4 de novembro de 2020

A DEUS, MISSIONÁRIO DOS REFUGIADOS



 

Querido Jesús,

Quando li a última postagem que deixaste no Facebook na manhã de 31 de outubro fiquei preocupado com o estado da tua saúde.

Escreveste: «disseram-me que tenho cov19, que o medicamento me vai manter a dormir, que não poderei comunicar-me; manda esta mensagem a todos os que podes. Avisa ao provincial que vamos comunicar-nos em três semanas. Unidos no coração de Cristo. Abuna Jesús Aranda».

Ontem à noite conversei com o teu provincial em Juba, no Sudão do Sul, para saber como estavas. Acabava de regressar à sede provincial e tentou telefonar-te, mas não teve resposta.

A notícia bateu-me de frente, esta manhã, como um murro no estômago: o coronavírus levou-te esta manhã do Hospital Católico de Lachor, no norte do Uganda, e ao Ir. Benito Ricci, um colega comboniano italiano que trabalhou quatro anos no Quénia e 48 no Uganda. Tinha 79 e era superior de Layibi, o centro comboniano de espiritualidade perto de Gulu.

Recordo com saudade o teu sorriso constante de missionário feliz: como formador no postulando conjunto do Sudão do Sul e do Quénia, em Nairobi; como pároco da missão de Lomin, no Sudão do Sul, junto à fronteira com o Uganda; e com os refugiados sul-sudaneses no norte do Uganda desde janeiro de 2017, quando as missionárias e missionários de Lomin decidiram acompanhar os paroquianos para o norte do Uganda depois de a guerra civil ter chegado com os seus horrores ao condado de Kajo Keji, o extremo sul do país.

Tinhas feito 68 anos em agosto e continuavas, feliz, a cuidar dos refugiados no campo de Pelorinya-Itula, com outros missionários e missionárias. As fotos e as mensagens que colocaste no Facebook mostram um missionário próximo, amigo, envolvido, dedicado.

Os tributos são muitos.

A irmã comboniana Dorinda Lopes trabalhou contigo em Lomin e com os refugiados.

«Marcou-me muito no P. Jesús Aranda, a sua capacidade de se integrar, permanecer e caminhar com  e ao lado de um povo oprimido e despojado do seu maior bem, a sua pátria.  Não se deixava abater pelas dificuldades, fixava o  seu olhar na Cruz de Cristo e seguia em frente. Estimava  os seus catequistas, confiava neles e apreciava a sua colaboração», escreve. 

E continua: «Quando chegamos ao campo de refugiados no Norte do Uganda e nos dirigimos aos vários agrupamentos dos refugiados, o P. Jesús perguntou-me: "Irmã, tu amas este povo de verdade?".  E continuou: "Se os amas de verdade podes permanecer, caso contrário seria melhor desistires, porque nestes campos de refugiados a vida não é fácil! Aqui só aguenta quem ama o povo de verdade".»

«O P. Jesús deu testemunho de que o seu amor por aquele povo, humilhado e despojado, era um amor verdadeiro e sem limites. Que Deus o acolha no seu eterno bem», implora.

O Ir. Jorge Rodríguez, mexicano como tu, escreve: «Descansa em paz, P. Jesús Aranda Nava. Teu amor exemplar à Missão do Sudão do Sul. Recordar-te-ei sempre».

O P. Carlos Nunes, testemunha da Zâmbia: «TRISTE NOTÍCIA HOJE! Encontrámo-nos no curso de Renovamento em Roma, preparando o retorno à Missão. Tornámo-nos imediatamente amigos, irmãos! Ele era o missionário dos REFUGIADOS do Sudão Sul! Sempre cheio de vida e alegria. Acolhedor com visitas e familiares que nos visitavam. Agradecia a Deus pela boa saúde que sempre tinha. Totalmente dedicado a Deus e aos refugiados… Tanto mais sofrerão com a sua falta!».

O estudante comboniano de teologia Lukeja Komakech Kenyi, que é de Lomin, agradece-te: «Significaste muito na nossa vida. Obrigado por seres genuíno durante toda a tua vida».

Seguiste o rebanho. Como o bom pastor deste a vida pelas ovelhas. Partilhaste a sorte dos pobres, dos refugiados, das vítimas da guerra.

Que o Senhor te acolha no seu abraço terno e eterno.

Descansa em paz depois de tão árdua missão.

Reza por nós.

Que a tua morte seja vida para os refugidos. Que possam regressar a casa e refazer as suas vidas. E os missionários à querida missão de Lomin, à igreja nova, ao trabalho apostólico e de promoção humana nas escolas, oficinas e na clínica.

Hasta Dios, Carnal.

Tu hermano Joe

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