24 de novembro de 2023

NOVO DIÁCONO COMBONIANO ETÍOPE









Melaku Wolde Tekle fez a profissão perpétua no Instituto dos Missionários Combonianos e foi ordenado diácono em vista ao presbiterado missionário.

Melaku — Anjo, em amárico, uma das muitas dezenas de línguas faladas na Etiópia — nasceu há 30 anos em Tanaka, eparquia de Emdibir.

Depois de concluir o postulantado em Adis-Abeba em 2015, foi para o noviciado em Lusaka, Zâmbia. Fez a primeira profissão como missionário comboniano em 2017 e completou o curso de teologia em Casavatore, Itália, em 2022.

Em 2023 regressou à Etiópia para o serviço missionário, um período de pastoral de dois anos antes da ordenação, integrando a comunidade comboniana de Gublak, entre o povo Gumuz.

A consagração perpétua para a missão no Instituto Comboniano teve lugar na tarde de 16 de novembro de 2023 no Postulantado de São Daniel Comboni em Asko, um bairro de Adis-Abeba, a capital etíope.

O comboniano ganês P. Joseph Anane, superior do postulantado, nas boas-vindas apresentou a celebração como um acontecimento grandioso que motiva os sete postulantes no processo pessoal de discernimento vocacional.

A celebração solene, presidida pelo superior provincial P. Asfaha Yohannes, contou com a presença de familiares e amigos do professante, uma dúzia de padres (dez combonianos e dois de Emdibir) e algumas Missionárias Combonianas.

Durante a homilia, o P. Asfaha recordou que Melaku iniciou a sua formação de base naquela comunidade há uma dezena de anos e agora encerra-a no mesmo local através da profissão de perpétua castidade, pobreza e obediência no Instituto Comboniano.

O Superior Provincial convidou Melaku a seguir as pegadas de São Daniel Comboni, abandonando-se à Providência Divina.

Depois das fotos da praxe, a celebração concluiu com o jantar festivo para todos os participantes.

Três dias depois, Melaku foi ordenado diácono em Bahirdar, a sede da eparquia onde serve como missionário e capital do estado regional amara.

A ordenação diaconal teve lugar no domingo, 19 de novembro, na igreja paroquial de Genete-Selam Kidanemihret.

Dom Lesanuchristos Metheos, eparca de Bahirdar-Dessie, presidiu à eucaristia da ordenação, que foi celebrada no Rito Católico Etíope.

Eparquia é o nome dado a uma diocese do Rito Católico Oriental e o seu bispo é eparca.

A Igreja Católica Etíope tem quatro eparquias (do rito oriental etíope) e oito vicariatos apostólicos e uma prefeitura apostólica (do rito latino).

Uma assembleia diversificada, formada por paroquianos, freiras, padres do clero local, jesuítas, vicentinos e combonianos, participou na eucaristia da ordenação.

Durante a homilia, Dom Lesanuchristos disse que a estimada posição de serviço do diácono traz uma responsabilidade imensa, pedindo-lhe para ser um farol do amor de Cristo, de compaixão e serviço aos irmãos e irmãs da comunidade cristã.

O novo diácono continua o seu estágio em Gublak, uma das duas missões confiadas aos combonianos na Eparquia de Bahirdar-Dessie.

A ordenação estava agendada para o fim de outubro na missão de Gublak, durante a festa dos seus padroeiros, os Beatos Mártires de Paimol (Uganda), Daudi Okelo e Gildo Irwa. Contudo, a insegurança causada pelos combates desde abril passado entre a milícia amara e o exército levou ao seu adiamento para Bahirdar.

9 de novembro de 2023

FINALMENTE, A CAPELA VERDE







A comunidade católica de Hirbora fica nos arredores da cidadezinha de Zambaba, a quase três dezenas de quilómetros de Adola, o segundo centro da missão comboniana de Qillenso, na estrada que dá para a Somália.

Os rebeldes do Exército de Libertação da Oromia (OLA na sigla em inglês) — a quem o Governo apoda pejorativamente de Chané — estão particularmente ativos na área. Devido à insegurança, nos últimos dois anos visitamos a capela apenas quatro vezes.

Conheci Hirbora no primeiro domingo de novembro, depois de dois anos em Qillenso. Tínhamos agendado os batismos para o domingo de Pascoela, mas um ataque do OLA a Zambaba — com o saque do posto de saúde local — levou ao adiamento para 5 de novembro.

Saí de Adola com o todo-o-terreno lotado: duas Missionárias da Caridade (as Irmãs de Santa Teresa de Calcutá), o senhor Sholango (o professor reformado sempre pronto a acompanhar os missionários nas visitas às comunidades), Gammachu (um adolescente que está a ser tratado da tuberculose no hospício das irmãs e que também nos acompanha nas idas às capelas) e um grupo de jovens que queriam conhecer Hirbora ou simplesmente dar um passeio.

A cerca de oito quilómetros de Adola fomos parados no controlo militar junto à capela de Hurre Heto. Todos saímos da viatura para sermos identificados e o veículo revistado.

A partir daí, a estrada era uma incógnita para mim! Por isso, tinha alguma preocupação com o que poderia encontrar adiante. As estórias de assaltos, destruição de veículos, sequestros e mortes às mãos dos rebeldes do OLA são comuns.

A estrada enrola-se, qual jibóia gigante de asfalto, pelas colinas verdejantes de campos de tefi (o cereal miúdo nativo da Etiópia) ou pastos e através de uma floresta frondosa de árvores autóctones a competirem com pinheiros e eucaliptos por um lugar ao sol.

Uma paisagem linda, mas perigosa: os rebeldes usam a densa floresta para organizarem emboscadas na estrada com o fito de extorquir dinheiro e bens aos passantes. Também fazem sequestros para extorquirem avultados resgates.

Hirbora, a capela com a frente de verde pintada, ali está: altaneira, com vistas deslumbrantes para as colinas à sua volta com uma alta coluna, obra das térmitas, de sentinela à sua frente.

A pequena capela — luminosa das seis janelas e do reflexo do seu teto de tecido branco — estava cheia. Mais de quatro dezenas de católicos esperavam a cantar pela minha chegada para celebrarmos a eucaristia e os batismos.

Na assembleia estava Haro Waqo. É um dos dois catequistas de Massina — a capela azul — que fica a uns cinquenta quilómetros de Hirbora. Veio por iniciativa pessoal passar algum com os católicos das comunidades à volta de Zambaba para os animar na fé.

Perguntei-lhe se queria aproveitar a boleia até Adola. «Fico por aqui mais uns dias» — respondeu, com o seu sorriso habitual. Um lindo exemplo de dedicação missionária.

Fiquei muito edificado com o modo como as pessoas participaram na missa através das respostas seguras e dos cânticos cheios de energia e alegria. Apesar de, em dois ano, ser aquela a quarta vez que celebravam a Eucaristia dominical, mostravam pelo seu estar que se reunem amiúde para celebrar a Palavra, presididos pelo catequista.

(Abro um parêntesis: reconhecendo a dedicação e empenho de alguns catequistas na liderança das comunidades e com a preparação catequética que têm, pergunto-me porquê, mesmo casados, não podem ser ordenados presbíteros para que as comunidades católicas sejam verdadeiramente eucarísticas, que se reunam à volta da Eucaristia pelo menos semanalmente?)

Antes da Eucaristia, atendi de confissão quem quis, como é prática pastoral no Vicariato Apostólico de Hawassa. A assembleia, entretanto, rezou as orações da manhã e algumas dezenas do terço.

No início da celebração expressei a grande alegria por finalmente conhecer os católicos de Hirbora depois de dois anos da chegada a Qillenso! Zambaba era uma palavra mágica que me enchia de expectativas e — confesso — de medos.

A Eucaristia foi celebrada com a calma e alegria que caraterizam as liturgias por estas latitudes. O tempo não é um bem essencial que não se pode esbanjar. É um estar juntos que se faz e celebra.

Durante a celebração, administrei o batismo a três adolescentes e cinco bebés. A comunidade continua paulatinamente a crescer.

No final da missa, pediram-me para abençoar os rebuçados a ser distribuídos pela petizada.

A minha primeira visita a Hirbora concluiu com uma refeição: injera (o pão local feito com farinha de tefi) e um refugado de lentilhas, regados com um refresco.

Depois fizemos uma visita guiada pelo terreno da comunidade.

Quando o comboniano mexicano padre Pedro Pablo Hernández pediu às autoridades locais um pedaço de terra para começar o catecumenato, ofereceram-lhe aquele espaço avantajado no alto da colina com vistas sobre Zambaba.

A primeira construção foi de paus e capim. Depois construíram a capela atual: de madeira e barro, coberta a zinco, com dois pequenos cómodos atras do altar.

A viagem de regresso a Adola foi já bem mais descontraída.

Como a segurança à volta de Zambaba a melhorar, decidimos começar a celebrar a eucaristia dominical todos os meses em Hirbora, mantendo a situação sob o radar.

A comunidade fiel católica merece essa atenção. E esse risco.

3 de novembro de 2023

PARTIU UM HOMEM DE DEUS


Dom Paride Taban, bispo emérito de Torit, no Sudão do Sul, regressou à Casa do Pai no dia 1 de novembro de 2023 de um hospital de Nairobi, Quénia, onde havia sido internado. Um santo que vive a comunhão plena com Deus e com os irmãos e irmãs no Dia de Todos os Santos. Contava 87 anos.

«Paride Taban era um humilde guerreiro para a paz», declarou Dom Eduardo Hiiboro Kussala, bispo sul-sudanês de Tombura-Yambio, ao programa Newsday da Rádio BBC.

Paride nasceu em 1936 em Opari, na Província de Equatória de Leste, no sudeste do Sudão. Foi ordenado padre em 1964 e bispo auxiliar de Juba, a capital do país, em 1980. Em 1983 tomou posse da nova diocese de Torit que governou até 2004, altura em que resignou.

Dom Paride fez parte da geração de jovens padres sul-sudaneses que, sem preparação alguma, tiveram de tomar em mãos a Igreja local quando, em 1964, o regime islamista de Cartum decretou a expulsão de todos os missionários — católicos e protestantes — do sul do país. Fizeram-no com muita dedicação e sucesso, enfrentando inúmeras dificuldades.

Defensor intrépido do seu rebanho, foi perseguido tanto pelo Governo de Cartum como pelos rebeldes do SPLA, o Exército de Libertação dos Povos do Sudão, que o mantiveram preso em condições humilhante durante algum tempo.

Dom Paride era, acima de tudo, um místico e um paladino da paz.

Em 1994, foi enviado ao Ruanda para mediar os esforços de reconciliação depois do terrível genocídio que afetou aquele país da África Oriental. Em 2013, tornou-se um denunciante acérrimo da guerra civil que estalou no Sudão do Sul entre as forças do Presidente Salva Kiir e do Vice-Presidente Riek Machar. Antes, havia mediado entre Kiir e o líder rebelde David You You.

Em 2000, inspirado pela visita que fez a uma comunidade na Terra Santa onde israelitas e palestinianos viviam juntos em paz, estabeleceu a Aldeia da Paz da Santíssima Trindade em Kuron para fomentar a concórdia entre as tribos beligerantes da sua diocese.

Em Kuron, vacas e armas, que alimentam as lutas intertribais na Equatória Oriental e noutras partes do país, estão banidas. Os residentes trocam a pastorícia pela agricultura e os jovens medem forças não através das razias, mas no campo de futebol. Defensores da paz observam e reportam movimentos suspeitos de jovens e homens armados na região e comunicam-nos através da rede móvel.

Em 2013, Ban Ki-Moon, Secretário Geral das Nações Unidas, galardoou Dom Paride com o Prémio da Paz Sérgio Vieira de Mello pelo trabalho em Kuron.

Dom Paride foi co-fundador do Conselho das Igrejas do Novo Sudão de quem foi o primeiro presidente. Por isso, o Arcebispo de Cantuária, Justin Welby, distinguiu-o com o Prémio Hubert Walter para a Reconciliação e Cooperação Interfé em 2017. Normalmente a Igreja Católica mantém o estatuto de observador neste tipo de organismos.

O bispo emérito de Torit era também desde 2016 co-presidente do Comité de Diálogo Nacional, organismo que devia promover a reconciliação e a paz no país mais jovem do mundo.

Em 2018, recebeu o Prémio Four Freedoms da Fundação Roosevelt pela «sua dedicação incondicional e abnegada para trazer a liberdade e paz ao povo do Sudão do Sul».

Encontrei-me inúmeras vezes com Dom Paride durante a minha estada de sete anos no Sudão do Sul ao serviço da Rede de Rádios Católica da qual era diretor de informação. 

Entrevistei-o algumas vezes quando se deslocava de Kuron a Juba para participar nas reuniões da Conferência Episcopal e noutros eventos. Era uma voz sábia capaz de ler os sinais dos tempos.

Entrevistá-lo foi sempre uma experiência única e impar pela transparência, humildade, bondade, alegria e sabedoria que irradiava.

Contou-me muitas histórias da sua vida. Durante o cativeiro às mãos do SPLA, os rebeldes fizeram a sua retrete no alto de uma colina sem nenhuma privacidade para todos o poderem ver a fazer as suas necessidades.

Homem de hábitos espartanos, confidenciou-me que isso o ajudou a passar esse tempo difícil de cativeiro. Alguns prisioneiros dos rebeldes sofreram muito, porque estavam habituados ao chá ou às papas para pequeno-almoço. Ele contentava-se com o que lhe serviam.

Um dos momentos a que se referia com grande humor foi quando, aos 68 anos, decidiu pedir a resignação de primeiro bispo de Torit para se dedicar à aldeia de Kuron.

«No Vaticano pensavam que eu estava maluco e exigiram que fosse visto por uma junta de psicólogos e psiquiatras», disse-me com o seu sorriso travesso.

Dom Paride é uma figura maior, impar e incontrolável da Igreja e da independência do Sudão do Sul. Nunca deixou de promover a paz e os direitos do seu povo. Agora fá-lo desde a Casa do Pai.

Descansa em paz!, servo bom, humilde e fiel.