© JVieira
Somos filhas e filhos de uma cultura palavrosa, barulhenta. Pessoas e ideias tendem a ser avaliadas em escalas de decibéis, a publicidade entra-nos pelos olhos e pelos ouvidos, os políticos são malabaristas de semânticas esvaziadas de referências ideológicas e sem pinta de compromisso social, os fazedores de opinião não dão tréguas à inteligência do cidadão comum, os relações públicas sufocam-nos, os telemóveis mandam na nossa vida, o tiquetaquear inexorável dos segundos afoga.
Vivemos em plena idade digital com os vícios intactos da oralidade de onde viemos.
Na segunda leitura deste domingo, Paulo escreve aos cristãos de Roma – e aos de qualquer lugar e tempo: «O Espírito Santo vem em auxílio da nossa fraqueza, porque não sabemos que pedir nas nossas orações; mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis» (Rm 8:26).
O Espírito Santo é o porta-voz das nossas orações, porque somos fracos e não sabemos o que pedir.
Reza por nós e connosco através de gemidos inefáveis, indizíveis, de silêncios. Porque é no silêncio da briza da tarde que Deus está presente – com o descobriu Elias, o pai dos profetas, no monte da aliança, o Horeb (1 Reis 19:13).
Estamos habituados à espiral do ruído mas é do silêncio das palavras e gemidos indizíveis que precisamos para escutar a Deus e a nós próprios.
Mwanito, a personagem mais jovem de Jesusalém, um romance de Mia Couto, é um afinador de silêncios, um fazedor de silêncios onde o seu pai, Silvestre Vitalício, vive depois de perder a mulher.
Couto acrescenta: «O silêncio é uma travessia. Há que ter bagagem para ousar essa viagem.»
Bom domingo.
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