Francisco dedica meia dúzia de parágrafos a Maria, a jovem de Nazaré. Meio milhar de palavras sobre as quais quero reflectir convosco, porque nos ensinam muito.
O Papa chama Maria de «influenciadora de Deus», recuperando um discurso que fez em janeiro no Panamá durante as Jornadas Mundiais da Juventude.
Na vigília com os jovens disse: «a jovem de Nazaré não aparecia nas «redes sociais» de então; Ela não era um «influenciador» (influencer, em sentido digital) mas, sem querer nem procurá-lo, tornou-Se a mulher que maior influência teve na história».
Os influenciadores digitais são figuras públicas que conseguem influenciar comportamentos e opinião através dos conteúdos originais que publicam nas redes sociais (YouTube, Facebook, Instagram, Twitter…). Usam vídeos, fotos e textos.
As grandes marcas pagam fortunas para os influenciadores recomendarem os seus produtos. Os influenciadores cobrem todas as áreas da vida: da moda à alimentação, da beleza ao desporto, dos jogos digitais à mudança de comportamentos.
Maria, a influenciadora de Deus, não usa a net nem nos impõe padrões de consumo. Antes, ensina-nos o caminho do sim a Deus através dos sins da sua vida.
O Papa continuou com o discurso: «Poderíamos, com confiança de filhos, defini-La: Maria, a influenciadora [às ordens] de Deus. Com poucas palavras, teve a coragem de dizer «sim», confiando no amor, confiando nas promessas de Deus, que é a única força capaz de renovar, de fazer novas todas as coisas».
Nossa Senhora do Sim, ensina-nos a dizer sim ao amor como a força da vida na vontade de servir a todos, sobretudo aos mais necessitados.
Depois, arrematou a reflexão: «Maria embarcou no jogo e, por isso, é forte, é uma “influenciadora”, é a “influenciadora” de Deus! O “sim” e o desejo de servir foram mais fortes do que as dúvidas e dificuldades».
Sandra Amado, uma comboniana brasileira minha amiga, comentou que Maria é influenciadora porque «não teve medo nem reservas de se expor, mostrando a sua fragilidade. Então ficou livre para influenciar todos os que têm medo daquilo que outros pensem de si. É uma mulher de fibra».
O nº 44 da exortação apostólica é uma transcrição deste discurso.
Mas antes Francisco escreveu: «No coração da Igreja resplandece Maria. Ela é o grande modelo para uma Igreja jovem, que quer seguir Cristo com frescura e docilidade. Quando era muito jovem, recebeu o anúncio do anjo e não se coibiu de fazer perguntas. Contudo, tinha uma alma disponível e disse: “Eis a serva do Senhor”» (nº 43).
É esta mulher resplandecente que segue o Filho de Belém até Jerusalém, da manjedoura ao túmulo, e que com os discípulos se entrega à oração na sala de cima depois da Ressurreição, que celebramos e contemplamos para aprendermos também nós a sermos influenciadores dos nossos dias; sermos sal, luz e fermento num mundo que precisa de redenção para não cair no abismo do egoísmo globalizado que mata as pessoas e a natureza, que mata a vida!
A jovem de Nazaré sentiu-se perturbada, colocou questões, tirou dúvidas a limpo, fez perguntas, expressou perplexidades. Mas no fim disse com a força que lhe veio de Deus: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lucas 1, 38).
Maria segue Jesus com frescura e docilidade e coloca-nos nesse caminho se aprendermos dela e com ela a estar sempre prontos para ir ao encontro dos que precisam.
O relato da anunciação – ou da evangelização de Maria como os nossos irmãos ortodoxos lhe gostam de chamar – termina com uma frase breve mas tremenda: «E o anjo retirou-se de junto dela» (Lucas 1, 38).
Outra missionária amiga comentou: «na vocação há uma grande solidão». Há, se ficarmos apartados a gozar a mística do instante. Maria, essa pôs-se a caminho, apressada, fazendo frente aos perigos da montanha, urgente para ajudar Isabel.
A solidão cura-se no encontro com o outro, nas relações interpessoais. «O inferno não são os outros. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti», escreveu Valter Hugo Mãe em A Desumanização.
Francisco descreve o percurso de vida da Mãe do Céu num breve parágrafo: «Sem ceder a evasões nem a miragens, “ela soube acompanhar a dor do seu Filho [...], sustentá-lo com o seu olhar, abrigá-lo no coração. Dor essa que sofreu, mas que não a deixou resignada. Foi a mulher forte do ‘sim, que sustém e acompanha, protege e abraça». (nº 45).
Ela ensina-nos a sermos acompanhadores, cuidadores das dores de uns dos outros, lutadores contra a resignação ou a demissão, a dizer sim à vida, às suas alegrias e dificuldades.
E também é a acompanhadora, a cuidadora de cada um de nós «neste vale de lágrimas» que, com o seu abraço e a sua intercessão, se transforma em planície de alegria.
Tudo porque se escancarou ao Espírito Santo que a fecundou com a força do altíssimo. Por isso, Francisco a descreve como «a jovenzinha de olhos iluminados pelo Espírito Santo que contemplava a vida com fé e tudo guardava no seu coração de menina» (nº 46).
É este Espírito consolador que precisamos para fazer face aos dias que correm: aos medos do outro, do diferente que fecha o coração e não nos deixa ser solidários a ponto de menorizar a bondade e criminalizar o resgate de pessoas naufragadas no mar…
E para contemplarmos as maravilhas que Deus continua a fazer, a sua bondade presente na nossa história.
O Papa argentino termina a sua breve mas profunda reflexão sobre o modo como Maria nos influencia nos caminhos de Deus, encomendando-nos à sua protecção.
«Aquela jovenzinha, hoje, é a Mãe que vela pelos filhos, estes filhos que caminhamos pela vida muitas vezes cansados, carentes, mas querendo que a luz da esperança não se apague. É isso o que nós queremos: que a luz da esperança não se apague», escreve no (nº 48).
Sim! Somos filhas e filhos de Maria. Jesus deu-no-la como Mãe através do discípulo amado aos pés da Cruz (João 19, 26-27). Esse discípulo sem nome, que Jesus amava, é cada um de nós.
Neste mundo confuso, agitado, violento podemos estar cansados, carentes, mas queremos continuar a alimentar a luz da esperança que mantém vivo em nós o sonho de Deus de novos céus e nova terra, de um reino de justiça, paz e alegria no Espírito Santo, como Paulo explicou na carta que escreveu aos cristãos de Roma (14, 17).
O Papa remata: «A nossa Mãe olha este povo peregrino, povo de jovens querido por ela, que a procura fazendo silêncio no coração, mesmo que no caminho haja muito ruído, conversas e distrações. Contudo, diante dos olhos da Mãe só cabe o silêncio esperançado. E assim Maria ilumina de novo a nossa juventude».
É este silêncio esperançoso que escancaramos à Mãe de misericórdia que como no casamento de Canã, repete a cada um de nós: «Fazei o que Ele vos disser!» (João 2, 5).
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