Do programa que me propuseram constava um encontro com a ouvidoria.
Não fazia ideia do que a ouvidoria fosse. Perguntei. Interessante: era a designação local para arciprestado, vigararia.
O arcipreste chama-se ouvidor — dos colegas padres e diáconos e do bispo.
Por defeito profissional, habituei-me a ser dispensador de respostas: para as perguntas que me fazem, para as perguntas que ficam por fazer. Dispensador de palavras.
Aos 61, sinto a necessidade de mudar: de ser ouvidor das questões. Escutar as perguntas mais do que pensar as respostas.
Entreter as perguntas com carinho, devoção mesmo, mais que resolvê-las ou pô-las de lado, debaixo da carpete das questões impertinentes.
Sinto-me chamado a escutar o silêncio que habita cada pergunta, o silêncio da flor que abre do botão para amadurecer em fruto nutritivo e gostoso. O silêncio que acaricia e envolve cada palavra. A pausa do respiro. O silêncio que aconchega cada nota da partitura de uma canção, de uma sinfonia…
Alguém se queixou: «Agora que tínhamos encontrado todas as respostas, mudaram as perguntas».
A resposta da fé às grandes questões é sobretudo silêncio contemplativo perante o mistério da vida humana, da vida do Universo.
O Papa Francisco escreveu na magistral carta encíclica ecológica Laudato si, nº 49 que temos de ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres.
Perguntar, questionar faz parte da arte de viver. Ouvir é o seu complemento. Perguntar sem ouvir é falar no vácuo.
Durante as três semanas de serviço militar aprendi que as perguntas estúpidas são as perguntas que não fazemos.
O poeta austríaco Rainer Maria Rilke escreve em Cartas a um poeta jovem: «Gostaria de lhe pedir, caro Senhor, que tenha paciência quanto a tudo o que está ainda por resolver no seu coração e que tente amar as próprias perguntas como se fossem salas fechadas ou livros escritos numa língua muito diferente das que conhecemos. Não procure agora respostas que não lhe podem ser dadas porque ainda não as pode viver. E tudo tem de ser vivido. Viva agora as perguntas. Aos poucos, sem o notar, talvez dê por si um dia, num futuro distante, a viver dentro da resposta.»
O ouvidor, o encantador das perguntas é paciente, amante, vivente.
Sebastião da Gama, o poeta enamorado da Serra da Arrábida, escreve que «Pelo sonho é que vamos / Comovidos e mudos. […] Chegamos? Não chegamos? / —Partimos. Vamos. Somos.»
É fato, convive-se com inúmeras perguntas ao longo da vida toda...respostas, nem sempre as há, encontram-se espalhadas no vento, no tempo, no oxalá.
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