9 de fevereiro de 2008

DO LIVRO DOS SALMOS

Finalmente recebi a obra póstuma de Mário Castrim, «Do Livro dos Salmos», que a viúva, a Alice Vieira me enviou (com dois chocolates).
Pensei que a encomenda-postal se tivesse perdido nas confusões pós-
eleitorais do Quénia – o correio chega-nos a Juba via Nairobi – mas não. Já tinha pedido a um amigo uma nova cópia.
E como estou feliz por ter nas mãos o último livro do Mário! É uma obra notável de um homem notável.
O Mário Castrim, crítico de televisão e escritor, era um comunista assumido. Recordo que quando começou a colaborar na revista «Audácia» com uma rubrica mensal «O Lugar do Televisor» - os seus textos estão compilados em três volumes editados pela «Além-Mar» - alguns colegas ficaram muito zangados. Um comunista a escrever para miúdos numa revista católica?
Mas o Mário era um homem de fé e lia a Bíblia todos os dias. Desse amor pelas Escrituras saiu a sua leitura pessoal dos 150 salmos, – que dedicou ao Arlindo Pinto – o director que o acolheu – e aos missionários combonianos. A casa dos combonianos em Lisboa também se tornou sua casa.
Reli muitas vezes o manuscrito que tinha na direcção da «Além-Mar». E era sempre assaltado pelo sentimento de que o livro merecia uma editora com mais fôlego para dar aos salmos do Mário a projecção que merecem. A Alice aceitou o desafio.
O livro demorou a sair, mas finalmente a Campo das Letras publicou-o com ilustrações de Rogério Ribeiro.
Um livro de uma profundidade indizível e de uma simplicidade desarmante de um homem de quem tenho muitas saudades e de quem guardo grandes recordações.
Hoje, ao regressar do trabalho a pé – conseguimos despachar-nos às cinco da tarde da Rádio Bakhita pela primeira vez num ano – partilhava com a Cecy, a directora, que com o Mário aprendi a comunicar através da linguagem dos afectos.
Ia visitá-lo ao Hospital dos Capuchos onde estava internado por causa de uma pneumonia que o havia de levar. A certa altura já não podia falar, por estar entubado. Segurava-me na mão e sorria e eu também. E ficávamos assim entretidos a olhar um para o outro.
E quando a Alice o visitava eram impressionante ver a corrente de amor que circulava entre os dois. Uma experiência e amizade únicas.
Obrigado, Mário, pela tua fé e pela tua amizade. Obrigado, Alice, pelo teu carinho e preocupação. Obrigado pelo livro e também pelos chocolates!

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