16 de fevereiro de 2013

PRÉMIO PAZ


© Gurtong
O bispo emérito de Torit, diocese do Sudão do Sul, foi distinguido na semana passada com um prémio de paz das Nações Unidas em reconhecimento dos seus esforços para construir confiança entre tribos inimigas.
Dom Paride Taban recebeu o Prémio Sérgio Vieira de Mello 2013 pelo seu trabalho na Aldeia da Paz da Santíssima Trindade, em Kuron.
A Aldeia da Paz foi estabelecida em 2005 depois de o bispo ter conhecido a comunidade de Neveh Shalom, durante uma visita a Israel, onde famílias árabes e judaicas vivem em harmonia para promover o diálogo e a paz entre as duas raças.
O bispo pensou que a experiência podia ser uma resposta para os conflitos constantes e mortíferos entre as diversas tribos criadoras de gado na Equatória Oriental. Resignou como bispo da diocese e retirou-se para Kuron, uma zona remota da Equatória Oriental, onde começou a Aldeia de Paz da Santíssima Trindade.
Hoje Kuron é uma aldeia vibrante onde membros de tribos inimigas e de religiões diferentes vivem em harmonia a cultivar a terra.
Laurant Vieira de Mello, que dirige a Fundação Sérgio Vieira de Mello, disse que a aldeia da paz da Santíssima Trindade, em Kuron, é um exemplo de reconciliação e de paz que devia encorajar outras comunidades a seguir o modelo em zonas de conflito do Sudão do Sul.
Hilde Johnson, a representante do Secretário-Geral da ONU no Sudão do Sul, disse que «Dom Paride, um proeminente ator sul-sudanês da paz, merece o prémio pelo esforço para cimentar a confiança e paz entre tribos diversas e que os seus esforços deviam servir de inspiração para comunidades em pontos quentes do país.»
Dom Paride vai receber o prémio – com a quantia simbólica de cinco mil francos suíços – das mãos do Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, a 1 de Março, em Genebra, na Suíça.
A Fundação Sérgio Vieira de Mello recorda o oficial brasileiro das Nações Unidas que foi morto por uma bomba em Bagdad, no Iraque em 2003, juntamente com 21 colegas. A Fundação foi estabelecida em sua memória para promover o diálogo para a resolução pacífica de conflitos. O prémio anual é atribuído a indivíduos, instituições ou comunidades em reconhecimento do trabalho especial e único a favor da reconciliação pacífica entre pessoas e partes em conflito.

11 de fevereiro de 2013

RENÚNCIA


O Papa surpreendeu hoje o mundo e a igreja ao anunciar em latim aos cardeais reunidos em consistório para votarem três novos santos a sua renúncia ao papado a partir das 20h00 de 28 de Fevereiro.
Trata-se de uma decisão corajosa e realista: o Papa Bento reconhece que já não tem a energia necessária para continuar a desempenhar o seu ministério e acha que é melhor retirar-se e entregar a liderança da comunidade católica a outro.
Há 600 anos que um Papa não apresentava a resignação de livre vontade e por isso o seu gesto está a criar ondas de admiração, estupefação e expetativa.
José Ratzinger foi eleito papa a 19 de Abril de 2005 e deixa uma marca profunda em quase sete anos de papado. Teólogo, afirmou-se sobretudo como pensador e intelectual e produziu algumas encíclicas surpreendentes como «Deus é Amor» e outras intragáveis como «Caridade na verdade».
Teve alguns problemas com os muçulmanos por causa de uma citação polémica, mas também teve a coragem de enfrentar a questão da pedofilia dentro da Igreja. Talvez tenha sido demasiado condescendente com os conservadores cismáticos e a reintrodução da missa tridentina em latim foi vista como uma traição às reformas corajosas do Concílio Vaticano II.
Foi o Papa que mais livros produzir e tornou-se num vendedor de sucesso. Com os lucros das vendas estabeleceu uma espécie de nobel da teologia e financiou obras caritativas.
Sendo um artista – teólogo, pianista, melómano – também era vaidoso: pôs de lado a simplicidade do vestir de Paulo VI e João Paulo II para «desenterrar» cruzes de ouro e vestimentas e chapéus adornados com peles e com bordados a ouro, além dos sapatos Prada.
No fim fica o ato corajoso de reconhecer que as forças não chegam para mais e é altura de resignar. Uma resignação que foi preparada com dois consistórios em 2012 para manter o número máximo de cardeais e garantirem a eleição do seu sucessor. Agora merece o sossego dos guerreiros – dias de paz e de tranquilidade, em contemplação e com alguma música à mistura!

2 de fevereiro de 2013

FIM DO MUNDO

Para o presidente da Nigéria, a violência no seu país, na República Centro-Africana e na Síria podem ser indicadores de que o mundo está para acabar.

No fim do ano passado, o presidente Goodluck Jonathan visitou uma igreja de Abuja, a capital da Nigéria, e comparou os ataques dos islamitas do Boko Haram (na foto) – que mataram 34 pessoas, incluindo 27 cristãos, durante a quadra natalícia – às guerras civis na República Centro-Africana e na Síria, questionando se a onda de violência nos três países não seria um sinal do fim do mundo iminente. «Temos desafios, sem dúvida, especialmente os ataques terroristas recentes contra todos nós e a Igreja, que é um dos alvos principais. Poderá isto ser uma maneira clara de nos dizerem que o fim do mundo está perto?», interrogou-se o presidente.
A dúvida do presidente Jonathan pode ser interpretada como reconhecimento da incapacidade do Governo para conter as atividades violentas do Boko Haram, um movimento radical que quer impor a lei islâmica aos cerca de 170 milhões de Nigerianos, apesar de só metade se confessarem muçulmanos. O Governo tentou responder à matança do Natal, atacando posições dos rebeldes islâmicos no Norte do país no dia 1 de Janeiro, e matou 13 militantes. O ex-presidente Olugesun Obassanjo criticou a mão dura com que o Governo está a tentar resolver a questão do Boko Haram, que, segundo observadores, está a afetar sobretudo a população civil, apanhada no fogo cruzado, e propôs negociações diretas com os rebeldes islamitas.
O Boko Haram – literalmente, educação (ocidental) proibida, expressão formada por uma palavra hausa e outra árabe – nasceu em 2002 quando um líder radical islâmico foi marginalizado por clérigos muçulmanos no Norte do país. O grupo começou a recrutar simpatizantes e financiadores entre 2005 e 2008. Em Junho de 2009, organizou um levantamento popular em que morreram mais de 800 pessoas. Em 2011, iniciou ataques regulares contra polícias, militares e postos de venda de bebidas alcoólicas. A primeira igreja foi atacada em Junho de 2011, e desde então os templos – católicos e protestantes, mas também algumas mesquitas – têm sido o alvo predileto do Boko Haram, que fontes militares e diplomáticas ocidentais acusam de manter contactos com a Al-Qaeda do Magrebe Islâmico e o Al-Shabab da Somália. No ano passado, matou mais de 270 pessoas.

1 de fevereiro de 2013

ENCONTROS DE CULTURAS


©SAmado
Os padres sinodais deram uma tarefa à Igreja em África: que desenvolva a (nova) evangelização no encontro com as antigas e novas culturas.

Em Julho do ano passado, tive de celebrar a missa Zande – em inglês – na paróquia de Nzara e tive uma surpresa interessante: os músicos do coro conseguiram combinar o tradicional xilofone azande feito de madeiras da floresta local com as modernas guitarras elétricas, uma parábola cultural de como o velho e o novo podem unir-se num casamento harmonioso.
Esta experiência veio-me à mente quando li o que os padres sinodais pediram à África na mensagem final do sínodo: «Nós olhamos para vós cristãos, homens e mulheres, que viveis nos países de África e expressamos a nossa gratidão pelo vosso testemunho ao Evangelho por vezes em circunstâncias difíceis. Exortamos-vos a reavivar a evangelização que recebestes em tempos recentes, a construir a Igreja como família de Deus, a fortalecer a identidade da família, a suster o empenho de padres e catequistas especialmente nas pequena comunidades cristãs. Afirmamos a necessidade de desenvolver o encontro entre o Evangelho e culturas velhas e novas. Grande expectativa e um apelo forte é dirigido ao mundo da política e aos governos das várias nações de África para que, em colaboração com gente de boa vontade, direitos humanos fundamentais possam ser promovidos e o continente livre de violência e dos conflitos que ainda o afetam.»
Um parágrafo que apresenta um itinerário abrangente para uma pastoral incarnada: o caminho da (nova) evangelização em África passa pelo diálogo do Evangelho com as culturas tradicionais e contemporâneas e pela promoção dos direitos humanos fundamentais como caminho para a pacificação do continente.
As novas gerações africanas vivem entaladas entre a tradição e a modernidade e o seu sistema de valores está a diluir-se continuamente. O Evangelho tem de guiar as novas gerações a fazerem novas sínteses de valores. A Igreja Ortodoxa Etíope resistiu às investidas do Islão porque traduziu a Bíblia na sua língua e inculturou a liturgia que aprendeu da Igreja de Alexandria, no Egipto. Mais perto do nosso tempo, a Igreja da República Democrática do Congo criou um rito próprio dando à celebração tonalidades africanas. As Igrejas locais em África têm de indigenizar a fé para que o Evangelho não saiba a produto importado mas seja testemunho de que Deus também é africano, fala através das culturas africanas e disseminou nas culturas africanas as sementes da Palavra à espera de germinar no contacto com o Evangelho!