2 de maio de 2022
FEZ-SE PÁSCOA!
Este ano a Páscoa do Calendário Juliano — em uso pela comunhão ortodoxa e também pelos católicos na Etiópia — foi celebrada uma semana depois da Páscoa segundo o Calendário Gregoriano — seguido pela grande maioria das Igrejas cristãs.
Uma vez cada oito anos a data coincide nos dois contadores do tempo, mas a diferença a separar as duas páscoas pode chegar às quatro semanas. Não me pergunte porquê, porque não sei.
No programa pastoral para as celebrações pascais coube ao pároco ir para a zona pastoral de Adola. Eu fiquei na sede da missão.
Em Qillenso, a vigília pascal estava marcada para as 19h00, 13h00 segundo a hora local — aqui as zero horas são às seis da manhã.
Uma hora antes começamos os preparativos.
Sob um céu muito carregado, com alguns trovões fortes, apanhamos a lenha para a fogueira pascal, sempre com um olho nas nuvens. Felizmente, foram despejar a carga de água a outro sítio e pudemos iniciar a vigília pascal — a mãe de todas as vigílias — já passava das 19h30, à espera que as pessoas fossem chegando.
Feita a Liturgia da Luz, no campo de futebol da missão, os participantes — guiados pelo Círio Pascal, símbolo do Senhor Ressuscitado — encaminharam-se para a pequena e acolhedora igreja, decorada a preceito.
A ELPA, a elétrica da Etiópia, portou-se bem e tivemos eletricidade durante toda a Liturgia da Palavra. Antes da celebração iniciar, atendi de confissão alguns penitentes à luz de uma vela.
Fizemos as sete leituras das Escrituras Judaicas — é importante fazer memória do imenso amor de Deus pelo seu povo, por cada pessoa, por cada criatura — e relembrar a história desse amor sofrido desde a Criação até à promessa do coração novo que substitui o coração empedernido do amado para ser também amante!
Cada leitura foi intercalada com um cântico acompanhado pelo teclista, que esteve «desempregado» durante o tempo da Quaresma. Nesta estação litúrgica aqui todos os instrumentos musicais são calados!
Foi tão lindo e comovedor poder cantar de novo Glória a Deus e Aleluia ao ritmo cadenciado das palmas e dos gestos depois dos quarenta dias de sobriedade litúrgica.
A luz «apagou-se» durante a homilia e a partir daí a celebração continuou com a igreja bastante bem composta, iluminada pelo Círio Pascal, pelas velas do altar e pela minha pequena lanterna que uma acólita segurava para eu poder ler o missal.
Dez catecúmenos e uma dúzia de bebés foram batizados durante a Liturgia Batismal. Algumas crianças fizeram a Primeira Comunhão na Liturgia Eucarística. A comunidade continua a crescer!
Os catecúmenos e os meninos da primeira comunhão receberam um terço e os bebés uma medalha de Nossa Senhora.
Era cerca das dez da noite quando disse às pessoas: «Ide em paz, aleluia, aleluia!»
A vigília foi uma celebração tranquila, uma experiência do Senhor Ressuscitado entre nós! O ambiente escuro e o bruxulear das velas ajudou ao repouso do espírito.
A noite de Páscoa foi de chuva intensa que se prolongou por parte da manhã.
No Domingo da Ressurreição, algumas pessoas vieram cedo à igreja para a prepararem para a Celebração da Palavra presidida pelo Catequista.
Como de costume, cortaram umas ervas longas e carnudas dos pântanos e espalharam-nas pelo chão. Depois da celebração juntaram-se no salão paroquial para um café celebrativo.
Eu fui celebrar a Missa da Ressurreição à igrejinha de Urdata, a uns seis quilómetros a norte de Qillenso, na periferia da cidade de Me’ee Bokko.
A celebração estava marcada para as 9h30, mas o catequista telefonou-me para não ir antes das 10h30. A chuva — que não queria parar — estava a atrasar os fiéis.
Ao longo da estrada vi muitas pessoas vestidas para ir ver o Senhor nas diversas comunhões presentes na cidade: as mulheres com vestidos e mantilhas onde predominava o branco e os bordados tradicionais ou os mantos longos e vestidos brancos com listas negras, étnicos; os homens com roupas mais sóbrias, embora alguns vestissem fatos brancos decorados com pequenas árvores verdes com troncos pretos — a oda, a árvore sagrada dos oromos, etnia a que os gujis pertencem.
A estrada de acesso à pequena igreja, construída com blocos e coberta de lâminas de zinco, estava muito enlameada e com os saltos do todo-o-terreno receei entornar a água benzida na vigília pascal que levava num balde para os batismos.
As pessoas iam chegando a conta-gotas.
«É por causa da chuva!» — explicava-me um catequista.
No templo luterano vizinho a assembleia cantava com entusiasmo puxada pelo pregar intenso do pastor.
«Huum! Parece que a chuva não cai sobre os protestantes!» — comentei, jocoso!
Entretanto, os jovens do coro vestiram as túnicas roxas com estolas brancas. Mas não entravam no templo!
Alguém decidiu ir alugar um pequeno gerador. A ELPA não retomou o fornecimento da energia e a Missa de Aleluia não podia ser celebrada sem o acompanhamento do teclado!
Era meio-dia quando, finalmente, iniciamos a celebração eucarística. A igrejinha, com o chão adornado de ervas, estava cheia de fiéis em trajes festivos (foto).
O coro cantou e dançou a preceito e a assembleia também!
Na celebração cinco catecúmenos e sete bebés receberam o Batismo e onze crianças fizeram a Primeira Comunhão. E receberam terços e medalhas!
No fim da celebração, a comunidade ofereceu aos dois catequistas um fato de três peças! Uma maneira interessante de marcar a Páscoa de quem os serve.
À vinda para casa estacionei o todo-o-terreno junto à antena de comunicações móveis para falar com os meus pais através de vídeo-chamada. Faz parte da minha rotina dominical desde os tempos em que vivi no Sudão do Sul. A casa onde vivo fica num baixio e o sinal da internet é muito fraco para usar o vídeo.
Assim passei a primeira páscoa de regresso à Etiópia!
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