29 de fevereiro de 2012

TOMBE


No domingo fui celebrar à minha comunidade preferida: a capela de São Marcos. Fica junto ao rio a meia dúzia de quilómetros do centro de Juba por uma picada coberta de pés de manga.
A maioria das pessoas da comunidade pertencem à etnia Bari, o grupo maioritário de Juba. Como não falam inglês, comprei o missal Bari e leio partes da missa nessa língua. 
A homilia é em inglês – claro está – e traduzida por um jovem sorridente para a sua língua.
A comunidade é formada na maioria por jovens – sobretudo bonitas moças – e crianças.
Cantam muito bem.
No domingo,  no final da missão, um sultão (chefe tradicional) pediu a palavra. Elogiou o modo como leio o missal Bari – sem gaguejar (deve ser surdo, coitado) – e disse que eu merecia um nome novo:  Tombe, Primogénito! Abuna Joseph Tombe! Sem mais.
Vamos a ver se este padrinho de última hora me vai dar as amêndoas na Páscoa. 
Mas gostei do nome que partilho com o meu amigo Emmanuel Tombe, um dos apresentadores da Rádio Bakhita.

1 de fevereiro de 2012

PULMÃO DA HUMANIDADE

©SAmado

Bento XVI pinta o continente africano, na Exortação Africae Munus (O Serviço da África), com pinceladas rápidas mas expressivos: exalta a coragem e dignidade dos africanos; a sua alegria e capacidade de celebrar a vida; o seu júbilo de viver, radicado numa visão holística que engloba as pessoas, os seus antepassados, as crianças por nascer, todos os seres e toda a criação. O Papa escreve que a África deseja ter confiança em si própria e na sua dignidade, mas sublinha que representa um imenso “pulmão” espiritual para toda uma humanidade que atravessa actualmente uma crise de fé e de esperança.
É evidente que o Papa também aponta o dedo aos males da África. Mas, no essencial, o quadro que traça contrasta profundamente com a África miserabilista e esquelética que alguns meios de comunicação teimam em fazer passar. É caso para dizer: faz mais barulho uma árvore a cair que uma floresta inteira a crescer. Aliás, a visão optimista de Bento XVI é confirmada pela actual realidade económica do continente.
Em Dezembro passado, o jornal britânico The Economist publicou um interessante artigo, intitulado “Um continente com esperança: África cresce”. O articulista frisa que, na última década, seis dos dez países que encabeçam a lista do crescimento económico são africanos, e realça que o continente cresceu de forma mais rápido que a Ásia Oriental, incluindo o Japão. As razões são várias: os recursos naturais geram mais riqueza, a população continua a crescer, a indústria e os serviços desenvolvem-se, e a classe média com maior poder de compra também aumenta.
O despertar do leão africano é também produto do investimento da China, Brasil e Índia – as potências emergentes, protagonistas do que actualmente se chama cooperação Sul-Sul –, e de outros países que também estão a investir na industrialização do continente. Registaram-se entretanto grandes progressos no sector das tecnologias da comunicação: os africanos têm mais de 600 milhões de telemóveis, e usam-nos não só para conversar mas também para fazer transacções comerciais, o que abre perspectivas para novos negócios; por outro lado, mais de dez por cento deste imenso continente está coberto pela internet. Verificaram-se também grandes avanços no campo da saúde, especialmente na luta contra a malária; e graças a soluções simples e baratas, que passam pela distribuição de redes mosquiteiras tratadas com insecticida.
O artigo conclui que o renascimento africano se deve também a alguns progressos em termos da redução dos conflitos, a uma melhor governação e à democratização do ensino. É claro que, nestes aspectos, o cenário continua a não ser o ideal. É impossível ignorar que alguns dos maiores estigmas da África permanecem: a corrupção, a desertificação, a pobreza, a violência. Mas a mensagem de esperança mantém-se, mesmo assim: o continente africano não é só um dos pulmões da Igreja mas também da economia, num período em que o mundo se encontra mergulhado numa profunda crise.
Para continuar a progredir, a África precisa sobretudo de paz e de que a deixem tomar as rédeas do seu destino, ou seja, de assumir o controlo do seu desenvolvimento. Para tal, é preciso que as potências estrangeiras deixem de fomentar conflitos e de vender armas ao desbarato às várias facções em confronto. O que, no fundo, a torna num palco de lutas por procuração pelo controlo e exploração dos seus vastos recursos.

ROSAS DO DESERTO