30 de dezembro de 2010
PROJECTOS
Os seis anos do período interino entre a assinatura do acordo de paz (2005) e o referendo de autodeterminação (2011) foram parcos em matéria de desenvolvimento de infra-estrutura no Sul do Sudão.
O governo semi-autónomo aponta o dedo acusador ao governo de unidade nacional por não ter investido na reconstrução do Sul e consequentemente não ter tornado atractiva a opção pela unidade no plebiscito de 9 de Janeiro.
Durante os últimos anos, o projecto mais substancial levado a cabo pelo norte no sul foi a extensão do caminho de ferro de Aweil até Wau, cerca de 120 quilómetros que custaram 46 milhões de dólares. As muitas promessas que o presidente da república Omar Hassan al Bashr fez nas celebrações anuais da assinatura da paz caíram no cesto roto do esquecimento.
Mesmo assim, Juba tem sido palco de um surto de crescimento notável. A mancha de asfalto vai tomando conta das ruas cheiras de crateras e pó, o parque hoteleiro cresceu por iniciativa de investidores nacionais e estrangeiros e o sector da habitação regista um momento de grande expansão.
Juba transformou-se um estaleiro a céu aberto com privados a construir habitações e negócios, o estado a reabilitar ou edificar instalações, as igrejas a erigir novos centros de culto, organismos internacionais ocupados na recuperação da infra-estrutura social, tudo em ferro e cimento, o sinal maior de que os investidores acreditam que a paz veio para ficar.
A nível de indústria, o projecto mais significativo foi a montagem de uma cervejeira que custou cerca de 50 milhões de dólares aos sul-africanos da SAB Miller e produz 350 mil hectolitros de cerveja por ano. O empreendimento conta ainda com uma linha de refrigerantes e uma engarrafadora de água de mesa que se junta às oito fábricas de engarrafamento de água.
Com o chegar da hora do não retorno – a independência – o governo apresentou uma série de projectos que visam consolidar a autonomia económica da região com a indústria petrolífera à cabeça por se tratar da maior fonte de rendimento e o motor de desenvolvimento do Sul do Sudão.
O ministro da energia e minas do governo do Sul do Sudão – que também detém a pasta do petróleo – anunciou a construção de três refinarias nos próximos anos. A de Akon, no estado de Warrap, vai custar 1,8 mil milhões de dólares num investimento conjunto da empresa privada Eyat Oilfield Services, de Cartum, e da estatal NilePet, do Sul do Sudão. A estrutura vai transformar 50 mil barris de crude por dia dentro de três anos. As refinarias de Bentiu e Terekeka são por enquanto projectos anunciados.
Ainda no domínio do petróleo, o Governo e a Toyota-Kenya estudam a viabilidade de ligar os poços do Sul do Sudão com o porto queniano de Lamu, ainda em desenvolvimento. O projecto vai custar 1,5 mil milhões de dólares. Até agora, o crude dos campos do sul – cerca de 400 mil barris diários mas a produção vai aumentar quando a Total francesa começar a extrair crude do Bloco B que é maior que Portugal – é escoado pelo oleoduto que os chineses construíram com os próprios presos entre o estado de Unity e Port Sudan no Mar Vermelho. Os chineses, os maiores investidores no sector do petróleo do Sudão, preferem uma ligação mista rodo-ferroviária entre o Sul do Sudão e Lamu.
Ainda no sector da energia, o governo anunciou estudos para construir uma central hidroeléctrica no Nilo Branco dentro de dez anos para abastecer as necessidades locais e para exportação.
No sector da rede viária, o projecto mais adiantado é o do alcatroamento da estrada entre Juba e Nimule, na fronteira com o Uganda. Trata-se da via de abastecimento do Sul do Sudão – os comerciantes ugandeses fazem cerca de mil milhões de dólares em exportações informais por ano especialmente para Juba – e mais tarde poderá ser também a rota de escoamento dos produtos agrícolas e industriais para exportação. A via, de cerca de 192 quilómetros, vai custar uns 200 milhões de dólares e a USAID, a agência de desenvolvimento internacional norte-americana que paga a factura, disse estará pronta dentro de 18 meses.
O ministro do comércio e da indústria anunciou planos para ressuscitar o complexo agrário de Nzara, montado pelos ingleses antes da independência para produzir roupas, alimentos e óleos, a fábrica de açúcar de Mangala, as fábricas de cerveja e de enlatamento de frutas e vegetais de Wau e a cimenteira de Kapoeta.
No sector da habitação, o projecto mais arrojado e extravagante o é o da recuperação e desenvolvimento das grandes cidades do Sul em forma de animais e frutas, os símbolos de alguns dos estados. O projecto está avaliado em 10 mil milhões de dólares e os «blue prints» estão prontos. Juba, por exemplo, vai ter a forma de um rinoceronte – o animal distintivo do Estado de Equatória Central – enquanto a nova Wau vai parecer uma girafa e Yambio um ananás.
O Ministério da Agricultura também anunciou planos para assegurar a auto-suficiência alimentar para a região. A guerra e os conflitos inter-tribais que nos últimos oito meses fizeram mais de 900 mortos e 215 mil desalojados, paralisaram por completo a produção agrícola em larga escala numa área rica em água e terras férteis.
O ministério tem planos para melhorar a produção da agricultura tradicional e introduzir a agricultura industrial com o intuito de transformar o sul do Sudão no celeiro da África Oriental. A ministra Anne Itto esteve recentemente na China para estudar modelos de desenvolvimento agrícola e atrair investimentos para o sector.
Ainda no sector da produção alimentar, cerca de uma dúzia de criadores de galinhas conseguem abastecer as necessidades do mercado hoteleiro.
O sul enfrenta o futuro com muitos projectos. Haja paz para os cumprir.
27 de dezembro de 2010
MAIS CINCO
Kiir (E) cumprimenta Igga (D) © Lomayat
Alguns sectores políticos estão a propor aos habitantes do sul do Sudão de deixaram de se cumprimentar com uma mãozada e usar a versão mais cinco.
A razão é simples: duas mãos unidas são o símbolo da unidade enquanto uma mão ao alto representa a separação no boletim de voto do referendo.
O exemplo vem do «alto». O presidente do governo do Sul do Sudão, Salva Kiir Mayardit, cumprimentou o presidente do Assembleia Legislativa do Sul do Sudão com um «mais cinco» no final da missa de Natal na catedral católica de Kator, Juba.
Será que a moda pega? Estamos a 13 dias do início do referendo.
24 de dezembro de 2010
SETENTA
O meu colega Luciano Perina fez hoje 70 anos. Metade passou-os no Sudão em lugares quentes como o Darfur e Abyei. Também exerceu o cargo de superior provincial durante os últimos seis anos. Prepara-se para fazer umas ferias na Itália para depois voltar ao Sudão amado.
Contou que quando nasceu mãe queria chamar-lhe Natale e o pai Colombo pela admiração que tinha pelo Cristóvão das viagens marítimas. A avó desempatou a situação: vai chamar-se Luciano – disse - e Luciano ficou!
Fizemos a festinha ao almoço e o superior preparou uma refeição de arromba, a melhor que comi aqui em quatro anos.
O Luciano gosta muito da Terra: passa os tempos livres no quintal às voltas com as árvores de fruta, as plantas e as galinhas e os pintos.
Obrigado Luciano e muitos parabéns!
23 de dezembro de 2010
A POSTOS
O Juíz Reec fala à imprensa depois de ter recebido o material para as eleições © PMoggi
A divisão da ONU para referendos e eleições (UNIRED) entregou hoje à Comissão para o Referendo do Sul do Sudão os boletins de voto e outros materiais que vão ser usados para o plebiscito de autodeterminação agendado para daqui a 17 dias.
A UNIRED entregou à comissão 7,5 milhões de boletins de voto, mais 8500 cabinas de voto, além de material vário para elucidar os votantes sobre o modo como vão exercer o direito à autodeterminação.
Chan Reec Madut, que lidera o Bureau para o Referendo do Sul do Sudão, agradeceu à comunidade internacional por ter pago a impressão e envio do material e a Deus pelo milagre de tudo ter chegado a tempo apesar dos problemas que a Europa tem experimentado com os transportes aéreos.
Os boletins foram impressos na Inglaterra.
Entretanto, a ONU já começou a distribuir os materiais para o voto pelos centros de referendo no Sudão e pelos oito países onde a diáspora sul-sudanesa vai votar: Quénia, Uganda, Etiópia, Egipto, Reino Unido, Canadá, Estados Unidos e Austrália.
Está tudo a postos para o voto!
20 de dezembro de 2010
INOCENTE
O padre Renato Sesana Kizito foi declarado inocente do crime de pedofilia de que foi acusado há mais de um ano.
O Pe. Kizito, missionário comboniano italiano, fundou um centro de acolhimento para meninos de rua em Kivuli, num bairro de lata de Nairobi, a capital d Quénia.
Em Junho de 2009, quatro menores acusaram o padre de os ter abusado sexualmente. A imprensa e sobretudo a televisão queniana fizeram um alarido enorme acusando o padre Kizito de ter molestado centenas de crianças.
A 1 de Dezembro, uma carta da Procuradoria-geral do Quénia anunciava que «as acusações foram investigadas e arquivadas por falta de provas suficientes para julgar o suspeito.»
O mesmo documento diz que as testemunhas principais e a acusação se retrataram e confessaram que foram pagas para implicar o padre Kizito.
A Procuradoria diz ainda que imagens comprometendo supostamente o padre Kizito eram falsas.
A Comunidade Koinonia que deu a notícia exige que os meios de comunicação que denegriram a imagem do padre Kizito e puseram em risco o trabalho de assistência aos meninos de rua reponham o respeito e a dignidade que ele merece.
O Pe. Kizito, missionário comboniano italiano, fundou um centro de acolhimento para meninos de rua em Kivuli, num bairro de lata de Nairobi, a capital d Quénia.
Em Junho de 2009, quatro menores acusaram o padre de os ter abusado sexualmente. A imprensa e sobretudo a televisão queniana fizeram um alarido enorme acusando o padre Kizito de ter molestado centenas de crianças.
A 1 de Dezembro, uma carta da Procuradoria-geral do Quénia anunciava que «as acusações foram investigadas e arquivadas por falta de provas suficientes para julgar o suspeito.»
O mesmo documento diz que as testemunhas principais e a acusação se retrataram e confessaram que foram pagas para implicar o padre Kizito.
A Procuradoria diz ainda que imagens comprometendo supostamente o padre Kizito eram falsas.
A Comunidade Koinonia que deu a notícia exige que os meios de comunicação que denegriram a imagem do padre Kizito e puseram em risco o trabalho de assistência aos meninos de rua reponham o respeito e a dignidade que ele merece.
17 de dezembro de 2010
AUTONOMIA TRANSFORMATIVA
© JVieira
Assisti esta noite à antestreia de um novo documentário sobre o momento histórico que o Sudão está a viver.
O trabalho chama-se Autonomia Transformativa,Transformative Autonomy, e é a segunda produção de uma jovem juíza – a primeira, do ano passado, chama-se Mente Divina, Divine Mind.
Luris Mulla apresenta a história do Sudão numa narrativa sóbria e segura, apontando as razões históricas e culturais para o conflito quase permanente entre negros e «meio-árabes» (como ela considera os nortistas) desde 1956.
A sua tese fundamental é que o Sul tem um problema de identidade e de auto-crença.
A autora sustenta que o amor-próprio e a auto-estima são as bases pare reconstruir a nação, que o poder residente antes de mais na mente e numa visão divina do ser humano.
O vídeo apresenta depoimentos de figuras cimeiras do sul do Sudão, incluindo políticos e especialistas.
Entre os convidados que assistiram à antestreita contava-se o líder da primeira guerra civil, o General Reformado Joseph Lago que combateu Cartum entre 1956 e 1973 e foi presidente do Sul do Sudão depois da paz de Adis-Abeba.
A juíza Luris tem 23 anos e trocou a sala de audiências pelas câmaras para responder ao apelo de expressar as suas ideias e de as partilhar com o grande público.
Como bom estrangeiro, cheguei dez antes da hora prevista (19h00) para ter o privilégio de ser o primeiro convidado a aparecer e de esperar uma hora e dez minutos para ver o documentário. Mas valeu a pena.
O ministro da Informação - que estava entre os convidados - agradeceu ao pessoal por chegar tarde e pediu para a próxima virem mais cedo. Mas não é fácil porque aqui existe a instituição do «tempo local» ou «tempo sudanês», que quer dizer chegar atrazado ou começar um evento mais tarde! O tempo dilata com a espera...
15 de dezembro de 2010
RUMO AO SUL
Contam-se dezenas de camiões no largo e espaçoso terreiro do mercado de Bileil nos seus últimos preparativos antes de começar a viagem. É um espectáculo que se tornou repetitivo e lugar comum desde há bem dois meses.
Encontro-me no meio da grande praça que vou atravessando sem intenções de me deter com alguém. Vou respondendo, aqui e além, aos acenos de adeus de muita gente que eu próprio não pensava me conhecessem. Para as crianças que brincam despreocupdas não acontece nada de extraordinário. Já não assim para os mais velhos que vejo preocupados em ajeitar um lugar mais aconchegado ou menos incómodo possível entre as barras (de ferro) de camas, cadeiras de plástico, tachos e panelas, malas e sacos com vestuário. Espero que, quem viaja desde outras partes do Norte para o Sul do Sudão o faça com mais facilidade e dignidade. Além disso, há muitas famílias que viajarão por via aérea. No entanto, o panorama do mercado no terreiro de Bileil é o normal e comum para quem parte desde o Darfur.
Vozes de crianças desviam o meu olhar na direcção dos últimos veículos da caravana. "Maa sallama, ya abuna, maa salama (adeus, padre, adeus)". Tinham que ser mesmo eles, os pequenos do Valentino. Este sorria também, enquanto acabava de acomodar, no topo do camião, a esposa Lúcia que tinha ao colo o mais pequeno. Ali perto e ao meu redor cruzam-se vozes de súplica e desejos da protecção divina: Natauakkal! Natauakkal! Confiemos (em Deus)! É uma expressão que, natural e espontaneamente, aflora aos lábios dos sudaneses quando se aventuram em tarefas e viagens de excepcional dificuldade e risco.
São pessoas que, na sua grande maioria, não frequentaram a escola; no entanto, são conscientes de ser protagonistas do seu próprio destino: cidadãos da nova nação que querem começar. Domina-os, justamente, um visível e claro sentimento de alegria. Porém, ao mesmo tempo, não escondem a tristeza e, mesmo, a raiva de ter que deixar tudo e partir em situação quase de emergência. Mais ainda, a razão principal de viajar nesta hora e desta forma é só e simplesmente uma: o medo de serem vítimas de represálias por parte do governo do Norte. Este não aceita nem tolera a ideia do divórcio do Sul, quanto mais agora que estão a um passo da proclamação da independência. Mas não há volta atrás. Tudo leva a crer que vai ser este o resultado do referendo que os sulistas levarão a cabo já no próximo dia 9 de Janeiro de 2011.
Será uma nação que nasce a partir deles próprios, com toda a sua pobreza e os seus múltiplos limites. A maior parte dos que se metem a caminho do Sul sabem que terão de recomeçar a vida a partir do nada, na estaca zero. É o caso dos meus amigos Valentino e Lúcia que têm consciência do lugar que deixam e o destino que os espera. Fugitivos da guerra civil que destruia o Sul, foram trazidos ainda de pequeninos para o Darfur, onde (sobre)viveram até hoje. A memória que eles conservam do Sul é de guerra, sofrimento e extrema pobreza.
No alto do gigantesco veículo os quatro filhotes brincam e riem, contentes e satisfeitos com as tâmaras e o pão a acompánha-los aí no seu cantinho. Juntam-se aos pais num aceno de adeus contagiando quantos partilham aquela viatura que, com o resto da caravana, começa a pôr-se em movimento. O barulho simultâneo de tantos motores não me permite distinguir as palavras lançadas ao ar na minha direcção. A imaginação certeira traz-me o eco de volta: “Natauakkal”! Sim, não seja em vão a confiança que põem em Deus durante estes seis longos dias de viagem até Juba.
Dos olhos humedecidos da Lúcia desprende-se uma lágrima que o vento empoeirado imediatamente enxuga, marcando a sua linda tez negra de um sujo esbranquiçado. Lágrima-expressão de alegria? Muito certamente; mas não compete ao vento do deserto traçar a linha de separação entre o doce e o amargo desse nobre sentimento. Antagónicos mas caminham de mãos dadas, abraçam a certeza do agora e a esperança do amanhã e desabrocham na realidade total da pessoa.
Padre Feliz da Costa Martins, desde Nyala, Sul do Darfur
9 de dezembro de 2010
TRÊS MILHÕES
© JVieira
Cerca de três milhões de sul sudaneses recensearam-se para poderem votar no referendo de autodeterminação marcado para daqui a um mês.
O Comité do Referendo do Sul do Sudão apresentou ontem os resultados preliminares depois de o período de recenseamento eleitoral ter encerrado.
Segundo o Comité, cerca de três milhões registaram-se no Sul mas os resultados finais serão apresentados mais tarde porque comunicações com áreas remotas são difíceis mesmo depois de o Governo sulista ter fornecido uns 400 telefones-satélite para melhorarem as ligações locais.
O recenseamento correu bem sem incidentes a não ser o esgotamento de material de registo nos centros mais populosos.
As mulheres demoraram a cerrar fileiras nos centros do referendo, mas em alguns lugares ultrapassaram mesmo o número de homens inscritos sobretudo nas comunidades pastoris.
Se o número de eleitores possíveis se mantiver dentro dos três milhões, pelo menos 1,8 milhões têm que votar entre 9 e 17 de Janeiro para o referendo ver validado e escolherem entre independência e união com o norte.
O contador decrescente para o referendo continua a aproximar-se da marca zero apesar dos problemas que o relógio tem sofrido. A primeira versão – com números pequenos a indicar dias, horas e minutos em contagem regressiva para o referendo – foi danificada pelo forte vendaval de duas semanas atrás.
Os técnicos montarem mostradores com números gigantes que umas vezes funcionam e outras vezes ficam zerados depois dos apagões frequentes de Juba.
Entretanto, durante as últimas semanas, registaram-se pelo menos três confrontos militares com dois bombardeamentos aéreos do norte contra alvos a sul da fronteira e uma emboscada a um camião do exército do sul que transportava soldados e familiares. Pelo menos oito pessoas morreram no ataque ao camião – perpetrado por nómadas árabes Misseriya segundo o governo do Sul – enquanto os ataques aéreos se saldaram por uma vintena de feridos e mais de 3500 desalojados.
Os ataques a zonas remotas junto à fronteira em Aweil Norte e o Estado de Unity são vistos como provocações do norte para tentarem travar o referendo.
30 de novembro de 2010
FITAS
Hoje fui ao cinema depois do trabalho.
A União Europeia organizou o que pomposamente chamou de Festival de Cinema Europeu desde segunda até sexta na Universidade de Juba.O filme chamava-se Die Standesbeamtin –não me perguntem o que quer dizer porque não me disseram –, uma estória de amor entre o pindérico e o cómico, sobre encontros e desencontros e reencontros. É a vida!
Adorei: foi um fim de dia diferente e descontraído.
Um senão: os mosquitos também souberam do festival e marcaram presença em força!
Os filmes – nove ao todo – são exibidos num ecrã ao ar livre. Gostoso sentir a aragem fresca do fim do dia a acariciar a pele.
Ah! A entrada é gratuita e os espectadores têm direito a uma garrafa de água.
Os filmes no cardápio deste ano vieram da França, Holanda, Suíça, Itália, Espanha, Alemanha, Suécia, Noruega e Reino Unido. De Portugal? Só eu! Que até sou uma grande peça!...
29 de novembro de 2010
DESCULPAS
O governo de Equatória Ocidental apresentou hoje um pedido de desculpas ao bispo católico de Tombura-Yambio pelo inconveniente de uma detenção arbitrária.
O bispo Eduardo Hiiboro Kussala foi detido durante uma hora na esquadra de Nzara na sexta-feira ao fim do dia depois de ter sido parado no posto de controlo ao sair da cidade quando regressava a Yambio.
O bispo foi acusado pelo comandante de ter participado numa reunião secreta.
Dom Eduardo tinha passado a semana no centro catequético daquela localidade com um grupo de agentes pastorais a trabalhar a questão da auto-suficiência a partir de materiais e meios locais.
O bispo foi libertado após a intervenção do comissário do condado de Nzara, uma espécie de presidente da câmara, que o escoltou até Yambio, a cerca de 20 quilómetros.
Hoje o porta-voz do governo estatal Gibson Wande divulgou uma declaração a distanciar as autoridades da detenção do bispo.
O porta-voz disse que o governo nomeou uma comissão para fazer uma apresentação formal de desculpas ao prelado.
Wande adiantou que visitou pessoalmente Dom Eduardo para saber o que lhe aconteceu.
O bispo disse-lhe que o comandante tomou a decisão de o deter.
Uma fonte da Igreja disse que o chefe da polícia depois telefonou para Yambio a dizer que tinha preso qualquer coisa como um bispo.
O porta-voz apelou à calma enquanto o Governo investiga o incidente.
O bispo Eduardo Hiiboro Kussala foi detido durante uma hora na esquadra de Nzara na sexta-feira ao fim do dia depois de ter sido parado no posto de controlo ao sair da cidade quando regressava a Yambio.
O bispo foi acusado pelo comandante de ter participado numa reunião secreta.
Dom Eduardo tinha passado a semana no centro catequético daquela localidade com um grupo de agentes pastorais a trabalhar a questão da auto-suficiência a partir de materiais e meios locais.
O bispo foi libertado após a intervenção do comissário do condado de Nzara, uma espécie de presidente da câmara, que o escoltou até Yambio, a cerca de 20 quilómetros.
Hoje o porta-voz do governo estatal Gibson Wande divulgou uma declaração a distanciar as autoridades da detenção do bispo.
O porta-voz disse que o governo nomeou uma comissão para fazer uma apresentação formal de desculpas ao prelado.
Wande adiantou que visitou pessoalmente Dom Eduardo para saber o que lhe aconteceu.
O bispo disse-lhe que o comandante tomou a decisão de o deter.
Uma fonte da Igreja disse que o chefe da polícia depois telefonou para Yambio a dizer que tinha preso qualquer coisa como um bispo.
O porta-voz apelou à calma enquanto o Governo investiga o incidente.
27 de novembro de 2010
BISPO AUXILIAR
© CSierra
O Arcebispo de Juba anunciou hoje que o Papa tinha nomeado o Padre Santo Loku Pio bispo Auxiliar de Juba.
Arcebispo Paulino Lukudu Loro disse que escreveu ao Vaticano a 1 de Março de 2007 a requerer um bispo auxiliar para o assistir no cuidado pastoral.
O Arcebispo declarou emocionado que quer colaborar e viver com o novo bispo.
O Padre Loku disse que estava muito agradecido por o terem apresentado ao Vaticano para ser o bispo auxiliar de Juba. Disse que a nomeação num momento tão crítico da história do país tem um significado especial.
Fr. Loku tem 40 anos e foi ordenado há quase uma década.
Foi secretário privado do Arcebispo, Secretário-Geral da arquidiocese, pároco de Terekeka, e, desde Outubro, coadjutor da Catedral.
ARCEBISPOS
Os arcebispos de Juba recensearam-se juntos para votar no referendo de auto-determinação para o Sul do Sudão numa manifestação de unidade que é comum por estas paragens.
Os sulistas vão escolher entre a união e a separação com o norte num plebiscito agendado para 9 de Janeiro de 2011.
O arcebispo católico Paolino Lukudu Loro (à dirita, na foto) e o primaz anglicano arcebispo Daniel Deng Bul registaram-se no Centro do Referendo a funcionar na Escola Básica de Hai Jalaba na terça-feira.
Os dois prelados falaram da importânica de os cidadãos se inscreverem nos cadernos do referendo para exercerem o direito à autoderminação e alertaram os detentores do cartão de eleitor para votarem a 9 de Janeiro para validarem o resultado do referendo.
Para o sim à separação ser válido, pelo menos 60 por cento dos eleitores inscritos têm de tomar parte no voto.
No final os dois arcebispos – Juba disputa com Braga o título de cidade dos arcebispos! – visitaram uma das turmas da terceira classe e encorajaram os estudantes a empenharem-se para terem sucesso na vida.
Entretanto, ontem a Comissão Nacional do Referendo decidiu prolongar o recenseamento por uma semana até 8 de Dezembro «por razões técnicas».
A data do voto mantém-se de 9 a 17 de Janeiro de 2011. O porta-voz do SPLM, o partido que controla o sul, disse-me que a data do voto não é negocíavel.
Muitos centros do referendo ficaram sem material para registarem os cidadãos devido ao elevadíssimo número de sulistas que decidiram tomar parte no exercício.
No Egipto, um dos oito países onde os sulistas podem votar, o recenseamento ainda não começou devido a alegados problemas de comunicação nos canais diplomáticos entre Cartum e Cairo.
O Egipto tem dado sinais de grande nervosismo em relação ao previsível resultado do referendo. Uma das razões tem a ver com a partilha das ágas do Nilo Branco. Mas parece são ser a única. Analistas receiam que um Sul do Sudão independente encorage outros povos na mesma situação a lutar pela autodeterminação.
23 de novembro de 2010
VENDAVAL
Um tremendo vendaval varreu ontem alguns bairros de Juba e outras partes no Sul do Sudão.
Em Juba, meia dúzia de grandes suportes publicitários ou partiram ou foram arrancados sem perdas humanas nem grandes prejuízos materiais a registar.
As mangas essas caíram a bom cair e com grande estrondo nas folhas de zinco que cobrem as casas.
Árvores também perderam algumas pernadas.
O prejuízo maior deu-se na Rádio Emanuel de Torit: o ciclone destruiu a estrutura onde estavam montadas as antenas da estação. Restan de pé 12 dos 6o metros da torre.
A torre tinha menos de dois anos e foi concebida, fabricada e montada por uma empresa queniana. Suspeita-se de grave defeito estrutural porque de outra maneira a obra deveria ter aguentado a forte ventania que se fez sentir na capital da Equatória Oriental durante cerca de cinco minutos na tarde de ontem.
O director da rádio padre Santino Lounoi disse que o acidente foi uma catástrofe.
A Rádio Emanuel, uma das mais vibrantes emissoras da Rede de Rádios Católica do Sudão, vai ficar em silêncio até o suporte das antenas ficar resolvido numa altura crítica em que os ouvintes precisam de informação independente sobre o acto histório que preparam: o voto no referendo sobre a autonomia do sul.
20 de novembro de 2010
PROCISSÃO
© PSzalowski
Centenas de fiéis participaram hoje em uma mega-procissão com o Santíssimo Sacramento através das ruas de Juba para pedirem a paz para o referendo que se avizinha.
A procissão saiu por volta das dez da manhã da Igreja de São José e terminou quatro horas mais tarde na catedral de Santa Teresa depois de ter passado pelo Mausoléu do Dr. John Garang de Mabior, fundador do Movimento de Libertação dos Povo do Sudão.
Os participantes, representando as forças vivas de grupos paroquiais e escolas católicas, cantaram e rezaram durante todo o percurso debaixo de um sol escaldante.
Faixas identificavam as paróquias com palavras de ordem alusivas à participação no referendo.
No final alguns políticos aproveitaram a oportunidade para dirigir mensagens aos participantes, aconselhando-os a registarem-se para votarem no referendo de auto-determinação que deve ter lugar a 9 de Janeiro e votarem pela independência.
O recenseamento dos eleitores para o referendo iniciou-se na segunda-feira e tem corrido sem incidentes.
A procissão de hoje faz parte do programa 101 Dias de Oração por um Referendo Pacífico, que termina a 1 de Janeiro.
Amanhã os jovens da arquidiocese de Juba celebram o seu dia com a ordenação de três diáconos.
18 de novembro de 2010
POR UMA ESPIRITUALIDADE DO DINHEIRO
Sei que a muita gente este título parecerá uma blasfémia. O nosso Ocidente cristão estabeleceu uma barreira tão impermeável entre o espiritual e o material que tornou obtuso, à partida, qualquer diálogo entre a espiritualidade e a produção e circulação de riqueza. Para não falar já do funcionamento da economia ou das formas diversas do capitalismo. São campos completamente separados.
Quanto muito julgaremos legível a formulação do filósofo Jacques Ellul avançada como repto: «é necessário profanar o dinheiro», isto é, restitui-lo à sua função de instrumento material de troca, desinvestindo-o da sacralidade simbólica com que é tratado.
Mas defender “uma espiritualidade do dinheiro” é, certamente, caminhar nesse sentido. A leitura da Bíblia também aqui pode ser instrutiva. O Antigo Testamento, por exemplo, faz uma apreciação fundamentalmente positiva acerca dos bens e da prosperidade. Mas a diferença entre ricos e pobres é sempre vista como um escândalo intolerável. Toda a legislação social que enche o Livro do Deuteronómio não visa promover o remendo da esmola, mas pretende sim (e ousadamente) assegurar os direitos dos pobres. Institucionaliza-se na chamada «Lei da Aliança» um verdadeiro pacto social, que passa por medidas espantosamente concretas como o perdão das dívidas ou uma redistribuição periódica dos bens como meio de travar os cíclicos fenómenos de empobrecimento dos grupos sociais mais frágeis.
Por vezes ouve-se repetir apressadamente a sentença «Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» (Mt 22,21) como certificação de que Jesus virou as costas ao dinheiro. O Evangelho não conta isso. O episódio em casa de Zaqueu, o rico cobrador de impostos, mostra antes como o que acontece é uma mudança de papéis. O dinheiro deixa de ser amontoado e usado em função do próprio para passar a ser reparador de injustiças e antídoto contra a pobreza. Como explica o teólogo Daniel Marguerat, a interpelação de Jesus leva-nos mais longe, pois ele não pergunta apenas, «que fazes tu do teu dinheiro?”, mas coloca-nos perante esta incontornável questão: «o que é que o teu dinheiro fez de ti?».
Quanto muito julgaremos legível a formulação do filósofo Jacques Ellul avançada como repto: «é necessário profanar o dinheiro», isto é, restitui-lo à sua função de instrumento material de troca, desinvestindo-o da sacralidade simbólica com que é tratado.
Mas defender “uma espiritualidade do dinheiro” é, certamente, caminhar nesse sentido. A leitura da Bíblia também aqui pode ser instrutiva. O Antigo Testamento, por exemplo, faz uma apreciação fundamentalmente positiva acerca dos bens e da prosperidade. Mas a diferença entre ricos e pobres é sempre vista como um escândalo intolerável. Toda a legislação social que enche o Livro do Deuteronómio não visa promover o remendo da esmola, mas pretende sim (e ousadamente) assegurar os direitos dos pobres. Institucionaliza-se na chamada «Lei da Aliança» um verdadeiro pacto social, que passa por medidas espantosamente concretas como o perdão das dívidas ou uma redistribuição periódica dos bens como meio de travar os cíclicos fenómenos de empobrecimento dos grupos sociais mais frágeis.
Por vezes ouve-se repetir apressadamente a sentença «Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» (Mt 22,21) como certificação de que Jesus virou as costas ao dinheiro. O Evangelho não conta isso. O episódio em casa de Zaqueu, o rico cobrador de impostos, mostra antes como o que acontece é uma mudança de papéis. O dinheiro deixa de ser amontoado e usado em função do próprio para passar a ser reparador de injustiças e antídoto contra a pobreza. Como explica o teólogo Daniel Marguerat, a interpelação de Jesus leva-nos mais longe, pois ele não pergunta apenas, «que fazes tu do teu dinheiro?”, mas coloca-nos perante esta incontornável questão: «o que é que o teu dinheiro fez de ti?».
17 de novembro de 2010
CIAO, ADELMO!
Ciao, Adelmo.
A notícia da tua morte apanhou-me completamente desprevenido e deixou-me os olhos marejados. O Tesfay circulou uma carta em tua homenagem – muito linda mesmo – antes que Roma desse o alerta do teu falecimento.
Fiquei triste, mas também feliz porque os teus 84 anos foram bem cheios. Viveste simples, mas viveste bem!
Os teus dois amores – a Palavra de Deus e a juventude – fizeram de ti um modelo para mim. Era bonito chegar à capela de Awassa e encontrar-te lá em adoração profunda. E as vezes que caminhámos para a casa das Missionárias da Caridade para celebrar a missa às sete!...
A tua chegada a Awassa foi uma lufada de ar fresco: abriste a missão à juventude e a juventude à missão! Começaste a livraria católica, o eremitério junto ao lago… Andaste por toda a Etiópia com a tua equipa de leigos a promover a Semana de Jesus.
As tuas inovações na pastoral juvenil, a tua aposta numa equipa de jovens leigos, o desejo de viveres numa casa simples em Awassa com os pobres... trouxe-te alguns dissabores! Mas tudo ultrapassaste com a tua tranquilidade e boa disposição. E conseguias tempo para escrever livros, pregar retiros… ser missionário a tempo inteiro e de mil maneiras.
Adorei conhecer-te, ler os livros que me emprestavas do Nouwen e do Merton. Foi um privilégio participar no teu livro sobre o Evangelho de João.
Chegaste tarde à Etiópia, mas fizeste imenso.
Obrigado pelo teu exemplo. Pela tua amizade.
Há um ano, enquanto te entrevistava para a rede católica de rádios do Sudão, sentados junto ao lago Awassa, no eremitério Maranatha, disseste-me que começaste o teu trabalho missionário em Kit, aqui juntinho a Juba. Da Kit restam as ruínas, mas nunca esqueceste o Sudão apesar de teres estado na Quénia, Uganda e por fim na Etiópia.
Do Céu, do abraço de Deus, reza pelo Sudão, para que a Paz prevaleça nesta encruzilhada histórica do referendo de auto-determinação.
15 de novembro de 2010
RECENSEAMENTO
© JVieira
O recenseamento para o referendo sobre a autodeterminação do sul do Sudão começou hoje e começou bem.
As informações que chegam são que o processo começou lentamente, mas não houve incidentes a registar. Alguns centros de recenseamento demoraram a abrir, noutros oficiais demonstram alguma dificuldade em preencher os formulários, mas tudo em tranquilidade e civismo. Depois há o problema da identificação: gente que aparece sem documento nenhum a querer inscrever-se
O presidente do governo do Sul do Sudão deu o exemplo e foi dos primeiros a recensear-se em Juba.
No dia 9 de Janeiro os sulistas vão escolher entre a independência e a semi-autonomia que mantêm agora. Tudo indica que os separatistas vão ganhar. Os sulistas estão fartos de serem tratados como escravos pelos árabes do norte.
Quem vai votar? Todos os maiores de 18 anos que pertençam a um dos grupos étnicos do Sul do Sudão, filhos de um sulista e um não sulista que vivam no Sul desde a independência a 1 de Janeiro de 1956, e não sulistas que vivam no Sul desde a mesma data e respectiva prole.
Além dos certos de votos espalhados pelos dez estados do Sul, vota-se ainda no Norte e no estrangeiro: Quénia, Uganda, Etiópia, Egipto, Reino Unido, Estados Unidos, Canadá e Austrália. Mas só 100 por cento sulistas é que podem votar fora do Sul.
Para o referendo ser válido, pelo menos 60 por cento dos inscritos têm que participar no plebiscito. Ganha a opção que tiver mais de metade dos votos expressos.
O recenseamento termina a 1 de Dezembro.
14 de novembro de 2010
SOL DE JUSTIÇA
Mas, para vós que respeitais o meu nome, brilhará o sol de justiça, trazendo a cura nos seus raios (Malaquias, 3:20)
13 de novembro de 2010
REFERENDO
A Comissão Nacional do Referendo do Sul do Sudão finalmente publicou o boletim de voto para o plebiscito em que os sulistas vão escolher separaçã ou união com o Norte. Os símbolos são simples: uma mão - a dizer adeus? – simboliza o voto pela independência, enquanto que as duas mãos servem para escolher unidade: um país com dois sistemas! Os círculos são para a cruzinha da ordem. Nada de perguntas traiçoeiras e complicadas. O recenceamento eleitoral começa na segunda-feira e dura duas semanas. O voto devia decorrer de 9 a 17 de Janeiro se a situação se aguentar!
10 de novembro de 2010
SURPRESA
Juba continua a ser uma surpresa pegada!
Esta conta-se depressa:
É assim: ontem precisava de estar no Ministério da Informação às 11h00 para o Fórum semanal com os jornalistas.
O meu colega estava a usar o carro e só me restava uma solução: apanhar o «bodadoba», as motorizadas-taxi.
Perguntei ao condutor quando me levava para me transportar aos Ministérios.
Respondeu «Arba». Que quer dizer quatro. Como me tinha esquecido da tradução ofereci cinco libras sudanesas.
«Que não, é muito! Chegam três.»
Nunca tal me houvera acontecido: alguém querer menos do que o que ofereci! E logo eu que até estou habituado a pagar o imposto de pele – como eu lhe chamo! Kawaja, Branco paga mais!!!
A viagem foi agradável. Recordei-lhe que o recenseamento para o refendo sobre a independência começa na segunda e que de devia inscrever para exercer o direito de decidir o seu futuro. Agradeceu o lembrete e disse que se ia inscrever.
E além de honesto, barateiro e simpático, foi também um condutor cuidadoso.
Há dias que vale bem a pena sair da cama cedinho!!!
Esta conta-se depressa:
É assim: ontem precisava de estar no Ministério da Informação às 11h00 para o Fórum semanal com os jornalistas.
O meu colega estava a usar o carro e só me restava uma solução: apanhar o «bodadoba», as motorizadas-taxi.
Perguntei ao condutor quando me levava para me transportar aos Ministérios.
Respondeu «Arba». Que quer dizer quatro. Como me tinha esquecido da tradução ofereci cinco libras sudanesas.
«Que não, é muito! Chegam três.»
Nunca tal me houvera acontecido: alguém querer menos do que o que ofereci! E logo eu que até estou habituado a pagar o imposto de pele – como eu lhe chamo! Kawaja, Branco paga mais!!!
A viagem foi agradável. Recordei-lhe que o recenseamento para o refendo sobre a independência começa na segunda e que de devia inscrever para exercer o direito de decidir o seu futuro. Agradeceu o lembrete e disse que se ia inscrever.
E além de honesto, barateiro e simpático, foi também um condutor cuidadoso.
Há dias que vale bem a pena sair da cama cedinho!!!
8 de novembro de 2010
LINDO
© CMonteiro
O Dragão estava engalanado para a festa do futebol e os artistas não deixaram crédito em mãos alheias. Cinco-zero ao SLB é obra. Temos campeão! Obrigado, Compadre, pelo «boneco». Lindo mesmo! Eu segui pela TSF.
30 de outubro de 2010
RETORNO
Milhares de sulistas iniciaram a viagem de regresso às terras de origem em preparação para o referendo sobre a auto-determinação do sul do Sudão.
O referendo em que os sulistas vão escolher entre a independência e a unidade com o Norte mantendo alguma autonomia devia ser feito até 9 de Janeiro de 2011.
Cerca de 10 mil pessoas partiram de Cartum num comboio de 90 autocarros e 38 camiões e devem chegar ao Sul dentro de dez dias. Os mais abastados viajaram de avião.Espera-se que até ao fim do recenseamento para o referendo a 1 de Dezembro umas 500 mil pessoas retornem ao sul.
O regresso de tantos retornados depois de muitos anos de refúgio no norte do Sudão devido à guerra civil de duas décadas pode trazer alguma tenção à região devido à falta de infra-estrutura.
O êxodo acontece depois de o Governo ameaçar os sulistas a viver no norte de tempos difíceis caso o sul declare a independência como aliás se espera.
O grande pomo da discórdia é o petróleo que jorra das entranhas do sul do Sudão: qualquer coisa como uns 400 mil barris por dia, cerca de 80 por cento da produção diária do país.
Há também que decidir quem vai pagar a dívida externa no evento da separação (estimada em mais de 32 mil milhões de dólares), como vão partilhar as águas do Nilo Branco e resolver a marcação das fronteiras em cerca de 20 por cento e a dupla nacionalidade para sulistas no norte e nortenhos no sul.
24 de outubro de 2010
LOLOGO
Celebrei o Dia Mundial das Missões com a comunidade de Lologo, nas aforas de Juba.
Trata-se de uma comunidade nova e jovem, frequentada sobretudo por crianças e jovens, e assistida por um colega sudanês, o padre Hector Ayon.
Os mais pequenos participaram na missa debaixo de uma árvore. O resto estava na capela em construção. Trata-se de uma estrutura coberta a zinco, oferta de um general local.
Lologo é o local onde a maioria dos 30 mil ilegais de Juba acabaram por se fixar depois das suas casas serem derrubadas.
A missa foi em Bari (a língua local), árabe de Juba e inglês.
Senti-me bem acolhido e desfrutei daquela mais de hora e meia de oração e louvor junto ao rio, a contemplar aquelas caras lindas, jovens, compenetradas, às vezes também irrequietas, mas uma velhota com chibata repunha a ordem litúrgica.
Um colega comentou que os miúdos devem cair das árvores ou do céu porque pais e mães não se viam por ali.
Mas a igreja cresce e acolhe os pequeninos, os marginalizados, que continuam a ser as filhas e filhos predilectos, o objecto e sobretudo o sujeito da sua missão.
20 de outubro de 2010
HOMOFOBIA
O jornal ugandês Rolling Stone publicou uma lista com os nomes dos 100 mais homossexuais do país, e as respectivas fotos e moradas.
A lista era acompanhada da legenda «Enforquem-nos!»Nos dias seguintes à publicação pelo menos quatro homens que constavam da lista foram atacados e outro viu a casa apedrejada por vizinhos.
Outros esconderam-se temendo retaliações.
No ano passado, um membro do parlamento ugandês tentou passar uma lei que punia a homossexualidade com a pena de morte ou prisão conforme os casos.
O promotor da lei homófoba contava com o apoio de evangelistas americanos, mas o projecto de lei foi abandonado por indicação do presidente Yoweri Museveni devido à forte reacção adversa internacional.
O Rolling Stone dizia que uma doença desconhecida e mortal estava a atacar a comunidade homossexual no Uganda e acusava-a de recrutar um milhão de crianças através de raides às escolas.
O director do jornal, Giles Muhame, disse que a publicação da lista era de interesse público.
O Rolling Stone ugandês começou a publicação em Agosto e tem uma tiragem de cerca de dois mil exemplares.
O jornal foi confiscado pelas autoridades não pelo conteúdo mas porque não estava registado.
16 de outubro de 2010
ALIMENTAÇÃO
O Sul do Sudão tem cerca de 8,5 milhões de habitantes mas 4,7 milhões estão expostos à fome e 1,7 milhões dependa de assistência alimentar para sobreviverem.
Segundo a FAO, em 2009 os agricultores do Sul do Sudão produziram 660 mil toneladas de alimentos, mas os habitantes precisam de 850 mil toneladas para sobreviver. As 225 mil toneladas em falta vêm de organismos internacionais de assistênia.Entretanto, a FAO apresentou hoje um plano de acção de dois anos para o sul do Sudão.A organização para a agricultura e alimentação da ONU diz que precisa de quase 68 milhões de dólares americanos para assistir cerca de dois milhões de sulistas na autonomia alimentar.Os responsáveis da FAO no sul do Sudão dizem que as mudanças climáticas são responsáveis pelo défice alimentar na região. Secas e inundações aliadas a alguma insegurança estão na origem da falta de comida na região.Hoje a ONU celebrou o Dia Mundial da Alimentação sob o tema «Unidos contra a Fome.»
Segundo a FAO, em 2009 os agricultores do Sul do Sudão produziram 660 mil toneladas de alimentos, mas os habitantes precisam de 850 mil toneladas para sobreviver. As 225 mil toneladas em falta vêm de organismos internacionais de assistênia.Entretanto, a FAO apresentou hoje um plano de acção de dois anos para o sul do Sudão.A organização para a agricultura e alimentação da ONU diz que precisa de quase 68 milhões de dólares americanos para assistir cerca de dois milhões de sulistas na autonomia alimentar.Os responsáveis da FAO no sul do Sudão dizem que as mudanças climáticas são responsáveis pelo défice alimentar na região. Secas e inundações aliadas a alguma insegurança estão na origem da falta de comida na região.Hoje a ONU celebrou o Dia Mundial da Alimentação sob o tema «Unidos contra a Fome.»
12 de outubro de 2010
PRÉMIO
Uma jornalista da Cadeia Católica de Rádios do Sudão recebeu o Prémio UNICEF 2010 por um trabalho que publicou sobre os direitos da criança.
Marvis Birungi recebeu o prémio da melhor história da imprensa escrita do Sul do Sudão com o trabalho «Meninos de Rua: Responsabilidade de Quem», publicado no semanário The Juba Post.
A reportagem fala sobre as condições que levam as crianças a viver na rua e os riscos a que se expõem.
Marvis disse que é uma honra receber o prémio que lhe vai a possibilidade de viajar até ao Cairo, no Egipto.
A melhor reportagem da rádio foi para uma jornalista da Miraya FM, uma estação da ONU, que trouxe à antena o drama de uma criança presa em Juba. A criança foi libertada em consequência da reportagem.
A UNICEF premiou ainda quatro jornalistas do Norte do Sudão com três reportagens e uma foto-reportagem publicadas em jornais de Cartum.
11 de outubro de 2010
ATENTADO
O arcebispo de Cartum escapou ileso a um atentado enquanto celebrava a missa dominical.
O indivíduo da tribo Misseriya, identicado como Hamdan Mohamed Abdurrahman, tentou assassinar o cardeal Gabriel Zubeir Waqo enquanto este celebrava uma missa campal em honra de São Daniel Comboni, o fundador da Igreja Católica no Sudão.
O cerimoniário e guarda-costas do cardeal, Barnaba Matuec Anei, disse que depois do Glória enquanto os bailarinos regressavam aos seus lugares, viu um homem dirigir-se para o altar empunhando uma arma branca.
O mestre-de-cerimónias correu para o atacante, tirou-lhe o punhal e neutralizou-o, entregando-o depois aos polícias que faziam a segurança da missa.
Matuec disse que o atacante repetia «Não há problema» quando ele o travou.
O agressor encontra-se detido pela polícia para averiguações.
O atentado decorreu um dia depois de pró-unionista e pró-independentistas terem chocado durante um rali organizado pelo governo para promover a unidade do Sudão.
4 de outubro de 2010
DE VOLTA
Estou de volta a Juba e de volta ao Jirenna! As férias passaram a correr e a viagem de regresso foi óptima apesar de levar 24 horas entre voos e esperas. Um senão: tive que deixar em Lisboa duas garrafas de vinho verde e um boião de mel por excesso de peso. Mas trouxe o bacalhau! E um funcionário do café do aeroporto vai beber o vinho por mim.
Aqui fica um bem-haja do tamanho do mundo para os meus familiares, amigos e colegas que durante os últimos três meses encarnaram o cuidado, a ternura e o amor de Deus por mim. Jesus diz que para o seguirmos temos que deixar muito mas depois recebemos 100 vezes mais. E é verdade: as férias foram uma demonstração inequívoca de que Ele é um cavalheiro e não falta à palavra dada.
Encontrei os meus colegas missionários e missionárias todos bem. Houve alguns melhoramentos nos quartos destinados aos hóspedes e na cozinha – a casa está muito mais convidativa e arrumada – e agora temos galinhas e perus!
Os pés de manga estão floridos e prometem uma boa colheita lá para Dezembro. As papaieiras também estão bonitas e as goiabas bem gostosas.
Um senão: encontrei um jornalista que trabalha comigo muito maltratado. O presidente do Sul do Sudão, Salva Kiir Mayardit, regressou na sexta-feira de uma visita aos Estados Unidos. O governo organizou uma manifestação de boas-vindas no aeroporto e o Memo Lasuba estava a cobrir o acontecimento para a Rede Católica de Rádios do Sudão. Não se sabe por que carga de água a segurança o individualizou. O jornalista identificou-se mas depois foi brutalmente espancado por um soldado e dois polícias. Esta tarde vou apresentar queixa ao ministro da segurança interna.
De resto, Juba continua um autêntico estaleiro com tantos edifícios em construção apesar das incertezas do referendo sobre a auto-determinação que vai decorrer a 9 de Janeiro.
Por falar em referendo, o recenseamento de eleitores foi adiado para Novembro e já devia estar pronto a 9 de Julho. O norte e o sul continuam a trocar picardias sobre a consulta popular e o dia a chegar sem nada estar preparado. Será que o Sul vai fazer uma Declaração Unilateral de Independência? O secretário-geral do SPLM, o partido que governa o sul, disse-me uma vez que era uma alternativa ao referendo.
9 de setembro de 2010
20 de agosto de 2010
REPOUSO
Em toda a tradição bíblica o repouso é uma oportunidade privilegiada para mergulhar mais fundo, mais dentro, mais alto. É aceitar o risco de sentir a vida integralmente e de maravilhar-se com ela: na escassez e na plenitude, na imprevisibilidade dolorosa e na sabedoria confiante.
José Tolentino Mendonça em «O Hipopótamo de Deus e outros Textos»
17 de agosto de 2010
BELEZA
© JVieira
Sem a Beleza, a experiência cristã permanece incompleta, porque Deus é Beleza, esplendor, glória. Sabemos bem os riscos de um cristianismo puramente sociológico, articulado rotineiramente entre convicções e práticas. O cristianismo é também sobressalto do infinito, paixão pelo absoluto, estremecimento e epifania que nos transcendem, inexplicável insurreição que profeticamente nos levanta.
José Tolentino Mendonça em «O Hipopótamo de Deus e outros Textos»
6 de agosto de 2010
FÉRIAS
Já há mais de um mês que não passo por estas bandas. As férias têm-me mantido ocupado: carinho, descanso, boa vida… Reencontrar as pessoas, os gostos, os cheiros, as paisagens. Uma bênção sem dúvida.
Os sobrinhos fizeram-me uma recepção-surpresa com uma faixa de boas vindas, PowerPoint e teatro.
Passei o mês de Julho em Cinfães, com os meus pais, a minha família e os meus amigos. Agosto é para os amigos Portugal além depois de uma semana de praia em Esmoriz com os meus sobrinhos. Em Setembro volto a Cinfães para a ponta final das férias.
Viva o descanso!