8 de abril de 2024

A CHUVA VOLTOU



Deixei Qillenso no dia 25 de março para participar na Assembleia Provincial e no Conselho Provincial que se lhe seguiu em Hawassa, a cidade onde se encontra a sé-catedral da diocese com o mesmo nome. O nome que vem do lago que a embeleza.

A natureza estava pintada de tons castanho: a erva secara há bastante tempo e o gado contentava-se em rapar o palhuço temperado com pó e aguentar as carraças que se multiplicam na poeira.

Muitas árvores estavam nuas devido à canícula serrana que, este ano, começara no fim de novembro, um mês mais tarde garças ao fenómeno meteorológico chamado El niño.

A estação seca, a bonna, é a altura do ano que mais gosto de Qillenso pela temperatura amena, pela luminosidade, pela abundância de comida para as pessoas.

Regressei uma dúzia de dias depois e o castanho tinha esverdeado: a ganna gurracha, a estação escura das chuvas como os Gujis lhe chamam, tinha iniciado.

A chuva apareceu pela calada convocada pelos dois piares agudos e um grave que formam cada chilreio da ave chama-a-chuva. O vento empurrou as nuvens enquanto que os trovões as abanaram para finalmente abençoarem a terra ressequida com a água que carregavam no seio.

O cheiro da terra seca a receber as primeiras chuvas depois de quatro meses de estiagem é indescritível: é abafado, cheiro da vida que se renova, da natureza que acorda depois da pausa estival que é tempo das colheitas e para retemperar forças.

O gado volta a poder ruminar, tranquilo, a erva viçosa que o alimenta. Já não precisa de correr mundos e fundos para uma refeição escassa. Agora há pasto por todo o lado!

As árvores, queimadas pelo calor da montanha, voltam a sentir a seiva a circular nos seus troncos e os gomos despontam em novas folhas viçosas e em flores.

Os pássaros cantam, felizes, a mudança do tempo que lhes traz mais alimento. As abelhas colhem o néctar que as alimentará em dias menos fartos. E as borboletas dançam de flor em flor.

As pessoas voltam aos campos para os lavrar com o arado rudimentar puxado por dois bois e semear o milho para aproveitar a irrigação que vem do céu, a única rega disponível. Se as chuvas falham, os ratos comem as sementes e a semeadura lá se vai...

A estação da chuva traz apagões frequentes, que o sistema solar que instalamos com a ajuda dos Combonianos de Portugal ajuda a dirimir iluminando a nossa noite.

É também a época da humidade, do nevoeiro, das veredas enlameadas. De mais um cobertor na cama.

É a estação em que trocamos o conforto dos todo-o-terreno pelas galochas para visitar as capelas construídas na floresta. 

É tempo de arriscar a viagem a Massina, a capela mais ativa na zona de Adola e mais mal servida de picada.

É oportunidade de fazermos causa comum com quem nos cruzamos e trocamos saudações de paz nas idas e vindas das capelas, de brincarmos com a pequenada que guarda o gado.

Sem chuva não há vida. Sem chuva não há comida. Quando a humidade é de mais – lá para julho – a lareira da sala mantém a casa quente e confortável. E dias mais secos hão de vir!

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