23 de agosto de 2018

CARTA DE NEPI



Ecos das jornadas de Nepi (VT)
das Direções gerais dos Institutos missionários fundados em Itália,
5-12 de agosto de 2018

Caríssimos Irmãos e Irmãs,
                                   
                                            Como Direções gerais dos oito Institutos masculinos e femininos exclusivamente missionários de fundação italiana – Consolata, PIME, Saverianos/as e Combonianos/as – reunimo-nos de dia 5 à tarde até dia 12 de agosto em Nepi, na casa das Irmãs Missionárias da Consolata, para rezar e refletir juntos sobre a missão ad gentes. Os presentes éramos 43, entre missionários e missionárias. Reservámos os primeiros cinco dias para os exercícios espirituais, orientados por Teresina Caffi, missionária saveriana, enquanto os últimos dois dias, 11 e 12 de agosto, foram dedicados à formação e intercâmbio sobre o tema «Missão ad gentes – a nossa identidade de missionários/as», ajudados por uma reflexão feita pelo P. Félicien Ntambwe, CICM, missionário de Scheut, originário do Congo-Kinshasa.
Durante os exercícios espirituais, meditando perícopes tiradas dos primeiros dezasseis capítulos dos Atos dos Apóstolos, mergulhámos nos primeiros passos da missão confiada por Jesus aos seus apóstolos: «Sereis minhas testemunhas» (Act 1, 8), para colher aí os valores permanentes e reconhecer o dinamismo que o Espírito Santo imprimiu à Igreja desde os inícios.
«O Espírito da verdade há de guiar-vos para a verdade completa» (Jo 16, 13) tinha sido a promessa de Jesus. E os Atos mostram a progressiva compreensão por parte dos apóstolos e evangelizadores da salvação levada e realizada por Jesus. Um dom gratuito que o Espírito é «impaciente» de oferecer a todos e todas, fazendo cair uma série de barreiras, escalas, prioridades que a mentalidade antiga fazia ainda albergar nos anunciadores. «Deus concedeu-lhes o mesmo dom que a nós» (Act 11, 17), repete sem cessar o autor dos Atos; aliás, «nós acreditamos que pela graça do Senhor Jesus Cristo seremos salvos, exatamente como eles» (Ac 15, 11), querendo significar que a gratuidade do dom às gentes revela aos antigos seguidores da Lei que é por pura graça que também eles são salvos. Nos Atos, Lucas apresenta várias vezes um modelo de procedimento para se abrir à novidade do Espírito: comporta a firme escolha de habitar, na cidade, a «sala de cima» da oração (Cf. Act. 1, 13), a atenção apaixonada à história e o intercâmbio genuíno e fraterno na comunidade dos crentes, para chegar a uma leitura dos sinais. Como nos colocamos perante as urgências do Espírito que germinam no terreno da história hoje?
Os dois últimos dias dedicámo-los a um momento de formação permanente: tratou-se de uma iniciativa inédita, um tempo de estudo e de partilha sobre o tema da missão ad gentes. A oportunidade é a convocação por parte do Papa Francisco de um Outubro Missionário especial para 2019 «a fim de despertar mais a consciência da missio ad gentes e de retomar com novo ímpeto a transformação missionária da vida e da pastoral» (Carta do Santo Padre de 22/10/2017).
Na manhã de 11 de agosto, os oito institutos presentes puseram em comum experiências e reflexões sobre o que deveria «qualificar o serviço Ad Gentes: âmbitos a privilegiar, conversão, formação».
Na escolha dos âmbitos de serviço, as menções que mais se salientaram foram no sentido do primeiro anúncio, a escolha de grupos historicamente «distantes» do Evangelho ou onde a comunidade cristã vive os inícios da sua história, contextos de forte conflitualidade e de grave injustiça social. A consagração para a vida é essencial, juntamente com a referência espiritual sempre mais intensa Àquele que chama à missão e a ligação carismática respeitante à origem de cada instituto.
A substância e o método caminham juntos: partilhámos o desejo de promover presenças menos estruturadas, com comunidades ágeis e fraternas, num estilo humilde, pobre de meios, mas rico de relações humanas. A sensibilidade comunitária e para um trabalho desenvolvido em colaboração ministerial e fraterna é também um elemento que encontra cada vez mais espaço e atenção.
Outro elemento particularmente atual é o processo de interculturalidade quer no seio de cada instituto quer em relação às diversas culturas encontradas. O desafio do encontro com um povo, a sua história e cultura requer tempos prolongados para o conhecimento e o aprofundamento, e isto por vezes é difícil conciliar-se com a condição de provisoriedade da escolha missionária.
De tarde, o P. Félicien Ntambwe desenvolveu o tema: «Ad gentes: carisma e missão. Problemática, pertinência e futuro». Carisma e missão, disse o P. Félicien, são as duas faces de uma mesma medalha e devem manter-se unidas. Para lá da definição territorial, ad gentes significa «para lá da nossa comunidade de fé».
Ao missionário é necessária uma formação adequada e uma espiritualidade particularmente sólida, encontrando-se ele fora do contexto de fé que lhe é consonante. Assumir mais plenamente o nosso carisma ad gentes requer: o encontro pessoal com Jesus Cristo; o sentido de ser salvo por ele e o reconhecimento; a compaixão pelo mundo e o desinteresse total, o «despojamento» da própria vida, que pertence a Cristo.
Assinalou depois as questões que alguns aspetos do pensamento atual e da reflexão teológica fazem despontar acerca do conceito de missão e de missionário ad gentes:
·         Se toda a Igreja é missionária, qual é o papel das Congregações especificamente ad gentes? Se o diálogo é necessário, em que se torna a pregação? Se as religiões contêm elementos salvíficos, qual é a razão do ir? Das incertezas sobre estes aspetos nasceu um certo desencanto, inclusive a desconfiança pela vocação missionária.
·         A globalização substituiu a colonização, o mundo mistura-se, as fronteiras são humanas mais que geográficas. Se as «gentes» estão por todo o lado, que significa «ad extra»?
·         Também os missionários mudam: o facto de em breve a maior parte dos missionários vir dos Países do Sul do mundo, que alteração trará à missão?
O P. Félicien descreveu seguidamente as características do mundo de hoje: globalização, migração, pós-modernidade e ecologia; também a crise atual da fé interpela a missão. A missão global não é só ad gentes, mas também inter gentes; somos chamados a mover-nos em direção às fronteiras não só geográficas mas também humanas, a passar do «implantar» a Igreja a «ser» Igreja.
Partilhou connosco também a experiência da sua Congregação acerca da interculturalidade como um doloroso processo, a gestão económica, que une solidariedade geral e empenho de autossustento local, e por fim o ad extra entendido como disponibilidade absoluta para a missão universal; sobretudo ao início, esta configura-se também como uma partida além-fronteira.
No dia 12 de agosto, através da discussão nos grupos e o sucessivo debate em assembleia, procurámos dar forma a propostas concretas para uma colaboração mais intensa e continuada entre os institutos. Foi expresso o voto de que a colaboração se reproduza localmente nos países em que estão presentes mais institutos.
Uma parte importante do debate centrou-se sobre como poder ser uma «voz» comum e forte quando é preciso fazê-la ouvir, sobre os canais de difusão e os modos para a tornar mais eficaz.
Refletiu-se também sobre como oferecer uma animação qualificada em vista do outubro de 2019.
Os superiores e superioras gerais marcaram encontro para o próximo dia 12 de outubro para tirar as conclusões sobre as propostas feitas no final das jornadas de formação.
Eis aqui, caríssimos irmãos e irmãs, o essencial dos nossos intercâmbios e sobretudo a indicação deste espírito de fraternidade e colaboração que somos convidados a fazer crescer entre as nossas famílias missionárias, para melhor responder hoje às exigências do anúncio ad gentes.

Nepi, 13 de agosto de 2018
As Direcções gerais dos
Missionários e Missionárias da Consolata
Missionários e Missionárias do PIME
Missionários e Missionárias Combonianos
Missionários e Missionárias Saverianos

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