1 de janeiro de 2023

MARIA E OS QUATRO PILARES DE 2023

A liturgia deste primeiro dia do novo ano é particularmente evocativa e seria uma pena não compreender a riqueza da mensagem das três breves leituras que a transmitem. Trata-se da primeira Palavra do ano, portadora de graça e bênção. 

As duas palavras mais recorrentes nas leituras são abençoar/bênção (primeira leitura e Salmo 66) e filho/filhos (segunda leitura). Poderíamos acrescentar uma terceira, retirada do Evangelho e de toda a celebração: Maria, a quem se consagra este primeiro dia do ano. Maria, Mãe de Deus, tão solenemente proclamada e celebrada pela Igreja. Associado a ela vem o de Jesus, o seu filho, a criança que hoje é circuncidada e recebe o nome de Jesus.

Gostaria de reflectir sobre a Palavra a partir precisamente destas quatro "palavras": Maria, Jesus, bênção e filhos. O cenário é o início do novo ano e o Dia da Paz. Estas quatro palavras são os alicerces, os quatro ângulos, ou se quiserem, os quatro pilares sobre os quais construir a casa das nossas vidas durante este novo ano. 365 tijolos são colocados à nossa disposição para o fazer. A Palavra dá-nos o plano ou projecto.


1. MARIA e o escândalo da manjedoura.

"Todos os que ouviram ficaram surpreendidos com as coisas que os pastores lhes disseram. Maria, pela sua parte, guardou todas estas coisas, ponderando-as no seu coração".

Entramos no Ano Novo sob os auspícios de Maria, a Mãe de Deus. Se nesta época natalícia a nossa atenção vai principalmente para a Criança, como é natural, hoje a Igreja convida-nos a levantar o nosso olhar para a Mãe. Com ela aprendemos como olhar, acolher e aprofundar o Mistério do nascimento da Criança. 

Os pastores encontram a criança "deitada na manjedoura". E o facto é motivo de alegria para eles, porque confirma a palavra do anjo, mas também porque o Salvador nasce no seu ambiente, ele é um deles. Para todos, o testemunho dos pastores é motivo de admiração. Mas para Maria? "Para Maria, a Santa Mãe de Deus, não foi assim. Ela teve de suportar "o escândalo da manjedoura" (Papa Francisco, 1 de Janeiro de 2022).

Gostaria de lhe propor que encontrasse um espaço de tempo nestes dias para parar diante de um ícone de Maria ou, melhor ainda, para a visitar numa das suas muitas "moradas", os santuários dedicados a ela, para lhe pedir a sua "paciência meditativa". Os 365 tijolos do novo ano não serão todos bonitos e suaves, bem quadrados e fáceis de encaixar na construção das nossas vidas. Talvez! Alguns ficarão bastante deformados e difíceis de encaixar. Sim, receio que não nos faltem problemas, dificuldades, escuridão e - Deus nos livre! - situações trágicas! São os tijolos do desânimo, da tristeza ou mesmo do escândalo face a certos acontecimentos da vida. Sentir-nos-íamos tentados a descartá-los como inúteis. Só este olhar de Maria que "guardava todas estas coisas, ponderando-as no seu coração" nos pode ajudar. Só a sua "paciência meditativa" nos permitirá conseguir integrar certos blocos de construção no puzzle das nossas vidas. O que não é compreendido, e que seríamos tentados a descartar, deve ser mais valorizado. 

Vamos entrar no Ano Novo pela Porta de Maria, ou pela janela dos seus olhos!


2. JESUS, o Nome e os Nomes

"Quando os oito dias prescritos para a circuncisão foram completados, foi-lhe dado o nome de Jesus, como tinha sido chamado pelo anjo antes de ser concebido no ventre.”

Hoje, no oitavo dia de nascimento, o menino é circuncidado e recebe um nome: Jesus, isto é, "o Senhor salva", o nome designado pelo Céu através do anjo. O nome Jesus é a forma portuguesa do Iesoûs grego, em latim Jesus. A palavra aramaica original era Yeshua, uma forma contratada do Yehoshua hebraico. Josué, o sucessor de Moisés, tem este nome. Era um nome muito comum, como uma profissão de fé. Agora, porém, este nome dado à pessoa de Jesus revela a sua identidade. É uma profissão de fé nos lábios daqueles que o invocam. De facto, São Pedro dirá: "Não há outro nome sob o céu dado aos homens, no qual é estabelecido que devemos ser salvos". (Actos dos Apóstolos 4:12)

Agora Deus tem um nome: Jesus, 'O Senhor salva'. E podemos nomeá-lo e estabelecer uma relação pessoal com Ele. O nome de Jesus aparece 566 vezes nos evangelhos. É o Nome que dá valor a todos os outros nomes, aos nossos próprios. 

Como seria bom se durante este Ano Novo o nome de Jesus fosse o mais comum nos nossos lábios e o mais vivo nos nossos corações! Isto sugere-me outro exercício espiritual: porque não fazer nossa a chamada "Oração do Coração", que consiste em repetir continuamente o nome de Jesus, ao ritmo da nossa respiração, como se repete o nome de um ente querido. Uma bela forma de oração consiste precisamente na simples repetição do nome de Jesus, estabelecendo uma corrente entre mim e Ele e entre Ele e eu, até que dois corações batem em uníssono.


3. BENÇÃOS: Abençoados, abençoemos!

"Que o Senhor te abençoe e te guarde. Que o Senhor faça brilhar o seu rosto sobre ti e seja gracioso para contigo. Que o Senhor te mostre o seu rosto, e te conceda a paz". (Números 6: 22-27, primeira leitura)

É especialmente consolador e inspirador perceber que este novo ano começa sob o signo da bênção. Entramos em 2023 abençoados. Mas temos de permanecer na bênção! E para isso abençoar Aquele que é o Bendito, fonte de toda a bênção, para abençoar a minha vida, para bem-dizer a minha história... mesmo quando eu não vejo esta Sua bênção, antes pelo contrário! 

Abençoar especialmente aqueles que encontramos ao longo dos nossos dias. "Abençoai e não amaldiçoeis!" (Romanos 12:14). Temos de confessar que nos chega mais naturalmente, frequentemente e de bom grado, amaldiçoar em lugar de abençoar. Dizer mal da vida, dos políticos, dos padres (infelizmente, por vezes com boas razões!), do gerente do escritório, dos colegas, do autocarro atrasado, do trânsito, do vizinho no andar de cima que é demasiado barulhento ou que atira as beatas os cigarros para o meu terraço... E assim arriscamo-nos a viver uma vida amaldiçoada!

Quando eu era criança - e o hábito permaneceu comigo como adulto - fui habituado a pedir a bênção aos meus pais, avós e tios. E eles invocavam a bênção de Deus sobre mim. Como alguns de vós, suponho eu. Hoje em dia, não ocorreria a ninguém pedir tal coisa. Talvez com a excepção de a pedir ao padre: essa é a sua função! Precisamos de "bênçãos" mais tangíveis. 

No entanto, se tantas coisas correm mal, é porque falta a bênção! Já não abençoamos! Esquecemos que abençoar é a vocação do cristão: "Não render o mal com o mal ou o insulto com o insulto, mas responder desejando o bem. Pois a isto fostes chamados por Deus para herdar a sua bênção". (1 Pedro 3:9)

Aqui está um terceiro exercício para 2023: sair de casa, todos os dias, abençoar e dar bênçãos à esquerda e à direita!


4. FILHOS, adoptados no Filho

"Irmãos, quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei, para redimir aqueles que estavam sob a Lei, para que pudéssemos receber a adopção como filhos... Então já não és um escravo, mas um filho" (Gálatas 4:4-7, 2ª leitura)

Aqui está a suprema bênção: ser filhos! Para começar o Ano Novo com o pé ou o passo certo, é preciso começar como filho, não como escravo medroso, sob a tirania da lei! Se eu sou um filho, o que posso temer? Sim, a vida é uma luta constante, mas lutamos como vencedores e não como perdedores, à partida!

Apresso-me a concluir para... me fazer abençoar, a convite de alguns de vós! Feliz Ano Novo!


P. Manuel João, Castel d'Azzano, 30 de Dezembro de 2022 

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