29 de junho de 2013

PADRE CAN


Joseph Can recebeu a ordenação presbiteral hoje em Gumbo.

O novo sacerdote dos Salesianos de Dom Bosco nasceu há 38 anos no Vietname.

A sua ordenação bateu um número de recordes: foi o primeiro padre ordenado pelo bispo auxiliar de Juba, Dom Santo Loku Pio, o primeiro vietnamita a ser ordenado no Sudão do Sul, o primeiro padre a ser ordenado na paróquia de São Vicente de Paulo em Gumbo.

O Padre Can estudou filosofia no país natal e fez uma experiência pastoral no Sudão. Cursou teologia em Nairobi, Quénia, antes de ser destinado ao Sudão do Sul.

Ele disse que foi uma grande graça ser ordenado no país de adopção, o lugar que ele escolheu para servir.

«Gostaria que alguns jovens que participaram na minha ordenação seguissem os meus passos», acrescentou.

A ordenação, que decorreu no pavilhão da escola primária, foi muito participada. O coro excedeu-se na animação.

Uma forte bátega de chuva com alguns trovões abençoou o evento.

No fim da ordenação fez um longo discurso de agradecimento a Deus pelo dom da vocação, à família pelo dom da vida, à família salesiana pelo acolhimento e apoio e a sem número de gente que fazem parte da sua história.

O padre Can vai ser o encarregado da pastoral das vocações nos dois Sudãos, onde os salesianos estão presentes.

No Sul têm comunidades em Wau, Tonj, Gumbo e Maridi.

A fundação de Gumbo, na margem leste do Nilo Branco a uns cinco quilómetros de Juba é recente. Em seis anos, já construíram três escolas: primária, secundária e técnica além de casas para três comunidades (salesianos, salesianas e Irmãs Caritas) e o salão multiusos da paróquia. 

O descampado à frente de Juba deu lugar a um complexo impressionante pelas dimensões e pela rapidez...

23 de junho de 2013

100 DIAS

Nesta semana o Papa Francisco completou cem dias de ministério petrino e continua a surpreender.
 
Jorge Mario Bergoglio foi eleito sucessor de Bento XVI enquanto eu andava em peregrinação pela terra que acolheu Daniel Comboni em 1858 no Sudão do SUl. Quando regressei a Yirol – e à ligação à aldeia global – a primeira coisa que me disseram foi: Habemus papam desde há dois dias. Eu ri-me e respondi: Ainda esta manhã rezámos pela eleição do novo papa!
Fui imediatamente à internet para ver o novo papa: gostei do sorriso franco e aberto, da escolha do nome – veio-a à mente a mensagem de Jesus ao outro Francisco uns séculos atrás: Repara a minha Igreja! – e o meu primeiro pensamento que foi que temos o bom Papa João XXIII de novo no Vaticano numa versão mais moderna e arrojada!
O Papa Bergoglio é o primeiro a escolher o nome Francisco, o primeiro Jesuíta a sentar-se na cadeira de Pedro, o primeiro papa da América Latina. Também é o primeiro a viver fora do palácio apostólico nos tempos modernos «para manter a sanidade mental…» Também deve ter sido o primeiro papa a telefonar ao vendedor de jornais para cancelar a assinatura e ao seu dentista a desmarcar uma consulta porque o Vaticano é longe de Buenos Aires.
O facto de ter escolhido oito consultores para o aconselhar no governo da Igreja é por si só um sinal claro de um papado mais colegial. A primeira missão que os cardeais receberam foi a de fazerem recomendações para reestruturar a cúria, uma reforma que precisa de ser feita para devolver a confiança à Santa Sé.
Também caiu muito bem celebrar a Ceia do Senhor com jovens detidos num reformatório e ter incluído algumas mulheres entre os doze apóstolos a quem lavou os pés. Uma era muçulmana! Agora devia introduzir acólitas e acólitos em São Pedro em vez dos monsenhores de cera que o servem… E continua a celebrar a missa diariamente como um bom pastor com partes do seu rebanho.
O Papa Francisco tem insistido na misericórdia e no amor de Deus e alertado os colegas eclesiásticos para a «lepra» do carreirismo. A palavra é dele. 
Depois de dois papados preocupados com a ortodoxia, temos agora um papa que quer salvaguardar o lado humanista da fé com mensagens simples que vão diretas mais ao coração e menos ao cérebro! As mensagens são claras: a Igreja é um espaço de comunhão e não de exclusão. E ele quer viver mais próximo do seu povo mesmo que ponha os guarda-costas à beira de um ataque de nervos.
E continua a tradição do Papa Bento com uma presença constante no Twitter. Apesar dos comentários desbocados que os seus tweets provocam. É impressionante o lixo e as obscenidades que lá escrevem!
Vamos a ver como vai correr a participação no festival mundial da juventude no Rio de Janeiro daqui a um mês: é a primeira visita ao estrangeiro e à sua América Latina natal,
E

13 de junho de 2013

REFUGIADOS


                                               Yida: Crianças da Pré-primária © JVieira
Yida, na parte norte do estado sul-sudanês de Unity, acolhe refugidos dos Montes Nubas, no estado sudanês do Cordofão do Sul, desde Agosto de 2011, depois de a guerra ter começado naquela região a 5 de Junho de 2011. Desde então, as tropas do Governo têm bombardeado sistematicamente alvos civis, incluindo aldeias, mercados, áreas agrícolas e rebanhos. Hoje o campo tem uma população de mais de 70 mil.
Visto do céu, o campo é uma coleção de pequenos pontos brancos e azuis espalhados por uma área de 38 quilómetros quadrados por entre esparsas árvores que restam do que era uma floresta espessa. As casas são feitas de paus e erva seca e coberta com plásticos fornecidos por agências humanitárias como a Samaritan´s Purse e as Nações Unidas. Algumas casas são de blocos de barro secos ao sol.
O campo é um espaço aberto, sem arame farpado. As crianças estão bem nutridas e limpas e são muito simpátricas. Há 20 mil em idade escolar que frequentam oito escolas primárias e uma secundária feitas de paus, palha e plásticos. Os da pré-primária contentam-se com a sombra de uma árvore. Um dos dez professores quenianos que ensinam os 270 alunos do décimo ano – a escola abriu em Janeiro – disse-me que os Nubas levam a educação muito a sério apesar da precariedade em que vivem.
Tanto o Governo do Sudão do Sul como o ACNUR, a agência para refugiados da ONU, querem mudar o campo para Ajuong, mais para sudeste. Razão? Yida está demasiado perto da fronteira – a um dia de caminhada – e não oferece segurança. Depois, Yida é ponto de passagem para as forças do SPLA-North que combatem o Governo de Cartum, e que recrutam entre a população jovem dos refugiados.
O Governo ordenou ao ACNUR para parar de registar novos refugiados a partir de 4 de Abril para forçar as pessoas a irem para Ajuong. Mas os refugidos vão ficando por Yida mesmo que não possam receber comida e outras ajudas porque não estão registados. Um agente humanitário disse-me que já há 3000 pessoas a viver da comida que recebem de familiares e amigos. Casos de malnutrição começam a aparecer. A falta de comida pode vir a trazer violência e banditismo ao campo! Toda a gente sabe onde a comida está guardada e os famintos podem ser tentados a saquear as mais de 30 tendas gigantes com comida para 100 mil pessoas até final de Dezembro.
O campo também precisa de mais 500 latrinas para reforçar a saúde pública durante a estação da chuva, que já começou. As cerca de 2000 latrinas contraídas não chegam para as necessidades e a diarreia e a hepatite E são recorrentes durante as chuvas por falta de condições sanitárias.
Ajuong – que abriu em Março – tem cerca de 1,200 residentes, a maioria rapazes dos 18 aos 20 e poucos que são pagos para cavar latrinas e preparar outras estruturas no novo campo. Os residentes de Yida não querem nem ouvir falar da mudança: dizem que lhes custou muito trabalho chegar a um acordo sobre a partilha de água, lenha e outros recursos naturais com a comunidade local e não querem ser guardados pelos soldados sulistas que têm fama - e proveito - de más maneiras.

2 de junho de 2013

CALE-SE


Cale-se quem nunca soube o que é a guerra nem viu nem ouviu nem sofreu os seus efeitos!
Cale-se quem só ouviu o Sr. El Bashir e os seus amigos e não deu ouvidos aos soldados que sucumbem nas trincheiras, aos civis e inocentes que (nestes dois primeiros meses após os memoriais dez anos do conflito do Darfur) morreram não de morte natural mas de morte matada e muito violenta!
Cale-se quem não sabe que os hospitais do Darfur e os campos de refugiados de Utash, El Salam, Idreij, Kalma estão a encher-se, a arrebentar pelas costuras e a expandir pelo deserto fora a cada momento (falo com conhecimento de causa, tudo estes aqui pertinho de mim, em Nyala. E que será de todos os outros campos... à volta de uma centena?)!
Já agora, deixa-me comentar isso do medo ou do susto. Mais do que medo sinto raiva com sintomas de paralisação, impotência de um menino perante um gigante, o Colosso. Isto é mesmo muito mau sinal, que já não me tenham conseguido assustar nem meter medo nem a mim nem aqueles com quem eu estava à tarde. Nem sequer comentámos. Não, minto, um deles disse, enquanto os seus olhos ainda fixavam o céu sonoro e rompante: "O que é que se pode fazer ou dizer a isto!?" O outro respondeu: "Nada". E voltando-se na direção do grande areal de treinos do quartel de infantaria, concluiu: "Está vazio, hoje não há ninguém, estão todos para lá."
E note-se que estes dois são militares, colegas de todos os que estão para lá (sudaneses aqui do norte e não sudaneses do sul), que por acaso se encontravam uns dias de férias. Eram as 6h00 da tarde e encontrava-me em casa do ex-sargento sulista António Creb que me tinha convidado para um pequena festa de reconhecimento do seu filho Solomon que ficou aprovado no exame do oitavo (e último) ano do ensino básico.
Não lhes perguntei onde era o lugar da batalha, nem falei com mais ninguém até chegar a casa pois diga-se a verdade, tinha uma certa pressa porque se aproximava a hora do recolher obrigatório. Curiosamente, não tinha medo mas mais bem sentia um certo receio de ser encontrado a transgredir a lei marcial em que o castigo pode ser a expulsão da região ou do país.
P.e Feliz Martins, Missionário Comboniano no Darfur - Sudão