da Páscoa varia entre 22 de março e 25 de abril segundo as contas do calendário gregoriano e 4 de abril e 8 de maio segundo a contagem do juliano.

Podemos voltar a celebrar a Páscoa numa data comum? Os dois calendários coincidem de vez em quando. Para o ano a celebração das igrejas orientais e ocidentais faz-se no domingo, 20 de abril. O Relatório de Síntese da primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que decorreu em outubro passado, evoca a coincidência.

«Providencialmente, a data da solenidade da Páscoa coincidirá para todas as denominações cristãs [no ano em que se celebra os 1700 anos do Concílio de Niceia]. A Assembleia exprimiu um vivo desejo de conseguir encontrar uma data comum para a festa da Páscoa, de modo a poder celebrar no mesmo dia a ressurreição do Senhor, nossa vida e nossa salvação», escreve nas propostas apresentadas para a unidade cristã.

O Patriarca Ortodoxo de Constantinopla também manifestou o desejo de os cristãos no Oriente e Ocidente celebrarem a Páscoa em «data unificada». 

«É um escândalo celebrar separadamente o acontecimento único da única ressurreição do único Senhor», afirmou o Patriarca Bartolomeu I na sua homilia de 31 de março, dia em que despachou delegados para saudarem as igrejas que celebraram a Páscoa do Senhor em Constantinopla.

A necessidade de uma celebração comum da Páscoa foi também manifestada pelo Papa Francisco em junho de 2015 quando afirmou aos participantes do retiro mundial para padres que «temos de chegar a um acordo» para uma data comum para a Páscoa.

 

MESMA DATA, CELEBRAÇÕES DIFERENTES 

A Etiópia celebra as suas festas cristãs segundo o calendário juliano e a Igreja Católica também o segue nos seus dois ritos: Oriental e Romano. 

A Igreja Católica foi restabelecida na Etiópia no século XIX sob dois ritos: o Oriental no Norte (onde a população é predominantemente de origem semita e segue a Igreja Ortodoxa Etíope) e o Romano no Sul (entre as etnias cuchitas mais protestantes e católicas) por dois grandes bispos missionários italianos: Santo Justino de Iacobis e o Cardeal Guilherme Massaia, respetivamente.

As duas tradições católicas usam práticas litúrgicas diferentes. Os Católicos do Rito Oriental começam a Quaresma duas semanas antes dos do Rito Romano, seguindo a tradição ortodoxa de uma quaresma de 55 dias, celebrada em moldes próprios com jejum diário depois do jantar e até ao meio-dia ou às 15h00 do dia seguinte. Durante os 55 dias de quaresma seguem uma dieta tipicamente vegana, abstendo-se de qualquer produto de origem animal: carne, leite, ovos... Os talhos ortodoxos encerram durante a quaresma, mas os muçulmanos e outros permanecem abertos.

Os católicos de Rito Latino fazem jejum na Quarta-Feira de Cinzas e na Sexta-Feira Santa e abstêm-se de carne durante as sextas-feiras. Durante as celebrações da Quaresma as palmas, teclados e tambores litúrgicos são guardados na sala de arrumos até à Páscoa bem como flores e adornos.

A celebração da Páscoa do Senhor é também diferente. A liturgia oriental é celebrada dentro de portas e não contempla o rito do lume novo nem a renovação das promessas batismais, que é feita na celebração do Timket, o Batismo/Epifania do Senhor, a 19 de janeiro. 

A vigília pascal começa às 19h00 e decorre pela noite dentro. 

As mulheres vestem predominantemente de branco (roupa nova ou lavada). Os homens cobrem-se com um manto branco. 

Durante a celebração, a assembleia escuta onze leituras bíblicas (dez passagens das Escrituras Hebraicas e uma do Evangelho de João) mais dois textos dos Padres antigos. À meia noite, é proclamado um canto tradicional que anuncia que o Senhor ressuscitou. A liturgia dura até perto da aurora, feita de muitos cânticos, orações, procissões à volta do altar, incenso e velas.

Depois da igreja, a Páscoa faz-se em casa com o quebrar do jejum da carne. Cada família, de acordo com o orçamento familiar, cozinha um cordeiro, um cabrito ou um frango. Bebidas alcoólicas tradicionais também fazem parte do menu pascal: tela (cerveja caseira) ou tej (uma bebida fermentada de mel com água).

Os ritos pascais romanos são iguais em todo o lado, vertidos para as línguas locais. A celebração começa depois do pôr do sol com a bênção do lume novo, fora do templo, e continua com a celebração da Palavra (que pode ter até sete leituras das Escrituras Judaicas e duas das Cristãs, incluindo a proclamação do Evangelho da Ressurreição. Entre cada leitura é costume cantar-se um hino ou salmo). 

Segue-se a liturgia batismal em que, por um lado, os fiéis renovam as promessas feitas no dia do batismo, e, por outro, os catecúmenos, as pessoas que durante um ano ou mais se prepararam para serem admitidas na Igreja Católica, são batizadas. A mãe de todas as vigílias conclui com a liturgia eucarística. Tudo junto, leva entre três a quatro horas. Não há pressa!

A Páscoa é também altura para as pessoas, no Sul, renovarem o guarda-roupas, mas vestindo-se de cores diversas. Também comem uma refeição melhorada que normalmente mete um prato de galinha cozida com alguns ovos numa calda espessa, bem condimentada e picante, acompanhada com injera, pão tradicional etíope feito com tef, um cereal miúdo autóctone, ao jeito de uma panqueca gigante. Os familiares visitam-se para se cumprimentarem e provam do almoço pascal.

1 de maio de 2024

MÃE PEREGRINA



 

A pastoral urbana oferece possibilidades distintas da pastoral rural. No campo, porque as famílias vivem dispersas e não há eletricidade, as atividades são diurnas e estão centradas na igreja paroquial e nas capelas. Na cidade, as celebrações fazem-se na igreja e nas casas dos fiéis.

Há dois anos, consagrámos todas as famílias católicas da cidade de Adola, uma a uma, ao Sagrado Coração de Jesus. As Missionárias da Caridade – as Irmãs de Santa Teresa de Calcutá – encaixilharam imagens do Coração de Jesus e do Coração de Maria e os padres traduzimos as orações da consagração para a língua guji. 

Cada semana visitávamos uma família, rezávamos o terço, fazíamos juntos a oração de consagração, entregávamos a oração para a continuarem a rezar, colocávamos as imagens dos Sagrados Corações na parede da sala e benzíamos a casa e os arrumos.

A celebração, em que participavam católicos vizinhos, terminava com uma pequena refeição. As famílias mais pobres preparavam café ou chá com um pedaço de pão.

A consagração das famílias ao Coração do Bom Pastor foi uma iniciativa pastoral bem sucedida. As famílias ficavam felizes por acolherem a celebração, receberem a visita das missionárias e missionários e dos vizinhos, serem consagradas a Jesus e abençoadas.

Para dar continuidade à prática da oração comunitária nos lares católicos, decidimos introduzir a reza do terço nas suas casas em vez de o fazermos sempre no bairrinho para a gente necessitada que as irmãs construíram em Adola. 

Na segunda-feira à tarde, depois das 17h00, encontramo-nos na casa da família marcada com a imagem da Senhora de Fátima dentro de um pequeno oratório de madeira, oferta de uma organização católica austríaca às Irmãs.

Depois de distribuir alguns terços de plástico, acender uma vela e dar as boas-vindas uns aos outros, iniciamos a oração do terço em língua guji. Petrós, o catequista que trabalha com as Missionárias da Caridade, preside à reza do terço. A cadência lenta e cantada da oração convida à meditação.

Cada mistério é intercalado com um cântico em guji ou amárico. 

Depois do terço, é a vez de escutar o Evangelho do dia em guji e amárico. Alguns dos presentes partilham o que a Palavra do Senhor lhes inspira. 

O padre no fim da celebração abençoa a assembleia doméstica.

Segue-se um pequeno momento de convívio à volta de uma chávena de café ou chá servida com cevada torrada ou outra comida ligeira.

A imagem da Senhora de Fátima permanece no seu oratório com a família que a acolheu até à segunda-feira seguinte, altura em que visita um novo lar. É presença maternal que une a família em oração à sua volta.

A Mãe passa de casa em casa dos seus filhos em Adola. Quando a visita chega ao fim, começa um novo ciclo. 

O Papa Francisco repetiu durante a visita a Fátima por ocasião da celebração centenária, a 13 de maio de 2017, que «Temos Mãe!» Mãe peregrina, de casa em casa, de coração em coração. Mãe dos católicos de Adola. Mãe de todas e de todos. Bendita.