22 de dezembro de 2018

MISSÃO É RELAÇÃO



Os bispos portugueses, seguindo uma deixa do Papa Francisco, puseram em primeiro lugar na vivência do Ano Missionário a relação pessoal com Jesus, que é a fonte de todas as relações que tecem e ligam o nosso ser missionários combonianos, hoje.

Escrevem na nota pastoral Todos, tudo e sempre em missão que o «encontro pessoal com Jesus Cristo vivo na sua Igreja: Eucaristia, Palavra de Deus, oração pessoal e comunitária» é a primeira das quatro dimensões para prepararmos e vivermos o Ano Missionário.

Daí surgiu o compromisso provincial de «favorecer nas nossas comunidades e nos grupos o encontro com Jesus (Lectio Divina, partilha da Palavra)» como foi expresso na primeira proposta operativa para a animação missionária este ano.

O encontro pessoal, a relação com Jesus, com os outros e com todas as criaturas é uma dimensão fundamental do nosso ser missionário.

A Intercapitular sublinhou que vivemos um deficit de humanidade e que a formação permanente nos deve humanizar. Notou também que a tensão entre o ser e o fazer é mãe de muitas das nossas doenças e sofrimentos que nos amarram.

Não fazemos missão, estamos em estado permanente de missão. Melhor, «eu sou uma missão nesta terra, e para isso estou neste mundo» como o Papa Francisco escreveu na Evangelii gaudium (nº 273).

Na exortação Gaudete et exsultate o papa argentino vai mais além. Nota que somos uma missão de santidade, chamados a encarnar uma palavra, uma mensagem de Jesus com e na nossa vida:
  • «Para um cristão, não é possível imaginar a própria missão na terra, sem a conceber como um caminho de santidade» (nº 19); 
  • «Pode também envolver a reprodução na própria existência de diferentes aspetos da vida terrena de Jesus» (nº 20); 
  • «Também tu precisas de conceber a totalidade da tua vida como uma missão. […] E permite-Lhe plasmar em ti aquele mistério pessoal que possa refletir Jesus Cristo no mundo de hoje» (nº 23); 
  • «Oxalá consigas identificar a palavra, a mensagem de Jesus que Deus quer dizer ao mundo com a tua vida» (nº 24). 
Os bispos portugueses sublinham que mais que geográfica a missão é, acima de tudo, cordial: «do encontro com a Pessoa de Jesus Cristo nasce a Missão que não se baseia em ideias nem em territórios, mas “parte do coração” e dirige-se ao coração, uma vez que são “os corações os verdadeiros destinatários da atividade missionária do Povo de Deus”.»

Viver a missão pelo lado do fazer tem a ver com a eterna tentação de escrever o quotidiano através de uma folha de cálculo, uma página Excel. Se pegamos na missão pelo lado do fazer, temos que dizer: «somos servos não necessários: fizemos o que devíamos fazer» (Lucas 17, 10).

Contudo, somos relação com o Deus-Trindade – donde viemos – para tecermos relações interpessoais e comunitárias, cordiais de vida e de missão: a missão nasce no coração amoroso da Trindade para chegar aos corações do mundo através do coração de cada um de nós.

Daí a necessidade de rever o silogismo cartesiano do «penso, logo existo» para o «relaciono-me, logo existo».

Que encarne e nasça em ti a Palavra, a mensagem de Jesus que Deus quer que digas ao mundo. Assim serás Natal todos os dias, assim 2019 será verdadeiramente Ano Missionário.

20 de dezembro de 2018

ESPERO UM MENINO!


Anuncio-vos uma feliz surpresa: ESPERO UM MENINO!

Nós, irmãos e sacerdotes combonianos, não temos crianças. Porém conhecemos e amamos tantas, no nosso fascinante e longo peregrinar missionário em terras de África, de América, de Ásia e Europa. 

Além disso, experimentamos com frequência a alegria de ver as crianças dos nossos amigos e familiares, os netos e sobrinhos; a alegria de ver grupos de crianças que, de vez em quando, vêm fazer-nos uma visita e cantar para nós, em particulares ocasiões de festa; a alegria de ver, de vez em quando, a Sofia, a menina da Clara, a nossa animadora cultural, com os seus belos olhos, negros e profundos; ou de encontrar a Verónica, uma doce e gentil menina que acompanha, cada sábado, a sua avó na organização da tômbola...

Todas estas crianças, porém, são filhos «dos outros!»

Agora, porém, venho anunciar-vos algo incrível: estou à espera de um menino mesmo meu! Sim, entendestes bem! Bem, não só meu. Porque a mãe conhecemo-la bem, mas o pai é só «putativo». Dado que todos reclamam a sua paternidade, decidimos, em espírito de fraternidade, adotá-lo todos juntos.

Estais surpreendidos? Também nós ficámos surpreendidos, dada a média avançada da nossa idade. Também nós pensámos, como Abraão: «a um com cem anos de idade, pode nascer um filho?» (Gênesis, 17,17). Também nós, como ele, nos teríamos contentado com o nosso Ismael, o filho «outro», mas Deus quis surpreender-nos, quando os nossos sonhos se tinham desfeito há muito. Que vos devemos dizer? O nosso coração, de repente, recomeçou a bater forte, aqueceu-se e encheu-se de alegria, «porque um menino nos nasceu, um FILHO nos foi dado» (Isaías 6,5). 

E também nós voltámos a sonhar, como profetizou Joel!

Agora andamos todos atarefados a preparar o Acontecimento. 

Sim, o nascimento de uma criança tem que se preparar com cuidado. Facilmente podeis compreender que para nós idosos esta preparação não resulta tarefa fácil. Por isto vos pedimos que nos deis uma mão. 

Pensando no velho Simeão que vai ao Templo para acolher nos seus braços o Menino e louvar a Deus porque os seus olhos vêem finalmente a Luz (Lucas 2, 25-32), perguntamo-nos: como faremos nós? É por isso que precisamos de vós, que a tarefa de pais e mães a sabeis desempenhar bem.

Dado que voltámos a sonhar, com a confiança das crianças, também nós desejamos colocar a nossa carta na árvore para pedir ao Menino o dom da PAZ. 

Como poderemos nós repetir com Simeão: «Agora, Senhor deixa que o teu servo vá em paz...» se vemos, à nossa volta, tanta injustiça, violência e pobreza?!... 

Mas, apesar de tudo isso, continuamos a alimentar o SONHO que este Menino nos trouxe. Ajudai-nos, vós também, a sonhar!

Bom Natal!
P. Manuel João 
p.mjoao@gmail.com

18 de dezembro de 2018

MÃE SANTA


A FADISTA MARIZA teve um filho prematuro às 18 semanas de gestação. Chama-se Martim e, durante o primeiro ano de vida, teve que lutar muito para sobreviver. Passou muito tempo na incubadora, esteve ligado às máquinas para respirar e crescer.

«Ele faz um ano e no dia a seguir pego na minha mãe e vou para Fátima com ele ao colo e digo: “Minha Nossa Senhora, eu sou mãe, tu és mãe. Ele é teu como meu. Cuida dele que eu vou cuidar o que conseguir.” E o Martim é da Nossa Senhora, não é meu. Está aí» – a cantora contou numa entrevista.

Emocionou-me profundamente este testemunho, este diálogo entre mulheres-mães, o génio feminino, esta consagração do Martim a Nossa Senhora. Uma mãe que confia o filho à outra: «Cuida dele!»

O Papa Francisco recordou-nos três vezes na missa da canonização dos Pastorinhos, a 13 de maio de 2017, que temos Mãe! E desafiou-nos: «Agarrados a Ela como filhos, vivamos da esperança que assenta em Jesus.»

A Imaculada Conceição é a nossa mãe, porque Jesus no-la deu no Calvário num ato de amor radical: normalmente a mãe é única e partilhada só com os irmãos de sangue. Ao dar-nos como filhos à Mulher e ao amado como Mãe, Jesus faz-nos irmãos de sangue no sangue derramado na Cruz.

«Junto à cruz de Jesus estavam, de pé, sua mãe e a irmã da sua mãe, Maria, a mulher de Clopas, e Maria Madalena. Então, Jesus, ao ver ali ao pé a sua mãe e o discípulo que Ele amava, disse à mãe: “Mulher, eis o teu filho!” Depois, disse ao discípulo: “Eis a tua mãe!” E, desde aquela hora, o discípulo acolheu-a como sua» – conta João no seu Evangelho.

A Santa Maria, a mulher forte que permanece de pé junto à cruz do Filho, é uma Mãe que cuida de nós, seus filhos; uma Mãe que nos ensina o caminho da Vida, o caminho da santidade, o caminho de todos e cada um de nós.

O Papa Francisco publicou há quase um ano uma Exortação Apostólica. Chamou-lhe Alegrai-vos e exultai. É um roteiro para viver o chamamento à santidade no mundo actual, a santidade «ao pé da porta».

O penúltimo parágrafo, nº 176, coroa as reflexões do papa argentino sobre a santidade. Apresenta Maria como modelo – não das passarelas luzidias da moda, mas dos caminhos trabalhosos da vida – «porque ela viveu como ninguém as Bem-aventuranças de Jesus»:
  •  Estremecia de júbilo na presença de Deus; 
  • Conservava tudo no seu coração; 
  • Deixou-se trespassar por uma espada de dor. 
O Papa define Maria de Nazaré como «a mais abençoada dos santos entre os santos, aquela que nos mostra o caminho da santidade e nos acompanha!»

Maria, a Virgem Imaculada concebida sem pecado, caminha connosco os caminhos da santidade: não estamos sós neste peregrinar de Deus e para Deus. Fazemo-lo juntos, como povo de Deus, fazemo-lo com ela que nos precede como Mãe e Mestra.

Francisco escreve que «ninguém se salva sozinho, como indivíduo isolado, mas Deus atrai-nos tendo em conta a complexa rede de relações interpessoais» (nº 6).

O caminho da santidade nem sempre é chão raso! «Estreita é a porta e difícil o caminho que conduzem à vida», disse Jesus.

O caminho da santidade tem altos e baixos, dificuldades, tentações, buracos… De vez em quando caímos. Somos fracos, somos frágeis. Mas a Mãe está connosco: «quando caímos, não aceita deixar-nos por terra e, às vezes, leva-nos nos braços sem nos julgar», escreve o Papa.

Como Mariza rezou em Fátima: Santa Maria é Mãe e cuida de nós; levanta-nos e leva-nos ao colo, dá-nos colo.

O Papa Francisco termina assim o breve parágrafo de 115 densas palavras: «Conversar com Ela consola-nos, liberta-nos, santifica-nos. A Mãe não necessita de muitas palavras, não precisa que nos esforcemos demasiado para Lhe explicar o que se passa connosco. É suficiente sussurrar uma vez e outra: “Ave-maria...”.»

Eis uma trindade de verbos essenciais para a nossa espiritualidade mariana: Maria consola-nos, liberta-nos, santifica-nos!

É tudo isto que apresentamos à Mãe para que ela ao escutar a nossa prece, o nosso agradecimento nos console, nos liberte e nos santifique.

A Mãe Santa ensina-nos a escutar o que Deus quer de nós através de tantos anjos que nos envia, com rostos e corações conhecidos.

Ensina-nos a admitir os nossos sentimentos perturbados, a assumir os nossos medos e angústias, a dar voz às nossas dúvidas, a reconhecer os nossos limites, o vaso de barro onde trazemos o tesouro que somos.

O mistério da anunciação de Nazaré – a evangelização de Maria, como lhe chamam os nossos irmãos ortodoxos – repete-se na história de cada um de nós.

O Papa Francisco recorda que cada um de nós é uma missão em Cristo, um caminho de santidade. Deus quer dizer hoje uma palavra concreta, uma mensagem através de cada um.

«Permite-lhe plasmar em ti aquele mistério pessoal que possa reflectir Jesus Cristo no mundo de hoje», escreve o Papa no nº 23 da exortação Alegrai-vos e exultai.

Maria ensina-nos a dizer, no fim: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra.»

Habitam-nos tantas palavras… Mas é a Palavra de Deus que quer fazer-se em nós, ser Natal em nós para celebrarmos bem o Ano Missionário, «uma ocasião de graça, intensa e fecunda, de modo que desperte o entusiasmo missionário», como desejam os nossos bispos.

Acolher Maria como nosso Mãe santa – como em nosso nome fez o discípulo amado junto à Cruz – é dizer sim como e com ela ao projeto de Deus de um mundo redimido através da encarnação, morte e ressurreição do seu Filho, triunfo da bondade de Deus sobre toda a maldade do Mafarrico.

Parece ser uma missão impossível, mas não precisamos de muitas palavras para pedir a ajuda de Santa Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe. Basta sussurrar uma e outra vez com o Anjo, com todas as filhas e filhos: «Ave-maria…»

16 de dezembro de 2018

NATAL NO CONGO


Com os meus votos de um Santo e Feliz Natal, quero antes de mais agradecer-vos a vossa proximidade através da oração. Eu continuo a trabalhar no Postulantado (Seminário) em Kisangani, República Democrática do Congo, onde colaboro na formação de jovens que se preparam para serem missionários Combonianos. Somos três formadores, eu mais dois padres congoleses. Os jovens em formação são 40. Durante o tempo do Postulantado recebem uma formação humana e cristã para ajudá-los a discernir a sua vocação e fazem três anos de filosofia. 

Neste momento é difícil descrever a situação do Congo. O Doutor Denis Mokwenge, genicologista-obstetra congolês, no seu discurso no dia 10 de dezembro, no momento em que lhe foi entregue o Prémio Nobel da Paz 2018 em Oslo, apresenta-nos a situação dramática do Congo nestes últimos anos: crianças, jovens, mulheres violadas, massacres,etc.

Diante do horrível e indescritível drama a sua atitude é antes de mais de silêncio e oração: «Meu Deus, diz-nos que aquilo que estamos a assistir não é verdade, diz-nos que é um pesadelo, diz-nos que quando despertarmos tudo está bem. Mas infelizmente não é um pesadelo, um mau sonho. É uma realidade. É a nova realidade do Congo...e tudo isto se passa sem que os autores deste crimes sejam julgados...».

Neste momento o Congo está a preparar-se para as eleições que serão no dia 23 de dezembro. Não sabemos o que vai acontecer no momento das eleições e depois das eleições.

Nestas circunstâncias não sabemos se iremos celebrar o Natal nas nossas igrejas. Confiamos no Senhor, pois é Ele o mestre da História.

Envio-lhe uma fotografia dos nossos postulantes juntamente com os superiores das nossas comunidade do Congo.

Que o Senhor a proteja e recompense de tudo quanto faz pela Missão.
P. José Arieira

15 de dezembro de 2018

VI ASSEMBLEIA INTERNACIONAL LMC




Está a decorrer de 11 a 17 de Dezembro, na Casa Generalícia dos Missionários Combonianos, em Roma, a VI Assembleia Internacional dos Leigos Missionários Combonianos (LMC), evento que se realiza cada seis anos.

No total, são 51 participantes. Além dos representantes dos LMC e dos combonianos que os acompanham nos seus respectivos países, vindos de 20 países de África, Europa e América, participam também a irmã Ida Colombo, do conselho geral das Missionárias Combonianas e a Maria Pia Dal Zovo, do conselho central das Seculares Missionárias Combonianas.

A Assembleia iniciou-se com as palavras de boas-vindas proferidas pelo Alberto de la Portilla, coordenador do Comité Central dos LMC, e pelo P. Pietro Ciuciulla, em nome do Conselho Geral comboniano.

A manhã do primeiro dia, 11 de Dezembro, foi dedicada à oração, à reflexão e à partilha, guiados pelos Gonzalo Violero García e Maria Carmen Polanco Delgado, LMC da Espanha. Da parte da tarde, os participantes estiveram reunidos por continentes.

Ontem, dia 12, no qual se recorda a Nossa Senhora de Guadalupe, cada continente apresentou o relatório das actividades realizadas durante os últimos seis anos e apresentaram os seus principais desafios em relação ao futuro. Na mesma linha, seguiu- se a apresentação do relatório do Comité Central e o relatório económico de 2012 a 2018.

De tarde, deu-se início à reflexão do primeiro tema da Assembleia, que está relacionado com a organização dos LMC (composição, estrutura, comunidades internacionais e economia).

Os LMC irão debater, entre si, outros três grandes temas: formação e espiritualidade, a missão dos leigos e os documentos fundamentais dos LMC.

Dar-se-á ainda tempo para falar de um modo especial sobre as comunidades internacionais, para partilhar as experiências da vida dos LMC, nos diversos contextos continentais, e informar sobre a actual relação dos LMC com a Família Comboniana.

Nos momentos de oração e na Eucaristia, estão também presentes todas e todos os LMC e, em especial, os que se encontram a trabalhar em contextos difíceis como, por exemplo, na República Centro-Africana.

Que a luz do Espírito Santo seja o farol que ilumine os participantes nesta Assembleia e os LMC em geral, para que sejam capazes de dar continuidade à obra e ao carisma iniciados por São Daniel Comboni!
P. Arlindo Pinto

QUE POSSO FAZER?



Na festa da Ascensão de Jesus ao Céu, em Maio de 1959, como acontece todos os anos litúrgicos B, lê-se o Evangelho de São Marcos 16,15-20: «Jesus disse-lhes: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado».

Naquele dia, estas palavras tocaram-me profundamente.

Nesse tempo havia no mundo uns dois mil e quinhentos milhões de pessoas não batizadas. Pensei de mim para comigo: «Que posso eu fazer para anunciar o Evangelho a essa multidão e para que essas pessoas creiam e sejam batizadas?»

Consciente ou inconscientemente, senti uma força interior que me empurrava a dizer: «Quero ser missionário». Dito e feito. Nesse mesmo ano, no dia 8 de setembro, festa da natividade de Nossa Senhora, dei entrada ao seminário comboniano de Viseu.

Doze anos mais tarde, na Quinta-feira Santa, dia 8 de abril de 1971 fui ordenado padre.

Passaram-se cinco anos e em abril de 1976 cheguei ao Congo, para anunciar o Evangelho a um povo que na maioria era ainda pagão. Hoje, graças a Deus, muita dessa gente, que então encontrei no Congo, é cristã.

Mas, o problema põe-se outra vez. Se em 1959 havia no mundo uns dois mil e quinhentos milhões de pessoas não batizadas, hoje esse número triplicou. Portanto, se então tinha sentido uma vocação missionária, hoje ainda tem mais sentido.

Por isso continuo a sentir-me feliz e a dar graças a Deus por me ter chamado para esta vida. Ao mesmo tempo, peço-Lhe que continue a chamar muitos jovens e a enviá-los a anunciar a Palavra de Deus aos povos que ainda não a conhecem. Deste modo, muitas outras pessoas podem ser batizadas e alcançaram a salvação eterna.

Que esse Natal seja um tempo especial para que Jesus renasça no coração e na vida duma multidão de pessoas que se deixem tocar pela presença de Deus e abram as portas a Cristo.

Vosso irmão e amigo 
P. Alfredo Neres
RD Congo

13 de dezembro de 2018

Celebrar o Natal ENTRE ACOLHIMENTO E CONTEMPLAÇÃO


Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador... encontrareis um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura (Lucas 2, 11-12).


Caros confrades,

Estamos a aproximar-nos da celebração do grande mistério da Encarnação, surpreendidos e deslumbrados pela luz que vem do presépio. Um mistério que temos que ter sempre presente na nossa vida missionária como fonte de inspiração no processo de inserção em novos contextos e desafios missionários. Começando com Jesus, Missionário do Pai, os missionários sempre tiveram que passar por um processo de encarnação que implica fazer-se pequeno e despir-se de tudo o que possa ser impedimento para acolher novas realidades (Filipenses 2, 6).

Lemos num antigo diário da missão de Omdurman: «Cheguei ontem a Omdurman. Nesta manhã de domingo, muito cedo, acordo com o cântico do muezim a convidar à oração. Mais tarde, tocam os sinos da igreja copta para convidar os fiéis para a celebração do domingo. Levanto-me porque devo acompanhar um missionário veterano do Sudão para celebrar a missa numa capela distante deste centro. Assim começa uma nova etapa da minha vida, no Sudão, onde o Senhor me enviou. Ele guiará os meus passos no meio deste povo, a quem Deus ama e que também se tornará o meu povo.»

Este novo começo da «missão africana» de um jovem missionário remete-nos para todos os nossos confrades que, espalhados em muitas partes do mundo, testemunham o amor de Deus pela humanidade. O encontro dos membros do CG com cada um de vocês, nas visitas às províncias e nos diálogos pessoais, faz-nos tocar com as mãos como Deus continua a sua encarnação hoje entre os povos. A encarnação do Verbo, de facto, não é um evento isolado, circunscrito a um certo tempo e espaço da história. É um processo em contínuo desenvolvimento. A partir do momento em que o Verbo se fez carne, a partir do dia em que os anjos anunciaram esta alegre notícia, Deus continua a encarnar-se «hoje», como no princípio, de um modo surpreendente e único. A nós, que participamos deste evento, é pedida a mesma atitude dos pastores: a capacidade de nos surpreendermos e de nos maravilharmos, deixando que o Mistério nos envolva de Luz e a Palavra construa a sua casa em nós e no mundo.

«Hoje» é cada momento em que Deus se faz presente, o kairos que nos é oferecido e que devemos acolher com alegria, o dia em que «com efeito, se manifestou a graça de Deus» (Tito 2:11). «Hoje» é o tempo do recenseamento na época de César Augusto e também o tempo em que o povo de Israel esperava a realização das promessas de Deus. É o dia em que se constroem muros que nos dividem, mas também é o dia em que que tantas portas se abrem para a vida e para a esperança.

Ao tempo junta-se o espaço, o lugar onde Deus nos surpreende e que sempre será um lugar significativo para nós. Omdurman é como o ícone dos lugares de missão, lugares geográficos, antropológicos e culturais que Deus escolheu para nós. Lugares que serão sempre uma nova Belém, «casa do pão», onde Deus nos desconcerta e nos convida ao assombro. Belém é o lugar da graça, aquele em que nos encontramos e no qual somos convidados a receber o pão que nos é oferecido para partilhá-lo com todos. Não é por acaso que o lugar da encarnação de Deus se chama Belém.

Falar de tempo e de lugar significa falar de povos, culturas, situações concretas, onde cada um de nós se encontra a viver momentos de alegria e de tristeza, de esperança e de desilusão, de paz e de guerra. Estas situações são o dom de Deus que somos chamados a acolher com alegria e esperança, porque é aí que a Palavra se faz carne, que Deus se faz criança, que o primeiro se faz último. Ali todo o nosso ser se perturba e é chamado ao silêncio, respeito e contemplação: «Entrei, e embora o nascimento seja mais alegre que a morte, fiquei mais comovido que no Calvário ao pensar na complacência de um Deus que se humilhou até ao ponto de nascer num estábulo» (Escritos 111).

Com São Daniel Comboni somos convidados a contemplar o Menino, a comover-nos por este mistério e a maravilhar-nos com a ação de Deus no coração da humanidade.

No final deste ano de 2018, o CG agradece convosco ao Senhor pelos eventos vividos em conjunto este ano, como o percurso de Revisitação e Revisão da RV e a Assembleia Intercapitular. Ao mesmo tempo, deseja a todos um Santo Natal e um Ano Novo de 2019 cheio da presença do Menino de Belém que continuará a surpreender-nos nos caminhos da missão.
O Conselho Geral 
Natal de 2018

10 de dezembro de 2018

CELEBRAÇÃO E NOVOS DESAFIOS

No dia 10 de dezembro de 2018 celebramos os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Essa é também uma boa ocasião para recordarmos os 30 anos da Constituição Federal, a mais democrática que o Brasil já escreveu, promulgada no dia 5 de outubro de 1988 e conhecida como «Constituição Cidadã». 

Esses documentos em favor da vida, da dignidade e liberdade, assim como de outros direitos fundamentais de todas as pessoas, foram construídos à custa de muitas lutas, vidas tiradas, famílias dilaceradas e sonhos interrompidos. Graças a esses documentos e à organização dos movimentos sociais frente aos compromissos assumidos pelo Estado brasileiro, a dignidade de milhões de pessoas foi elevada, direitos e deveres foram promovidos, sofrimentos impedidos e os fundamentos de uma sociedade mais democrática, justa e igualitária foram construídos.

Temos muitas conquistas a celebrar e muitos desafios a serem enfrentados. Além das práticas comuns de abuso e violações de direitos, vemos ressurgir na sociedade brasileira um cenário, discursos e práticas que não só ameaçam, mas esvaziam os conteúdos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal, pela retirada sistemática e a supressão de direitos, a exaltação do ódio e da violência e a exclusão das minorias. Isto se observa claramente nos pensamentos e ações de indivíduos e grupos, inclusive religiosos, que chegaram ao poder político e econômico do País nas últimas eleições. O momento é de celebração e de resistência.

Nesse contexto, leigos/as e religiosos/as que compõem a Articulação Comboniana de Direitos Humanos (ACDH), através desse pronunciamento, se dirigem a você, à sua comunidade, grupo ou movimento para partilhar preocupações e esperanças.

A linha do tempo nos ensina que a história é feita de ciclos. Em alguns deles a defesa da vida parece mais desafiadora. No Brasil, por um curto período, a classe trabalhadora deu passos importantes para tirar do texto formal os direitos fundamentais e assegurar algumas proteções aos historicamente mais marginalizados, mesmo sem tocar na zona de conforto da elite e de seus agregados. Isso acabou provocando a elite brasileira, que mostrou o que ela tem de pior e nefasto. Nunca na história de períodos democráticos nesse País, houve tanta afronta e desprezo explícitos aos direitos humanos.

Conquistas ainda em fase de consolidação estão gravemente ameaçadas, principalmente em nome do desenvolvimento econômico. Comunidades tradicionais, como as indígenas e quilombolas, são alguns dos grupos depreciados em quase todos os pronunciamentos do Presidente recém-eleito. O Congresso brasileiro se distancia, a passos largos, de qualquer proposta que coloque as instituições públicas a serviço do bem comum. O Judiciário, guardião e promotor do direito e da justiça, em algumas de suas práticas deixa dúvidas quanto à sua imparcialidade. A maioria das lideranças religiosas serve aos interesses da elite política e econômica em troca de prestígio, conforto e fama, usurpando e deturpando os nomes de “evangélico” e “cristão” e em nome da moral e da família. Parecem desconhecer a autoridade religiosa, amorosa e ética do Papa Francisco e as inspirações e valores cristãos contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Constituição Federal.

Nesse preocupante cenário de desmonte de direitos, devastação e morte, em que a mídia tradicional presta um enorme desserviço, é preciso conectar as nossas experiências, saberes, lutas e utopias às de outras pessoas e grupos, para que, de norte a sul, do campo à favela, a resistência seja propositiva e avance na construção de estratégias em defesa da vida e dos demais direitos.

A exemplo de Jesus de Nazaré, estamos convencidos/as que é preciso nos colocar a serviço dos marginalizados e oprimidos. Não falamos somente de disposição caritativa, cuja essência carrega uma grande dose de subalternidade do/a outro/a, mas da transformação radical da realidade, pela educação e organização popular, que devolvem dignidade às pessoas perseguidas ou exploradas.

Trabalhamos na perspectiva da utopia de uma sociedade sem subserviência. Utopia! Palavra pouco apreciada no dicionário do sistema de morte perpetrado pelo capitalismo selvagem, mas viva para todas as pessoas e coletivos que seguem perseverantes na construção de uma sociedade onde a humanidade da família campesina, da operária empregada ou desempregada, do povo em situação de rua, da população encarcerada, das comunidades quilombolas e indígenas, das crianças e adolescentes abandonados à própria sorte, da juventude negra e periférica, prevaleça sobre os interesses econômicos.

A Articulação Comboniana de Direitos Humanos (ACDH), particularmente nesse período de celebrações e de organização da resistência, se soma aos movimentos sociais e aos tantos coletivos, novos e velhos, de jovens e mulheres, na luta pela defesa incondicional da vida, dos direitos conquistados e na resistência contra toda forma de opressão, ódio e violência. Dizemos SIM à vida e aos direitos e reafirmamos nosso sonho e compromisso com a cultura de paz e com uma sociedade mais justa, pacífica e igualitária.
São Paulo, 10 de Dezembro de 2018
Articulação Comboniana de Direitos Humanos

5 de dezembro de 2018

ALMOÇOS GRÁTIS?


O «amigo chinês» ajuda, mas também cobra.

As redes sociais na Zâmbia estiveram ao rubro em Setembro com um alerta da Africa confidential. A prestigiada publicação londrina dizia que os Chineses iam tomar conta do aeroporto internacional Kenneth Kaunda, em Lusaca, da companhia nacional de electricidade e da radiotelevisão estatal por o Governo não estar a servir a dívida com Pequim. Esses activos foram dados como garantia de empréstimos que ultrapassam 6,3 mil milhões de dólares numa dúzia de anos.

O Governo zambiano desmentiu prontamente a notícia, mas a publicação reafirmou que a Zâmbia corre o risco de perder símbolos importantes da soberania nacional para o controlo chinês por incumprimento. A Frente Patriótica, o partido da oposição, acusou o executivo de estar a vender o país.

A notícia da Africa confidential repõe na praça pública a questão do endividamento dos governos africanos com Pequim. O Governo chinês continua a oferecer crédito sem limites e as dívidas têm de ser pagas. Países com petróleo e outros bens fazem o pagamento em género. Quem não tem matérias-primas tem de se endividar ainda mais para não correr o risco de ver penhoradas as garantias dos empréstimos.

A China emprestou mais de 110 mil milhões de dólares americanos – qualquer coisa como 94 mil milhões de euros – a governos africanos nos últimos dezassete anos. Em Setembro, o presidente Xi Jinping anunciou no Fórum de Cooperação China-África um novo fundo de 60 mil milhões de dólares para assistência e empréstimos com juros e sem juros.

Há quem veja na ajuda chinesa sem limites e sem perguntas incómodas uma armadilha que gera uma nova forma de colonialismo. Pequim jura que não é verdade: a China nunca teve colónias na África. Mais: é com a sua cooperação que os africanos se podem libertar dos constrangimentos financeiros do passado colonial.

Contudo, a presença maciça de chineses no continente está a mudar o modo como a ajuda de Pequim é percebida pelo cidadão comum. Os chineses são vistos como competidores privilegiados na economia local, desde a produção até ao retalho, legal e ilegalmente, e misturam-se com as máfias autóctones. Junta-se ainda a questão do racismo de que se queixam os quenianos que trabalham para os chineses na ligação ferroviária entre Nairobi e Mombaça.

Na Zâmbia, noutra vez, gerou-se um grande sururu quando o jornal estatal, editado em inglês, publicou uma história em mandarim para atrair leitores chineses. Os críticos dizem ser mais correcto escrever artigos nas línguas locais zambianas.

Em Juba (Sudão do Sul) vi um método chinês de negócio peculiar: investidores arrendavam a privados – e às igrejas – lotes urbanos por um preço simbólico para construir a expensas próprias e explorar as infra-estruturas durante quinze anos. Nessa altura, vão passar os imóveis e a sua gestão aos donos do terreno a custo zero. Como as técnicas de construção e os materiais usados não dão garantias – vem tudo da China juntamente com a mão-de-obra, e o calor húmido é inclemente, os proprietários vão receber edifícios prontos para demolição. O «amigo chinês», esse recuperou o investimento e voltou para casa, satisfeito. Decididamente não há almoços grátis mesmo na ajuda de Pequim à África.

4 de dezembro de 2018

NATAL SEM O MENINO

É uma mãe jovem, muito criativa e comunicativa.

Combinou fazer uma acção antes do Natal com as educadoras na sala da pré-primária que a filhota frequenta.

Decidiu explorar o Calendário do Advento com os pequeninos: queria falar-lhes da preparação do Natal com palavras, canções e desenhos além de um chocolate.

Preparou as janelinhas para os dias de aulas antes do Natal: cada uma tinha uma palavra, um símbolo, uma melodia… Deu trabalho, mas estava contente com o produto final!

Tudo a postos, telefonou à educadora a explicar: «Vou explorar com os meninos o significado do Natal, Menino Jesus, Reis Magos, a Estrela com um Calendário do Advento! Cada dia vão abrir uma janelinha.»

Espantada, ouviu do outro lado do telemóvel: «Ó mamã, lamento mas não pode falar dessas coisas: é proibido pela direcção do colégio. Pode falar do pai-natal, das renas, dos duendes… Mas de Advento, do Menino-Jesus, dos Reis Magos, não… Explore a palavra generosidade para expressar os sentimentos do Natal!»

E a mamã lá teve que voltar à mesa de trabalho e, contrariada, reorganizar um Calendário do Advento laico sem Advento nem o Menino nem os Reis Magos com renas e duendes e um gorducho barbudo.

«O pior é que os meninos da sala são todos católicos» - lamentou-se.

Pois é: Natal sem o Menino não é Natal.

Natal é o dia de anos de Jesus!

É o dia de anos de cada um de nós que, através do seu nascimento, nascemos filhas e filhos de Deus.

Bom Advento!

Vá lá: podem comer um chocolate…