Enternecem-me as representações africanas do presépio, esculpidas ou pintadas. Singelas, lineares, às vezes minimalistas, outras vezes com explosões de cor, luz e movimento como os ícones etíopes da natividade que tanto me fascinam: olhares enormes, redondos, contemplativos; corpos solenes; mãos esguias, adoradoras; uma paleta de cores ricas de vida: amarelos, azuis, encarnados, brancos… Cabeças e asas de anjos a anunciar a grande alegria: nasceu-vos um Salvador!
O presépio é uma criação plástica de Francisco de Assis. Montou-o pela primeira vez com figuras de barro em 1223 na floresta de Grécio, no Lácio italiano. Com o andar do Cristianismo através das muitas culturas, foi ajuntando matizes e materiais locais que aprofundam o mistério da encarnação: Jesus faz-se homem em cada raça, é mistério intercultural.
Há um pensar que me vara o coração com um estremecimento apertado: se, em vez de nascer em Belém da Judeia, Jesus tivesse nascido, por exemplo, em Bentiu – no Sudão do Sul, Bourem – no Mali, Bongor – no Chade, Blama – na Serra Leoa, ou no Bailundo – em Angola, que azo teria de chegar à idade adulta?
A infância africana continua sob céus pesados apesar dos grandes progressos na assistência sanitária das últimas décadas. A Unicef, a agência da ONU para a infância, denuncia que no Sahel, no Nordeste da África, a crise alimentar ameaça cerca de 6,4 milhões de crianças de má nutrição aguda, afectando o seu desenvolvimento integral; que 2,4 milhões de crianças estão a ser atingidas pela crise na República Centro-Africana; que mais de 2,5 milhões de crianças sofrem de má nutrição severa aguda na República Democrática do Congo; que a guerra étnica no Darfur e nos montes Nuba, no Sudão, deixou as crianças vulneráveis às doenças e à fome, incluindo 1,2 milhões que sofrem de má nutrição aguda.
As estatísticas da mortalidade infantil são ainda mais tremendas: a Organização Mundial de Saúde diz que na África 8,1 % das crianças morrem antes de fazerem cinco anos. Em números redondos, em 2013, faleceram 2,9 milhões de crianças africanas com menos de cinco anos, um contador implacável de cinco crianças a morrer por cada minuto que passa.
A ONG Child Mortality documenta que, na África Subsariana, uma em cada 12 crianças morre antes dos cinco anos (nos países ricos o rácio é de uma por 147). Por países, em Angola perecem 15,7 % das crianças antes dos cinco anos, no Chade 13,9 %, na Somália 13,7 %, na República Centro-Africana 13 % e no Mali 11,5 %. Portugal tem uma taxa de mortalidade infantil de 0,4 %: morrem quatro crianças por cada mil nascimentos antes dos cinco anos.
O que é que mata os bebés africanos? Infecções, pneumonias, diarreias, malária, má nutrição e outras doenças facilmente tratáveis com medicamentos baratos e vacinas. Mas as crianças continuam a morrer...
Relacionada com a natividade africana está também a mortalidade materna. Os números são do Banco Mundial e da ONU e respeitam ao ano de 2013: na Serra Leoa, o país com o índice mais elevado, morrem 1100 mães por 100 mil partos vivos. Segue-se o Chade com 980, a vizinha República Centro-Africana com 880, o Burundi com 740 e o Sudão do Sul e a República Democrática do Congo com 730. Em Portugal, a mortalidade materna é de oito mães por cada 100 mil nascimentos. As mamãs morrem de complicações antes, durante e depois do parto, porque os governos canalizam os recursos para a guerra, descurando a saúde pública. Muitas são demasiado jovens para gerar filhos...
O Papa Francisco escreveu uma frase muito eloquente na exortação apostólica A Alegria do Evangelho: «Na sua encarnação, o Filho de Deus convida-nos à revolução da ternura!»
São estas as minhas saudações natais!
Muito sentida! Partilho no teu coração apertado pela situação das crianças africanas!
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