A comunidade católica de Hirbora fica nos arredores da cidadezinha de Zambaba, a quase três dezenas de quilómetros de Adola, o segundo centro da missão comboniana de Qillenso, na estrada que dá para a Somália.
Os rebeldes do Exército de Libertação da Oromia (OLA na sigla em inglês) — a quem o Governo apoda pejorativamente de Chané — estão particularmente ativos na área. Devido à insegurança, nos últimos dois anos visitamos a capela apenas quatro vezes.
Conheci Hirbora no primeiro domingo de novembro, depois de dois anos em Qillenso. Tínhamos agendado os batismos para o domingo de Pascoela, mas um ataque do OLA a Zambaba — com o saque do posto de saúde local — levou ao adiamento para 5 de novembro.
Saí de Adola com o todo-o-terreno lotado: duas Missionárias da Caridade (as Irmãs de Santa Teresa de Calcutá), o senhor Sholango (o professor reformado sempre pronto a acompanhar os missionários nas visitas às comunidades), Gammachu (um adolescente que está a ser tratado da tuberculose no hospício das irmãs e que também nos acompanha nas idas às capelas) e um grupo de jovens que queriam conhecer Hirbora ou simplesmente dar um passeio.
A cerca de oito quilómetros de Adola fomos parados no controlo militar junto à capela de Hurre Heto. Todos saímos da viatura para sermos identificados e o veículo revistado.
A partir daí, a estrada era uma incógnita para mim! Por isso, tinha alguma preocupação com o que poderia encontrar adiante. As estórias de assaltos, destruição de veículos, sequestros e mortes às mãos dos rebeldes do OLA são comuns.
A estrada enrola-se, qual jibóia gigante de asfalto, pelas colinas verdejantes de campos de tefi (o cereal miúdo nativo da Etiópia) ou pastos e através de uma floresta frondosa de árvores autóctones a competirem com pinheiros e eucaliptos por um lugar ao sol.
Uma paisagem linda, mas perigosa: os rebeldes usam a densa floresta para organizarem emboscadas na estrada com o fito de extorquir dinheiro e bens aos passantes. Também fazem sequestros para extorquirem avultados resgates.
Hirbora, a capela com a frente de verde pintada, ali está: altaneira, com vistas deslumbrantes para as colinas à sua volta com uma alta coluna, obra das térmitas, de sentinela à sua frente.
A pequena capela — luminosa das seis janelas e do reflexo do seu teto de tecido branco — estava cheia. Mais de quatro dezenas de católicos esperavam a cantar pela minha chegada para celebrarmos a eucaristia e os batismos.
Na assembleia estava Haro Waqo. É um dos dois catequistas de Massina — a capela azul — que fica a uns cinquenta quilómetros de Hirbora. Veio por iniciativa pessoal passar algum com os católicos das comunidades à volta de Zambaba para os animar na fé.
Perguntei-lhe se queria aproveitar a boleia até Adola. «Fico por aqui mais uns dias» — respondeu, com o seu sorriso habitual. Um lindo exemplo de dedicação missionária.
Fiquei muito edificado com o modo como as pessoas participaram na missa através das respostas seguras e dos cânticos cheios de energia e alegria. Apesar de, em dois ano, ser aquela a quarta vez que celebravam a Eucaristia dominical, mostravam pelo seu estar que se reunem amiúde para celebrar a Palavra, presididos pelo catequista.
(Abro um parêntesis: reconhecendo a dedicação e empenho de alguns catequistas na liderança das comunidades e com a preparação catequética que têm, pergunto-me porquê, mesmo casados, não podem ser ordenados presbíteros para que as comunidades católicas sejam verdadeiramente eucarísticas, que se reunam à volta da Eucaristia pelo menos semanalmente?)
Antes da Eucaristia, atendi de confissão quem quis, como é prática pastoral no Vicariato Apostólico de Hawassa. A assembleia, entretanto, rezou as orações da manhã e algumas dezenas do terço.
No início da celebração expressei a grande alegria por finalmente conhecer os católicos de Hirbora depois de dois anos da chegada a Qillenso! Zambaba era uma palavra mágica que me enchia de expectativas e — confesso — de medos.
A Eucaristia foi celebrada com a calma e alegria que caraterizam as liturgias por estas latitudes. O tempo não é um bem essencial que não se pode esbanjar. É um estar juntos que se faz e celebra.
Durante a celebração, administrei o batismo a três adolescentes e cinco bebés. A comunidade continua paulatinamente a crescer.
No final da missa, pediram-me para abençoar os rebuçados a ser distribuídos pela petizada.
A minha primeira visita a Hirbora concluiu com uma refeição: injera (o pão local feito com farinha de tefi) e um refugado de lentilhas, regados com um refresco.
Depois fizemos uma visita guiada pelo terreno da comunidade.
Quando o comboniano mexicano padre Pedro Pablo Hernández pediu às autoridades locais um pedaço de terra para começar o catecumenato, ofereceram-lhe aquele espaço avantajado no alto da colina com vistas sobre Zambaba.
A primeira construção foi de paus e capim. Depois construíram a capela atual: de madeira e barro, coberta a zinco, com dois pequenos cómodos atras do altar.
A viagem de regresso a Adola foi já bem mais descontraída.
Como a segurança à volta de Zambaba a melhorar, decidimos começar a celebrar a eucaristia dominical todos os meses em Hirbora, mantendo a situação sob o radar.
A comunidade fiel católica merece essa atenção. E esse risco.
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