Amum, Machar, Kiir
O Presidente da República do Sudão do Sul surpreendeu o país
na segunda à noite ao decretar a redução de poderes do Vice-Presidente num
braço-de-ferro político inesperado.
Salva Kiir Mayardit assinou dois decretos republicanos,
lidos na TV estatal: o primeiro retirava os poderes administrativos que tinha delegado
em Riek Machar Teny. O segundo parava os preparativos para a Jornada de Cura
para a Reconciliação Nacional, um projecto liderado pelo Dr Machar e pela
mulher que custava mais de oito milhões de dólares e que estava previsto
começar em Junho.
Segundo a Constituição Transicional, o Vice-Presidente
assume o poder do presidente quando este está fora do país, e participa nos
conselhos de ministros e de segurança. Kiir tinha-lhe dado alguns poderes de
representação incluindo o discurso na Assembleia Geral da ONU em Novembro
passado.
Era evidente que o Vice-presidente estava a usar o exercício
de reconciliação nacional como trampolim política para se candidatar à
liderança do SPLM, o partido no poder no Sudão do Sul, na próxima Convenção
Nacional – que se devia realizar em Maio – e por arrastamento ser o candidato
do SPLM à Presidência da República em 2015.
Kiir tinha dado indicações que não se recandidatava num discurso
à Assembleia Nacional Legislativa e na última reunião do Bureau Político do
SPLM tanto Machar como o secretário-geral Pagan Amum e o Presidente da Assembleia
James Wani Igga deixaram claro quer iam disputar a liderança do partido. A
bomba estoirou quando Kiir disse que pretendia continuar na presidência por
mais um mandato.
A demoção de Machar provocou uma onda de choque por todo o
país. Em Wau, a cidade quase parou. O debate na internet tornou-se viral: Kiir
é dinka, Machar é nuer –as duas comunidades mais numerosas no Sudão do Sul que
mesmo sendo «primas» não se dão bem. Machar também tem um passado político sujo
porque por um tempo se aliou ao Governo de Cartum para lutar contra o SPLA de John
Garang, massacrando milhares de dinkas em Bor. No ano passado ele pediu perdão
pelo massacre.
O braço-de-ferro entre o presidente e o vice-presidente vem trazer
alguma confusão política e é possível que Machar abandone o SPLM e funde o próprio
partido com base étnica nuer. Há quem diga que chegou a hora de desafiar o
partido que se instalou no poder e não tem grande obra para mostrar apesar de
controlar o Governo de Juba desde 2005.
Kiir foi um líder à altura durante o período interino que
levou ao referendo e à independência, mas tem-se mostrado impotente e distante nos
18 meses de independência. Os ministros que escolheu não estão à altura das
obrigações apesar da dança de cadeiras musicais que vão executando. O país está
paralisado e os cidadãos suspeitam que os ministros sejam um bando de corruptos
que acham que têm direito a serem compensados pelo 21 ano de sacrifícios no
mato!